Texto inócuo

Leis mortas são uma constante na propriedade intelectual

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25 de abril de 2014, 12h01

Spacca
Na linguagem popular, as leis inócuas, ou seja, aquelas inofensivas ou que não produzem os efeitos pretendidos, são chamadas de leis que não pegam. Os motivos podem ser os mais variados. Vão desde a deficiência na redação pelo legislador, que redundam na dificuldade de interpretá-las e aplicá-las, na ausência de regulamentação específica, como no caso das chamadas normas em branco, e até mesmo na mais pura desobediência civil, como pregava o libertário francês Henry David Thoreau.

Toma-se, como primeiro exemplo, o direito de sequência previsto na Lei de Direitos Autorais. Criada para remunerar o artista visual, impõem-se ao vendedor ou leiloeiro reservar ao autor da obra de arte, ou seus herdeiros, um percentual sobre o preço de cada revenda. Porém, como é de conhecimento geral, a sua aplicação é rara e pontual, ante a informalidade das vendas desse mercado, o desconhecimento dos autores e herdeiros da existência desse direito e, ainda, na própria recusa dos operadores deste segmento em cumpri-la. 

Outro exemplo é encontrado na Medida Provisória que criou a Agência Nacional do Cinema. Lá consta que uma obra audiovisual produzida por meio de incentivo fiscal poderá ser exibida, sem ônus ou autorização prévia do titular, em canais públicos de televisão ou escolas públicas depois de dez anos da sua primeira exibição. Porém, não se tem registro, até o momento, de nenhuma obra audiovisual que tenha sido utilizada nesses moldes. E não se diga que elas não existem, afinal grande parte das produções brasileiras são baseadas em mecanismos de incentivos fiscais. O mais grave, contudo, é que não existe nenhum dado específico ou justificativa a respeito deste dispositivo legal ainda não ter sido aplicado. Pura inaptidão, tanto da Agência, quanto dos beneficiários da norma.

Derradeiro exemplo é a recém sancionada lei que altera o modelo de cobrança, arrecadação e distribuição das obras musicais exibidas publicamente. Criada justamente para promover melhorias neste sistema, o Ministério da Cultura tem a incumbência de regulamentá-la e torná-la prática, sob pena desta legislação recém nascida já ingressar na extensa lista de desuso e mais uma a não atingir a sua finalidade.

Também na linguagem popular, leis inócuas são consideradas letras mortas. O mais curioso, contudo, é que tais expressões são reverberadas por este escriba e por você, leitor. Então está mais do que na hora de participar ativamente das consultas públicas, denunciar rompantes legislativos e eleger políticos pragmáticos.

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