Ações populares

Tentativa de desmoralizar o Carf atenta contra o direito

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2 de setembro de 2013, 16h50

A comunidade jurídica recebeu, com indignação, a notícia de que novas ações populares foram intentadas contra as decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), nova denominação do quase centenário Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda.

Assim, foram propostas, na primeira quinzena de agosto, pelo menos três ações populares visando anular julgamentos do Carf porque desses julgamentos participaram advogados militantes. Os casos atacados envolvem temas sensíveis, de alto valor e de interesse direto da Procuradoria da Fazenda Nacional: ágio interno e distribuição disfarçada de lucros.

Na visão dos autores populares, e não obstante o elementar impedimento pontual desses advogados de atuarem junto ao próprio Carf e de não patrocinarem demandas em favor ou desfavor das partes sobre as quais vieram a julgar algum caso, os julgamentos do Carf estariam viciados, devendo-se produzir novos julgamentos.

Curioso observar que os autores populares (a esposa de um ex-procurador da Fazenda Nacional que teria, ao que consta, sido exonerado do serviço público, representada por seu marido) somente questionam a participação de advogados em casos em que a Fazenda pública se saiu vencida; e não quando se saiu vencedora — posto que o fundamento, para ambas as situações, seria rigorosamente o mesmo a também justificar a anulação dos julgados do Carf.

Desde sua criação, em 1924, os chamados Conselhos de Contribuintes ostentam composição paritária, vale dizer, desses órgãos participam tanto representantes do Fisco como dos contribuintes.

Essa composição paritária, ao longo de seus quase 90 anos, tem se mostrado extremamente relevante para arejar esses órgãos (que nada mais são do que verdadeiros tribunais administrativos), de modo a que a sanha por arrecadação possa ser revista por uma instância superior e de julgamento das autuações fiscais, produzindo-se acórdãos equilibrados sobre a conduta adotada pelas fiscalizações.

A tentativa de desmoralizar o Carf, curiosamente partindo de ex-representantes do interesse da Fazenda Nacional, não é bem vinda e, com a devida vênia, atenta contra o bom direito.

De fato, no último dia 6 de agosto, dias antes, portanto, dessa nova ofensiva ao Carf, o Órgão Especial do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que congrega os 27 representantes das Seccionais do Brasil, em julgamento de Consulta formulada pelo Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), decidiu, por unanimidade de votos (com apenas a abstenção de um Conselheiro Federal, que não votou), que a função de julgador de tribunais administrativos (a exemplo do Carf, Tribunais de Impostos e Taxas Estaduais, Conselhos Municipais de Tributos), por não ser remunerada, não é incompatível com o exercício da advocacia, ressalvados naturalmente os impedimentos de não advogar perante o próprio tribunal administrativo e para as partes em relação às quais tenham participado de julgamentos.

A decisão do Órgão Especial do CFOAB (processo de consulta 49.0000.2013.0071321/OEP, julgado em 6 de agosto de 2013, cujo acórdão aguarda formalização), portanto, colocou uma pá de cal sobre a questão e, ao mesmo tempo, garantiu a permanência do modelo justo e paritário desses tribunais administrativos.

É de se esperar, dessa forma, que, assim como as demais 59 ações propostas pelos mesmos autores populares (encaminhadas sob outros improcedentes fundamentos para tentar desmoralizar o Carf), sejam também rejeitadas pelo Poder Judiciário as novas ações, resguardando-se a higidez do modelo paritário de revisão das autuações fiscais no Brasil, que tão bem funciona desde 1924, servindo de freio à sanha arrecadatória que assola os cidadãos brasileiros sempre às voltas com as injustiças decorrentes do sistema que ostenta uma das maiores cargas tributárias do mundo, praticamente sem nenhum retorno em termos de contrapartidas do serviço público.

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