Proibição em xeque

Estados deverão decidir sobre casamento gay nos EUA

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28 de março de 2013, 19h10

No segundo dia de audiências na Suprema Corte dos EUA, nesta quarta-feira (28/3), destinadas a decidir o futuro do casamento homossexual no país, a maioria dos ministros indicou que pode derrubar a cláusula relevante da Lei da Defesa do Casamento (DOMA), que estabelece que o casamento só pode existir entre um homem e uma mulher, segundo os jornais norte-americanos.

Na audiência de terça, em que era analisada uma lei da Califórnia que proíbe o casamento gay, prevaleceu a indecisão entre os ministros e não houve qualquer indicação de que tendiam a manter ou derrubar a lei. A decisão sobre a chamada "Proposição 8" da Califórnia é a mais importante, porque é a que vai definir a constitucionalidade das leis que proíbem o casamento homossexual.

Nas discussões sobre a DOMA, se evidenciaram mais claramente as posições dos ministros, com quatro conservadores votando a favor da lei e quatro liberais votando contra. O fiel da balança será o ministro conservador Anthony Kennedy, que deu a entender que vai votar contra a lei que, poderá, então, ser derrubada pelo tradicional placar de 5 a 4. Se essa previsão se confirmar, os casais homossexuais terão os mesmos direitos a benefícios do casamento que já são dados aos casais formados entre homens e mulheres.

Kennedy declarou que a DOMA é uma lei "inconsistente". Ao mesmo tempo em que ela atribui aos estados a autoridade para decidir o que é o casamento, ela estabelece que o casamento só pode existir entre um homem e uma mulher. Ele disse também que "o governo federal deve respeitar o compromisso histórico do casamento, bem como os direitos das crianças que são criadas por casais gays". Segundo o ministro, só na Califórnia 40 mil crianças podem se beneficiar do reconhecimento jurídico de seus pais.

A ministra Ruth Ginsburg fez a observação de maior repercussão. Ela comparou o casamento tradicional e o casamento homossexual a dois dos tipos de leite disponíveis no país. Disse que o casamento tradicional é considerado um whole milk, com todas as gorduras (ou benesses) que tem direito, enquanto o casamento gay é uma espécie de skim milk — é casamento "magro", sem os benefícios do outro tipo. Em outras palavras, o sistema criou um casamento integral e um meio casamento.

O que está em jogo
Em termos jurídicos, a Suprema Corte vai discutir se as restrições impostas ao casamento homossexual ferem o princípio da igualdade perante a lei. Esse direito foi consagrado na 14ª Emenda à Constituição dos EUA: "nenhum estado deve negar a qualquer pessoa em sua jurisdição a proteção igual da lei". No caso, será uma questão de decidir se esse princípio se aplica ou não à DOMA — e, consequentemente, a outras leis que regulam o casamento gay. Se for aplicável, a cláusula em questão da DOMA será derrubada.

Mas a corte pode nem chegar a essa discussão constitucional, se os ministros entenderem, por maioria, que a definição do casamento, em qualquer de suas formas, é uma questão exclusiva dos estados. Se esse for o entendimento, a conclusão será a de que leis federais não têm que se meter na esfera estadual. E que a DOMA é um despropósito.

Deixar a questão para os estados é uma forte tendência, até porque foi defendida pelo ministro Anthony Kennedy, que é o que tem mais peso na história todo por sua posição de fiel da balança. "Há um risco real de a lei infringir o papel tradicional dos estados de definir o casamento", ele declarou.

Essa decisão, se confirmada, será uma meia vitória para as duas partes — uma decisão de acomodação política, em que os ministros vão agradar e desagradar a gregos e troianos, porque, em última instância continua tudo como está. Nos nove estados e no Distrito de Colúmbia, que já aprovaram o casamento homossexual, a medida se consagra. Nos demais estados, que proibiram ou estão indecisos, o debate continua entre as duas partes. 

Mas, se a Suprema Corte entrar na questão da constitucionalidade da DOMA e a declarar inconstitucional, o resultado será uma espécie de reviravolta jurídica no país. Em primeiro lugar, todos os 30 estados que criaram dispositivo em suas constituições proibindo o casamento homossexual terão de revê-los. Além disso terão de ser reformuladas mais de mil leis federais e estaduais, segundo os jornais, além de mudar ou adaptar programas governamentais que não reconhecem esses casais.

Os ministros também se propõem a analisar — porque eles mesmos levantaram a questão — um lado mais político da decisão sobre a DOMA. Isto é, se o estado tem o direito de decidir, para o cidadão, o que é casamento. No entendimento de alguns ministros, quando o Congresso cria uma lei, e o governo federal a sanciona estabelecendo que o casamento só pode ser celebrado entre um homem e uma mulher, isso pode representar uma interferência estatal na vida dos cidadãos.

Curiosamente, isso vai contra a principal bandeira do Partido Republicano, que defende um estado "fraco", em favor de uma iniciativa privada "forte". Nos dois casos que estão perante à Suprema Corte, os Republicanos assumiram a defesa das leis que proíbem o casamento gay — especialmente a DOMA, que é uma edição estatal.

Em termos práticos, uma possível "condenação" da DOMA terá consequências nas declarações do imposto de renda e em todos os benefícios destinados ao "cônjuge sobrevivente", em casos de morte. Vai afetar as grandes corporações, que têm de definir políticas trabalhistas para cada estado, discriminando, oficialmente, entre trabalhadores de um estado em que o casamento homossexual foi legalizado do outro que o criminalizou. Entre outras coisas, a decisão também poderá acabar com um constrangimento que se tornou costumeiro para as forças armadas: quando um soldado gay morre em combate, os militares não podem dar a "honra da notificação oficial" a seus parceiros, porque não são cônjuges.

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