Código Florestal

Os desafios das unidades de conservação ambiental

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4 de agosto de 2014, 8h00

Esta é mais uma daquelas reflexões inevitáveis que ocorrem por ocasião dos aniversários. No caso, o aniversário é do meio ambiente, em um mês que deveria ser comemorativo, mas não é. Afinal, acabamos de sair de um conturbado processo legislativo que substituiu o Código Florestal, trazendo consigo uma série de flexibilizações, tolerâncias e consolidações que se traduzem em significativos e, em alguns casos, irreversíveis danos à biodiversidade. Um contraste com as belas fotografias de paisagens que caracterizam o Brasil.

As demandas da agricultura, da pecuária e mesmo da silvicultura sempre necessitaram de alguma forma de conversão da floresta para satisfazer nossas necessidades de consumo. O código deveria balancear essa situação em prol da sustentabilidade. Mas não foi para esse fim que o aprovaram. Sobressaíram-se, sim, os interesses em exportação de produtos agrícolas e valorização imobiliária de propriedades rurais. Ou seja, trocamos nossa biodiversidade por dinheiro.

Restam as unidades de conservação, cujo papel é, ou deveria ser, exatamente o de compensação das perdas de biodiversidade que ocorrem nas demais áreas. São exemplos mais conhecidos os parques nacionais, as florestas nacionais e as estações ecológicas. Mas cumprem elas seu papel?

Parece que não. Quem diz é o Tribunal de Contas da União, que concluiu recentemente auditoria na Amazônia, onde se encontram 73% das unidades de conservação do país, com área de 1,1 milhão de km². As conclusões são as seguintes: as unidades não estão atingindo plenamente os resultados esperados; as condições oferecidas pelos governos não são compatíveis com as necessidades desses espaços; e a articulação é insuficiente para o alcance dos objetivos previstos. Embora tenhamos atingido meta internacional de 17% do nosso território transformado em unidades de conservação (chegamos a 17,5%), fato é que elas estão longe de representar um instrumento de efetiva proteção à biodiversidade.

Há dois grupos de UCs: as de desenvolvimento sustentável e as de proteção integral, estas mais restritivas em relação ao uso dos seus recursos. Nas de uso sustentável, que são, de longe, o maior número (cerca de 70% do total), observa-se mais o comprometimento com uma espécie de reforma agrária para atender e proteger os despossuídos da lógica de apropriação e titulação de terras instalada no Brasil, especialmente na Amazônia, do que a preocupação em proteger o meio ambiente. Há casos em que os grupos que habitam as unidades associam-se a madeireiros na exploração da área que deveriam ajudar a preservar. Considerada a extensão territorial, destacam-se nesse grupo áreas de proteção ambiental, que não passam de uma fraca limitação administrativa à propriedade privada e que, em muitos casos, tudo permite, a exemplo da cidade de Brasília.

Restam as unidades de proteção integral, que, além de poucas, têm baixo índice de implementação, com pendências históricas na regularização fundiária — muitas das terras são privadas e já deveriam ter sido adquiridas pelo governo. A consequência é que acabam sendo alvo de todo tipo de prática pelos proprietários não indenizados. Além disso, são constantes as pressões da mineração, das hidrelétricas e da construção de estradas, que se somam a tentativas de redução territorial dessas UCs.

Ou seja, temos desafios enormes e uma pífia vontade política de enfrentá-los, traduzida em orçamentos incompatíveis com as demandas e em ausência de articulação madura e frutífera com os órgãos encarregados de questões fundiárias. Ainda há o deliberado enfraquecimento dos órgãos ambientais, considerados como estorvo para o desenvolvimento de atividades econômicas. Parece que tem razão quem afirma que a natureza é a deturpação da fotografia.

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