Imbróglio internacional

Pizzolato está a salvo da jurisdição criminal brasileira

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27 de novembro de 2013, 7h05

Muitas dúvidas persistem no cenário atual acerca do imbróglio internacional envolvendo Henrique Pizzolato, ex diretor de marketing do Banco do Brasil, recentemente condenado pelo Supremo Tribunal Federal, no caso do mensalão, a 12 anos e 7 meses de prisão, pelos crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro.

Pois bem! Pizzolato é um foragido da Justiça nacional no exterior, portanto, fora da jurisdição da polícia brasileira. Dessa maneira, o Brasil solicitará o apoio da Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol), da qual é membro, para que auxilie na procura e detenção do mesmo na Itália. Sendo detido — provavelmente será, porque, segundo consta, não está escondido na Itália —, Pizzolato pode ter extradição solicitada pelo Estado brasileiro para cumprir, aqui, a pena objeto de suas condenações.

Mas o fato é que, mesmo o Brasil solicitando pedido de extradição, e supondo que as razões do pedido sejam significativas para justificá-la, não deverá o mesmo ser extraditado da Itália para o país. O que difere sua situação da de outros brasileiros é que ele possui dupla cidadania originária. Ou seja, é, ao mesmo tempo, brasileiro e italiano. E, assim como o Brasil não permite extradição de nacionais brasileiros, exceto quando naturalizados e, ainda assim, se o fato motivador da extradição (o crime cometido) for de natureza comum, tiver sido efetivado antes da naturalização ou estiver relacionado com tráfico de entorpecentes e drogas afim, entre outros (Constituição Federal, artigo 5ª, LI), a Itália também veda a extradição de italianos em casos  políticos, facultando-a, outrossim, nos casos em que esteja expressamente prevista em normas internacionais (CI, artigo 26), apesar de, na prática, não cumprir tal faculdade. O próprio tratado de extradição Brasil-Itália, de 17 de outubro de 1989 (Dec.Exec. 863/93), faculta, não obriga, a extradição de nacionais em seu artigo 6, I: “quando a pessoa reclamada, no momento do recebimento do pedido, for nacional do Estado requerido, este não será obrigado a entregá-la”.

Dessa maneira, Pizzolato só será eventualmente extraditado para o Brasil se for preso fora do território italiano. Nessa hipótese, ainda que a Itália requeresse sua extradição para lá, valeria o pedido brasileiro, porque é o país com o qual a nacionalidade de Pizzolato mais esteve ligada até então (artigo 5º da Convenção de Haia sobre Conflitos de Nacionalidade, de 12/04/30, Dec.Exec. 21.798/32). Foi o que aconteceu, por exemplo, no caso do ex banqueiro Salvatore Cacciola, que só foi extraditado para o Brasil, porque resolveu sair da Itália, sendo preso, doravante, no Principado de Mônaco e, de lá, extraditado.

Em nota aberta encaminhada à imprensa, Henrique Pizzolato manifestou interesse de recorrer à Justiça italiana para demonstrar, em tribunal livre "das imposições da mídia empresarial", sua inocência. Supondo-se que busque mesmo tal medida, não deve ser algo simples de acontecer, porque significa iniciar um julgamento do zero, provavelmente sujeito a todas as instâncias recursais, já que não deverá ter processo julgado diretamente na Corte Superior, semelhantemente ao que aconteceu no Brasil, quando foi julgado, por conexão com demandas que deveriam gozar de foro privilegiado, diretamente no STF, e não no juízo monocrático. De toda forma, não havendo impedimento no ordenamento jurídico italiano, a hipótese, pode, sim, se materializar. Até mesmo porque, o supra citado tratado de extradição Brasil-Itália, no mesmo artigo 6, I, que faculta a extradição de nacionais, prevê que "… não sendo concedida a extradição, a parte requerida, a pedido da parte requerente, submeterá o caso às suas autoridades competentes para eventual instauração de procedimento penal". Agora, se isso vai acontecer, é ver para crer.

Há divagações também sobre uma imaginável possibilidade de troca de Pizzolato por Cesare Battisti, ex integrante dos Proletários Armados pelo Comunismo, nas décadas de 70/80, condenado na Itália (à revelia e por delação premiada) à prisão perpétua, por cometimento de supostos crimes de terrorismo, atualmente refugiado no Brasil.

Sobre isso, há duas questões a esclarecer: 1ª) não há previsão de negociação do tipo, nem nas leis internas italianas, tampouco no tratado de extradição Brasil-Itália, portanto, é impossível, por esse prisma, a troca de um condenado pelo outro; 2ª) apesar de Battisti ter tido extradição consentida pelo STF, mas não determinada pela Presidência da República, a quem compete responder pelas relações com os Estados estrangeiros (inciso VII, artigo 84, da CF/88), o mesmo está amparado pela condição de refugiado no país, de tal maneira, que também por esse prisma a troca resta impossível.

Concluindo, na condição de italiano, Pizzolato está, na prática, a salvo da jurisdição criminal brasileira, desde que permaneça na Itália até a prescrição de sua pena, cerca de 20 anos. Bom seria, contudo, que na Itália fosse submetido a um novo julgamento. Seria uma ótima maneira de demonstrar se o julgamento do mensalão no STF teve ou não nuances de julgamento de exceção, consoante apregoado pelos condenados.

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