Rede Sustentabilidade

Cartórios não precisam justificar rejeição de assinaturas

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3 de outubro de 2013, 22h25

O partido Rede Sustentabilidade, da ex-senadora Marina Silva, não vai poder disputar as eleições presidenciais de 2014. O Tribunal Superior Eleitoral rejeitou o pedido de registro do partido por entender que a legenda enviou 50 mil assinaturas a menos do que exige a legislação eleitoral. Como o prazo para o registro do partido na campanha é sábado (5/10), a agremiação não poderá concorrer.

A Lei 9.096/1995 exigia que a Rede colhesse 492 mil assinaturas de apoio, ou seja, 0,5% do número de votos registrados nas últimas eleições para a Câmara dos Deputados. O partido afirma que foram coletadas cerca de 660 mil assinaturas, das quais um pouco mais de 200 mil foram descartadas pelo próprio partido. A Secretaria Judiciária do TSE, ao analisar todas as assinaturas enviadas, constatou que apenas 442 mil estavam certificadas pelos cartórios. 

O argumento levado ao caso pela Rede Sustentabilidade é que, das cerca de 200 mil assinaturas não certificadas, 95 mil o foram sem qualquer motivação pelos cartórios. Em sustentação oral, Torquato Jardim, advogado do partido de Marina Silva, afirmou que não há qualquer suspeita de fraude ou ilegalidade. Portanto, argumentou, “inadmissivel que atos administrativos não motivados de cartorios possam sustar a máxima constitucional do pluripartidarismo”. A tese sustentada pelo partido foi elogiada pelos ministros, que a classificaram de “muito inteligente”.

Durante a sustentação oral, o advogado da Rede também relatou uma série de dificuldades por que passou o partido, entre elas a morosidade dos cartórios e a falta de padrão nas decisões administrativas. Uns cartórios não diligenciaram, como deveriam ter feito, para buscar mais informações a respeito de determinadas assinaturas. Outros, como foi alegado no argumento principal, não motivaram suas decisões.

Mas o ministro João Otávio Noronha, o segundo a votar, refutou essas alegações. Disse que o caso deveria ser decidido no plano da legalidade, e não no plano da moralidade. “A questão é se há um número suficiente de ações ou não”, afirmou. Ele entendeu que, como não havia, não se poderia exigir dos cartórios que motivassem todas as suas decisões de não certificar as assinaturas. Sua fala foi completada pelo procurador eleitora Eugênio Aragão: “Imagine como não seria o trabalho desses cartórios”.

O pedido da Rede foi negado por seis votos a um. A relatora do caso, ministra Laurita Vaz entendeu que o fato de a legenda não ter conseguido as 492 mil certificações de assinaturas que manda a Lei dos Partidos Políticos significa que não poderá registrar o partido. Mas isso não impede que o partido continue a trabalhar para colher novas assinaturas válidas. Seguiu o que disse o parecer do vice-procurador-geral Eleitoral, Eugênio Aragão: o partido não se destina a um único pleito, mas a participar da vida permanente da política nacional.

Estrita legalidade
Em voto suscinto e aguardado, o ministro Marco Aurélio explicou que, como se tratava de um julgamento administrativo, os julgadores deveriam se pautar pela estrita legalidade. E a estrita legalidade manda obedecer os critérios de porcentagem do número de assinaturas que fora certificadas pelos cartórios.

O ministro Henrique Neves, um dos que elogiou a sustentação oral de Torquato Jardim, afirmou que, mesmo que se exigisse a motivação dos atos administrativos, há foro para isso. Ele explica que o artigo 17 da Constituição Federal afirma que todos os partidos devem ter comprovação de apoio nacional, mas também diz que eles têm direito irrestrito à petição.

No entanto, segundo o ministro, isso quer dizer que o partido deveria ir aos juizes eleitorais responsáveis pelos cartórios e pedir para que determinadas negativas de certificação fossem motivadas. “O juiz o faria de bom grado, e nem seria necessário um grande causuístico para isso”, completou. E ressaltou que o pedido da Rede, na verdade, era para que o TSE fizesse o papel do juiz de primeira instância.

“Causuísmo vergonhoso”
O ministro Gilmar Mendes foi o único a votar a favor do registro da Rede Sustentabilidade. Falou sozinho, mas falou alto: sua voz ressoou pelo plenário abobadal do Tribunal Superior Eleitoral. Ao final, foi aplaudido. Irritado, o ministro disse sentir vergonha de constatar que a Justiça mais moderna em termos de informatização e a mesma Justiça que é a responsável pela urna eletrônica agora se vê discutindo questões meramente burocráticas. “Isso é motivo de vergonha!”

Ele lembrou do Mandado de Segurança 32.033, impetrado no Supremo Tribunal Federal e que tratava de um Projeto de Lei em trâmite na Câmara que pretendia dificultar a criação de partidos. “Era um projeto que tramitaria em 24 horas na Câmara e depois em 24 horas no Senado. O endereço era o partido da Marina, e esse projeto só foi barrado graças a uma liminar por mim proferida”, bradou. Depois, contou, o Supremo cassou a liminar e liberou a tramitação da lei. “Hoje sinto vergonha de dizer que participei daquele julgamento”, afirmou.

Depois reclamou do argumento da “estrita legalidade”. “Não há estrita legalidade que ande senão a estrita legalidade proporcional”, afirmou. Ele explica que a lei deve ser aplicada, mas respeitando as nuances do caso concreto, obedecendo sempre o princípio da proporcionalidade. “Isso é a Justiça concreta”, declarou.

Ele se referiu ao argumento para reclamar do fato de o partido ter passado por “todas as vicissitudes” e ao fato de a agremiação existir há dois anos. Agora, as pretensões eleitorais do partido, concluiu o ministro, foram enterradas por causa das formalidades burocráticas exigidas pela lei eleitoral e subscritas pelo tribunal. 

*Texto alterado às 22h37 do dia 3 de outubro de 2013.

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