Ação e reação

Contencioso administrativo reage ao Índice de Transparência

Autor

  • Andreia Scapin

    é advogada doutora em Direito Tributário pela USP professora convidada da pós-graduação da Universidade Mackenzie e pesquisadora do Centro Didático Euro-Americano sobre Políticas Constitucionais da Università del Salento Itália/Furb (Brasil).

24 de outubro de 2013, 9h18

Artigo produzido no âmbito das pesquisas desenvolvidas no Núcleo de Estudos Fiscais (NEF) da Direito GV. As opiniões emitidas são de responsabilidade exclusiva de seus autores.

O iCAT (Índice de Transparência do Contencioso Administrativo Tributário) é um instrumento de intervenção no debate público que mede a transparência nas informações tributárias resultantes da investigação do papel do Direito no desenvolvimento do Brasil, principal linha de pesquisa do NEF/Direito GV.

O referido índice parte da premissa de que as informações tributárias devem ser transmitidas a todos os cidadãos, sem qualquer obstáculo, para gerar a transparência ativa do Estado. Assim, pode-se dizer que o índice afere se os órgãos da Administração Pública disponibilizam informações nos portais públicos e se seu acesso é fácil para quem as consulta.

Trata-se de uma estratégia que se aproxima da ideia de regulação responsiva defendida por John Braithwaite[1], que induz comportamentos sem a imposição de sanção, isto é, que incentiva os tribunais a atuar conforme as expectativas da sociedade sem apelar para estratégias estritamente punitivas.

O primeiro passo do iCAT foi elaborar critérios e determinar sua respectiva pontuação. Para o banco de dados com informações mais relevantes do contencioso administrativo tributário — por exemplo, (i) autos de infração impugnados; (ii) decisões de primeira instância; e (iii) decisões de segunda instância — foram atribuídos 20 pontos cada, totalizando 60 pontos.

Às informações de gestão de processos foram atribuídos 4 pontos cada, totalizando 40 pontos. Pertencem a esse grupo informações quanto: (i) aos processos entrados no contencioso; (ii) aos processos encerrados definitivamente no contencioso; (iii) ao resultado dos processos julgados em primeira instância; (iv) ao resultado dos processos julgados em segunda instância; (v) aos andamentos processuais; (vi) às pautas de julgamento; (vii) à composição de órgãos julgadores; (viii) à legislação do contencioso tributário; (ix) ao tempo de permanência para julgamento; e (x) ao estoque de processos.

Somando os 60 pontos dos bancos de dados, que identificam o cerne do contencioso administrativo, aos 40 pontos dos critérios de gestão de processos, somam-se os 100 pontos totais do índice.

A primeira versão do iCAT foi publicada em maio de 2013. Numa escala de 0 a 100, a maior pontuação foi do estado de São Paulo, com apenas 53 pontos. Em segundo lugar está Santa Catarina, com 52 pontos. Infelizmente, 16 dos 27 estados tiveram pontuação inferior a 15 pontos, apontando um cenário bastante preocupante e um caminho longo a percorrer para proporcionar o efetivo acesso à informação e transparência nas relações entre o Fisco e os contribuintes.

Contudo, pode-se afirmar que o iCAT teve uma repercussão extremamente positiva, pois gerou reação dos órgãos da Administração Pública de diversos estados, cujos representantes passaram a contatar o NEF com frequência para esclarecer dúvidas a respeito de suas respectivas pontuações e para discutir a adequação das informações contidas em seus portais.

O Conselho de Contribuintes de Minas Gerais enviou um relatório com comentários sobre sua pontuação e referências do portal indicando os critérios que entende ter atendido. O Conselho da Fazenda Estadual da Bahia propôs-se a estudar o iCAT e informar quais os documentos disponibilizados na internet. Foram enviados e-mails com esclarecimentos das dúvidas, sendo efetuado, nos últimos dias, um diálogo constante entre os pesquisadores do NEF e os representantes desse estado.

Também o Tribunal de Impostos e Taxas do estado de São Paulo reagiu ao índice, já que, recentemente, inseriu em seu banco de dados digital um grande volume de decisões de primeira instância proferidas desde 2010, justamente conforme requer o critério. Além disso, informou que disponibilizará, nos próximos dias, relatórios sobre sua produtividade, aperfeiçoando a informação prestada ao cidadão.

O Tribunal Administrativo Tributário do estado de Pernambuco também contatou o NEF para obter informações de sua pontuação e dar sugestões sobre os critérios aplicados.

A experiência com o iCAT confirma o papel fundamental do diálogo entre a Administração Tributária e os contribuintes, a fim de que se atinja a transparência fiscal, tornando o processo de aferição mais democrático.

Por isso, em setembro de 2013, o início da segunda versão do índice foi marcado pelo envio de um comunicado a todos os estados sobre a realização de uma atualização e um convite para um diálogo, fazendo-os participar do processo de verificação da transparência fiscal no Brasil.

Foram enviados artigos jurídicos publicados e relatórios com informações do iCAT, explicando os objetivos, a metodologia e a pontuação dos estados na primeira versão, pois o propósito do NEF é dar eficiência a essa troca de ideias.

Conforme estamos conseguindo aferir na prática, o iCAT pode induzir boas práticas, aprimorar a atuação institucional dos fiscos brasileiros, estimular a competição saudável entre os estados e impulsionar a discussão sobre transparência, boa governança e eficiência da Administração Pública.


[1] BRAITHWAITE, John. Responsive Regulation and Developing Economies. Word Development Vol. 34, No. 5, 2006, pág. 884-898.

Autores

  • Brave

    é pesquisadora do Núcleo de Estudos Fiscais (NEF) da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Doutoranda em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

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