Liderança na universidade

Cargo de reitor não é uma conquista, mas um ônus

Autor

  • Adib Jatene

    é cardiologista professor emérito da USP e diretor-geral do Hospital do Coração. Foi ministro da Saúde (governos Collor e FHC) e secretário estadual da Saúde de SP (governo Maluf).

7 de novembro de 2013, 13h33

*Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S.Paulo do dia 7 de novembro de 2013.

Desde o final dos anos 80 do século passado, espelhado no modelo implantado nas universidades federais, as entidades de funcionários, alunos e até de docentes vêm tentando implantar na USP a indicação do reitor e diretores de unidades por meio de eleições diretas.

Rebelam-se até contra a lista tríplice encaminhada ao governador para a escolha do reitor.

Manifestei-me, à época, em dois artigos. Num deles, "Hierarquia, direção e liderança", defendi a posição da congregação da Faculdade de Medicina da USP, que se colocava frontalmente contra a proposta da chamada eleição direta. O outro intitulava-se "Novo reitor para a USP".

Relendo-os, verifiquei que os argumentos então utilizados não foram invalidados, passados 25 anos. Permito-me citar alguns trechos.

"O cargo de reitor, como, de resto, os cargos administrativos, em uma universidade, não deve ser encarado como uma conquista, mas como um ônus que alguém aceita quando uma parcela considerável de colegas, que há anos acompanha sua carreira, dispõe-se a apoiá-lo não como um partido, mas como parte de um todo, propondo-se a trabalhar para somar e não para discriminar."

"Os destinos de uma universidade não podem ser decididos por quem não viveu o passado e não tem maior compromisso com o futuro, como é o caso dos alunos, nem por aqueles que, exercendo atividade meio, executam tarefas de apoio, como os funcionários."

"Não se pode pretender, igualmente, que o governador eleito, legitimamente e em pleito direto pela população, responsável pelas ações executivas e pela aplicação dos recursos obtidos desta mesma população de onde saem 97,5% dos recursos da USP, não possa indicar, entre três nomes selecionados pela própria universidade, aquele que deva gerir estes recursos."

"Existe um conflito de liderança. De um lado, o que se pode chamar de liderança reivindicatória, do tipo sindical, que é fundamental para um país livre. (…) O outro, o acadêmico, vai se estruturando ao longo do tempo em uma carreira, que progressivamente capacita os seus membros, que ou saem para atividades fora da universidade, em momentos diferentes de sua preparação, ou permanecem e vão subindo na hierarquia, por concurso de provas e títulos que culminam com o professor titular."

"Liderança acadêmica não deve aliciar, não deve agradar, não deve organizar partidários nem assumir atitudes demagógicas na captação de apoio." "Nada pior do que discutir com quem já tem posição definida e definitiva e busque não a verdade, mas conquistar aliados ou identificar adversários."

"Abrir mão da liderança acadêmica e admitir que a liderança reivindicatória assuma, progressivamente, a direção da universidade é alguma coisa com a qual os professores da Faculdade de Medicina não podem ser acusados de conivência."

"Talvez esteja faltando neste país uma liderança que realmente lidere, e não uma liderança que, acomodada, busca contemporizar com aquelas que, tendo objetivos definidos, atuam com agressividade, contando com a omissão dos que a eles se deveriam antepor."

Nada mais atual.

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  • é cardiologista, professor emérito da USP e diretor-geral do Hospital do Coração. Foi ministro da Saúde (governos Collor e FHC) e secretário estadual da Saúde de SP (governo Maluf).

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