Consultor Jurídico

Gasto com viagem de condenados no mensalão para Brasília não se justifica

17 de novembro de 2013, 12h44

Por Marcos de Vasconcellos

imprimir

Os brasileiros viram neste sábado (16/11), pelos jornais e televisão, nove condenados na Ação Penal 470, o processo do mensalão, serem levados por jato da Polícia Federal para Brasília. José Dirceu e José Ganoíno voaram de São Paulo para Belo Horizonte, onde embarcaram na aeronave outros sete réus no processo em direção à capital do país. O gasto do poder público com a viagem não foi baixo: em empresas privadas, a viagem de jato de São Paulo a Brasília custaria cerca de R$ 30 mil. Discute-se, porém, o motivo de tamanho gasto, uma vez que não há a necessidade de os presos estarem fisicamente próximos à Vara de Execução que determina como será o cumprimento da pena. Além disso, a Lei de Execução deixa claro que o preso deve ficar em local “próximo a seu meio social e familiar”. 

Normalmente, independente de onde foi cometido o crime, o condenado cumpre pena onde reside e tem família. Isso por conta do caráter ressocializador da prisão, explica o criminalista Marcelo Feller. O processo de execução é que acompanha o condenado, e não o condenado que acompanha a execução. “Se a pessoa é condenada no Amazonas, mas é presa em São Paulo para cumprimento de pena, a Justiça amazonense encaminha para São Paulo os autos da execução criminal, onde o juiz das execuções paulista vai ser o competente para analisar os pedidos e procedimentos da execução”, exemplifica Feller.

O mais provável de acontecer é que todos os que foram levados a Brasília no espetáculo midiático do último sábado sejam entregues de volta a seus locais de residência — não se sabe se de jato, de avião de carreira ou de ônibus —, para que cumpram a pena conforme determina a lei. “Esse avião da Policia Federal representa um gasto alto e deve ser usado para fins essenciais às funções dela”, afirma o advogado Pedro Ivo Cordeiro, do Almeida Castro Advogados Associados. A banca atuou no processo representando os publicitários Duda Mendonça e Zilmar Fernandes, que foram absolvidos. 

Mesmo com seus clientes absolvidos, o escritório acompanha de perto o caso. O sócio Antônio Carlos Almeida Castro, o Kakay, também ataca a ponte aérea: “Nada justifica a operação caríssima, salvo essa necessidade quase mórbida de espetacularizar as prisões. É uma espécie de pena acessória, a humilhação dos condenados, paga com dinheiro público para promoção pessoal de algumas autoridades”. 

Isso porque não há necessidade de os condenados comparecerem à Vara de Execução para que o local de cumprimento das penas seja determinado, explica o criminalista Pierpaolo Bottini, do Bottini e Tamasauskas Advogados. “A logística é inédita”, diz ele, mas faz questão de lembrar que muita coisa é ou será novidade, já que é a primeira vez que o Supremo encerra um processo criminal com tantos réus condenados.

Marcelo Feller também classifica como “inovadora e inexplicável” a decisão do Supremo Tribunal Federal que determinou que o juiz das execuções de Brasília será o responsável pela execução dos condenados, e todas as suas decisões deverão ser encaminhadas diretamente ao relator da Ação Penal, ministro Joaquim Barbosa, que poderá ratificá-las ou modificá-las. “Isso é, com todo o respeito, medonho”, reclama.

Outra questão que tem gerado debate é o fato de aqueles condenados a cumprir pena em regime semi-aberto terem voado para Brasília e sido encaminhados ao Complexo da Papuda enquanto esperam a decisão da Vara de Execuções. Ou seja, mesmo condenados ao regime semi-aberto, foram transferidos do local onde têm convívio social, familiar e de onde trabalham para cumprir pena, na prática, em regime fechado, enquanto esperam a decisão da Justiça, pois não terão autorização para deixar o presídio enquanto não forem transferidos de volta às suas regiões, onde poderão comprovar estarem empregados.

O presidente do Movimento de Defesa da Advocacia, Marcelo Knopfelmacher, lembra que não se pode admitir o cumprimento de pena em regime mais severo daquele estipulado na sentença se o Estado, por ineficiência e descaso, não provê os meios necessários para tanto.