Publicidade predatória

Ligar concorrente a preço alto é prática desleal

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16 de novembro de 2013, 4h58

A propaganda que não promove a comparação qualitativa entre produtos ou serviços, mas apenas liga o concorrente à prática de preço superior, utilizando seu nome e sem autorização, atenta contra o princípio da livre concorrência. Logo, incorre em concorrência desleal.

O entendimento levou a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a manter integralmente a sentença que sustou a publicidade da rede de supermercados Walmart em cima de um de seus concorrentes, com base na comparação de preços. Nos dois graus de jurisdição, ficou clara a conduta abusiva da rede, uma vez que a publicidade não observou a lealdade que deve subsistir entre os concorrentes.

O relator da Apelação, desembargador Jorge Alberto Schreiner Pestana, afirmou no acórdão que a indicação dos preços do dia, por intermédio de cupons fiscais, denuncia que a rede Walmart adquiriu os itens numa loja da Rissul e, a partir dos valores praticados por esta, estabeleceu o preço para comercializar o seu próprio estoque do mesmo item.

“Ora, tal estratagema não demonstra que a ré comercializasse permanentemente por preços inferiores, mas que em dia certo e a partir da ciência prévia dos valores estabelecidos pela autora, colocou à venda produtos com custos inferiores, formalizando evidente prática desleal de mercado, pois não há evidências de que o quanto cobrava levava em conta seus próprios custos e margem de lucro, mas tão-somente que estava vinculado aos preços da concorrente, estes obtidos de forma antecipada nas lojas da demandante’’, observou o desembargador. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 31 de outubro.

O caso
Unidasul Distribuidora Alimentícia e Comercial Rissul foram à Justiça para sustar a publicidade, baseada em comparação de preços, feita pela rede de supermercados Walmart. Os cartazes foram afixados nas lojas BIG e Nacional espalhadas pelos municípios de Esteio, Gramado, Taquara, Cachoeirinha, Viamão e Igrejinha.

Os autores alegaram que a propaganda é ofensiva à imagem de seus estabelecimentos e caracteriza concorrência desleal. Além da interrupção da propaganda, pediram a fixação de multa no valor de R$ 100 mil para o caso de descumprimento da medida, se esta for concedida pela Justiça.

No transcorrer do processo, o Walmart conseguiu tirar a Unidasul do polo da ação, por ilegitimidade ativa, entendendo não haver direito de marca envolvendo os fatos, que se referem exclusivamente à marca Rissul.

Quanto ao mérito, a rede pontuou que o mercado é regulado pela liberdade econômica, livre iniciativa, direito de propriedade, isonomia entre os agentes e pela tutela do consumidor, o que legitima a adoção de estratégias de venda e publicidade, inclusive de modo comparativo.

Afirmou que esta liberdade inibe o estado de regular o mercado a ponto de substituir a estrutura fundamental do sistema capitalista. E que a comparação objetiva de preços não implica atribuição de prática de preço injusto ao autor, permitindo ao consumidor a compra pelo menor custo, sem ensejar erro ou engano ao cliente. E mais: que a parte autora não negou a prática de preços dados à publicidade.

A sentença
A juíza Jocelaine Teixeira, titular da 3ª Vara Cível da comarca de Esteio, afirmou na sentença que o estado-jurisdição tem de atuar como regulador das diversas liberdades em conflito, para fazer cessar o excesso praticado pelo réu em prejuízo da imagem da personalidade jurídica da parte autora e dos consumidores, com base no preceito de não-exclusão de apreciação, pelo Poder Judiciário, de ameaça ou lesão e direito, conforme dispõe o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição. Afinal, a propaganda calcada no comparativo de preços mostra-se excessiva e atinge a imagem do supermercado-autor.

Segundo a juíza, o Walmart vincula de modo claro o nome da parte autora como desfavorável ao consumidor, com base num único elemento de comparação para atrair clientes, que é o preço de apenas alguns produtos entre os múltiplos itens à venda em supermercados. A seu ver, esse modo de fazer publicidade desconsidera o conjunto dos preços praticados pela concorrência e outros fatores que interferem na deliberação do consumidor acerca da melhor opção de compra, como as condições de atendimento e venda, o espaço físico, dentre outros.

‘‘Com isso, o consumidor é induzido a eleger como vantajosa a compra no mercado réu, em prejuízo claro aos estabelecimentos da rede Rissul, expressamente referidos na publicidade comparativa questionada’’, deduziu.

A juíza tomou como paradigma o voto do desembargador Jorge Alberto Schreiner Pestana, proferido no Agravo de Instrumento 70048135800. O acórdão diz: ‘‘No entanto, merece acolhimento a inconformidade no que diz com a utilização do nome da agravante junto aos cartazes da publicidade comparativa, pois isso traz prejuízo à livre concorrência, já que pode induzir o consumidor a pensar que a empresa que consta na publicidade pratica preços superiores de um modo geral, e não apenas no produto especificado na publicidade’’.

A demanda foi julgada parcialmente procedente, determinando que o Walmart se abstenha de fazer propaganda comparativa de preços em seus estabelecimentos ou por outra forma de comunicação, com divulgação da marca Rissul. Em caso de desobediência, a magistrada determinou pagamento de multa diária no valor de R$ 50 mil.

Clique aqui para ler a sentença e aqui para ler o acórdão. 

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