Férias aos advogados

Advocacia é atividade desgastante e descanso é fundamental

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13 de outubro de 2013, 7h06

Todo aquele que se dedica à arte da advocacia sabe que essa é uma das atividades mais desgastantes, tanto sob o aspecto físico como mental. Nós, cotidianamente, temos como incumbência transformar os anseios e necessidades de nossos clientes em teses, narrativas e defesas, o que nem de longe é algo fácil.

A atividade da advocacia, assim, traz ao profissional da área um desequilíbrio entre o consumo de forças físicas e intelectuais, pois com um mínimo de esforço físico (trabalhamos quase sempre sentados) acabamos por sobrecarregar o intelecto com abstrações. De fato, há mais de uma década na advocacia eu nunca peguei em minhas mãos a prescrição, a preclusão ou algum princípio jurídico, mas são institutos tão vivos na mente dos juristas quanto uma montanha ou os fenômenos da natureza.

O resultado é que boa parte dos colegas estão obesos, outros sofrendo de problemas de saúde diversos, mais das vezes resultado de longas jornadas de trabalho sem um período adequado de descanso.

De fato, a Emenda Constitucional 45/2004, que entre outras modificações criou o Conselho Nacional de Justiça, acabou com as férias coletivas nos juízos e tribunais de segunda instância, estabelecendo que o trabalho em referidos órgãos do Poder Judiciário é permanente. A medida obviamente foi boa, mas acabou gerando um efeito colateral que quando das discussões que antecederam a Emenda não foi percebido a tempo: como o funcionamento é permanente, os advogados acabam não podendo usufruírem de merecidas férias, um direito básico de qualquer trabalhador, garantido pela Constituição Federal e por tratados internacionais sobre o trabalho.

Desde então a advocacia tem estado todos os anos na expectativa de que os tribunais, compreensíveis em relação ao problema, implementem medidas visando propiciar a essa importante classe de profissionais um descanso pelo período mínimo de trinta dias. As cortes mais abertas ao diálogo mesmo à míngua de leis já se adiantaram, e determinaram a suspensão dos prazos e audiências no período que vai de 20 de dezembro a 20 de janeiro. Merece destaque o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, um dos pioneiros na medida.

Efetivamente, no entanto, temos tido mais frustrações do que conquistas. A experiência mostrou que a suspensão dos prazos por trinta dias não prejudica os trabalhos forenses, já que mesmo inexistindo fluência de prazo para os advogados ou realização de audiência há muito trabalho interno a ser feito em todos os órgãos do Poder Judiciário, sendo esse um período na qual os servidores e magistrados contam com mais tempo para tirar o atraso. Mas há relutância por parte de muitos tribunais.

Neste ano de 2013, nossas esperanças se reacenderam. Várias cortes já se anteciparam e determinaram a suspensão dos prazos e audiências por 30 dias, como o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso, o Tribunal Regional do Trabalho da 10.ª Região, para citar alguns.

Em terras paulistas, o Tribunal Regional do Trabalho da 15.ª Região anunciou que pela primeira vez os prazos estarão suspensos até o dia 20 de janeiro de 2014, mas tal medida isolada acaba sendo inócua. É que dificilmente os advogados possem processos apenas na Justiça do Trabalho no âmbito do TRT15, tendo que voltar ao trabalho logo no início do ano se os demais tribunais seguirem os cronogramas dos anos anteriores.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, uma das cortes brasileiras mais fechadas às discussões relacionadas a direitos sociais, informou em 4 de outubro de 2013, através de seu douto Presidente, que se seguirá o determinado no Assento Regimental 403/2012, suspendendo-se os prazos apenas no período que vai de 20 de dezembro de 2013 a 6 de janeiro de 2014 (informação prestada no procedimento de controle administrativo 0005740-12.2013.2.00.0000, em curso perante o Conselho Nacional de Justiça).

Quanto ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em que pese o fato de seu Presidente atual ter sido indicado pela Ordem dos Advogados do Brasil através do quinto constitucional, ainda não há um posicionamento claro sobre o tema.

Vale ressaltar que pouco adiantará se a suspensão dos prazos por trinta dias for anunciada na última hora. Estamos agora no mês de outubro, e este é o momento que devemos nos programar para eventuais viagens.

Assim, é necessário neste momento união da classe para que todos os Tribunais determinem a suspensão dos prazos e audiências pelo período mínimo de trinta dias, de modo a que nós advogados possamos gozar do direito universal a férias, lembrando que os trabalhadores só conquistaram esse direito a duras penas, e com muitas batalhas.

A advocacia brasileira infelizmente perdeu nos últimos anos a capacidade de luta, muito embora implementar os mecanismos para resguardar os direitos sociais e universalmente aceitos deveria ser o traço distintivo desta classe de profissionais (pelo que muitos já evocam a dispensabilidade do advogado).

Mas é certo que o abatimento e o desânimo não geram resultados favoráveis. Vamos retomar nossa capacidade de implementar mudanças e exigir o cumprimento dos direitos sociais universalmente consagrados, e o orgulho de ser advogado.

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