Perfil psicológico

Entender personalidade dos advogados ajuda na gestão

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20 de março de 2013, 10h25

Quem diria que conhecer a personalidade dos advogados ajuda a aumentar as receitas do escritório? A consultora Ronda Muir, especializada em desenvolvimento organizacional e dinâmica das bancas, diz que isso já foi confirmado por estudos. Ela acredita que, com um bom conhecimento do perfil psicológico de seus advogados, as sociedades têm mais facilidade para conquistar clientes, aproveitar melhor as oportunidades de negócios, aperfeiçoar suas estratégias operacionais, tomar melhores decisões de gerenciamento e aumentar a produtividade dos advogados.

Tudo isso é possível, garantiu ela em um artigo publicado pela FindLaw. O conhecimento é importante, ressalta, para os administradores do escritório atribuírem responsabilidades, escolhendo os advogados certos para os casos certos ou para selecionar a melhor estratégia para ajudar clientes a solucionar conflitos. Também é útil para montar equipes com capacidade para analisar problemas por diversos ângulos e propor soluções diferenciadas.

Serve, ainda, para advogados que pretendem montar uma sociedade e desejam contar com personalidades que se complementam, para aumentar o campo de ação e a competitividade.

A área de resolução de conflitos é um bom exemplo de oportunidade para ganhar ou manter clientes, com a simples escolha do advogado com a personalidade certa para gerir um caso. A banca precisa descobrir qual é a melhor estratégia para resolver cada conflito — e o advogado capaz de aplicá-la de forma eficiente — para aumentar as probabilidades de resolvê-lo e, portanto, aproveitar melhor as oportunidades que surgem.

Há um método conhecido de resolução de conflitos, o de Thomas-Kilmann. É uma ferramenta que identifica e avalia as cinco melhores estratégias para esse fim: "competir" (ou disputar), "colaborar" (trabalhar em conjunto para resolver um problema), "chegar a acordo" (abrindo mão de reivindicações), "dispensar" (o caso, desistindo de uma disputa difícil) e "acomodar" (a situação). Essas estratégias envolvem níveis diferentes de cooperação e exigem empregos diferentes de tempo e de esforço, diz a teoria.

Idealmente, cada pessoa deveria ter a capacidade de avaliar um determinado conflito sob todos os ângulos, comparando-os com os cinco métodos de resolução à disposição. E escolher o melhor. No entanto, na prática, as pessoas tendem a adotar uma ou duas dessas estratégias apenas, por hábito ou conveniência. Advogados, como lhes é típico, têm uma preferência por "competir" (vamos ver quem ganha) e "dispensar" ("estou fora dessa") — as duas estratégias menos cooperativas, diz a consultora.

Isso é, na verdade, apenas uma tendência e, obviamente, não se aplica a todos os advogados e a todas as situações. Mas é uma tendência normal, que difere os advogados de, por exemplo, empresários e administradores públicos, que preferem, de uma maneira geral, optar por estratégias na seguinte ordem: colaborar, chegar a acordo, competir, dispensar e acomodar. Os advogados, por sua vez, tendem a se sentir mais atraídos pela guerra total, com a perspectiva da vitória, ou pela retirada, se a probabilidade de vencer não for boa.

Por isso, perdem oportunidades de negócios. Se empresários e outros possíveis clientes tendem a preferir, em primeira instância, "colaborar" e, sem segunda, "chegar a um acordo" em vista de um conflito, a probabilidade de os advogados se sintonizarem com eles — e manter uma relação mais duradoura — seria a de se colocar na mesma posição do cliente. Isto é, concordar em tentar a colaboração e o acordo, primeiramente. E trabalhar para isso. De outra maneira, quem acaba se retirando é o cliente.

Tipos de personalidade
Um método de avaliação de personalidade é o "Myers Briggs Type Indicator (MBTI)". Ele foi usado em um estudo elaborado para avaliar os tipos de personalidades predominantes dos americanos, com destaque para algumas profissões, incluindo a de advogado.

A primeira categoria separa os "extrovertidos" dos "introvertidos", mais conhecida popularmente. Os extrovertidos são sociáveis, comunicativos, interativos e gostam de expor suas opiniões. Os introvertidos são o contrário e concentram sua energia no mundo dos pensamentos. A maioria da população do país é extrovertida (70%). Entretanto, a maioria da população de advogados é introvertida (57%) — o que foi uma surpresa.

A segunda categoria confronta os "sensoriais" e os "intuitivos". Os sensoriais, realistas e práticos, obtêm informações por meio de fatos e dados concretos. Valorizam a expertise e a lógica. Os intuitivos, criativos e complexos, processam as informações que recebem, observam, pensam e intuem suas próprias conclusões. Examinam como fatos e ideias se inter-relacionam. Outra surpresa: 50% dos advogados são intuitivos, enquanto 70% da população é sensorial.

A terceira categoria opõe os "pensadores" aos "sentimentais" — aqueles com maior tendência de sentir do que de pensar. Os pensadores são objetivos, pesam prós e contras, não deixam os sentimentos influenciarem suas decisões, valorizam a lógica e a justiça. Os sentimentais tendem a tomar decisões com base em seus instintos e em seus sentimentos. Valorizam a harmonia e a empatia. Nenhuma surpresa: 78% dos advogados são pensadores, contra 47% da população em geral.

A quarta categoria compara os "julgadores" com os "perceptivos". Julgadores ficam satisfeitos quando decisões são tomadas. Não deixam problemas se acumularem, agem sem pensar muito, preferindo se arrepender. Os perceptivos preferem decisões bem pensadas e, consequentemente, com mais chances de acertar. Pensam muito antes de agir, porque não querem se arrepender. Julgadores mergulham em projetos e os finalizam. Perceptivos esperam o momento certo de iniciar um projeto. Também sem surpresas: 63% dos advogados e 55% da população americana são julgadores.

Aplicação prática
Faz sentido o fato de mais advogados (57%) serem introvertidos? Pode ser. Ajuda, por exemplo, a cumprir a prescrição da confidencialidade. Não falar demais. "Os introvertidos internalizam seus processos de pensamento, produzindo uma opinião significativa quando se expressam", diz a consultora. Os 43% restantes, os extrovertidos, preferem discutir as questões e, consequentemente, as interações interpessoais. E são mais úteis para desenvolver relacionamentos com clientes e com todas as demais pessoas envolvidas em sua atividade.

No entanto, ambos podem programar suas mentes para agir de forma extrovertida ou introvertida conforme as situações e necessidades. É questão de desligar uma tomada e ligar outra, conscientemente. As demais características de personalidade acompanham o mesmo raciocínio: elas são mais ou menos úteis para determinadas tarefas ou projetos da banca; e os advogados, com autoprogramação, podem ligar ou desligar seu lado sensorial/intuitivo, pensador/sentimental ou julgador/perceptivo.

Atributos da personalidade
O professor da Universidade da Pensilvânia Martin Selegman foi o fundador da escola de Psicologia Positiva, que se foca em atributos e comportamentos que geram sucesso e felicidade. Ele identificou um atributo que é fundamental para ambos: otimismo — com base em um estudo de 104 profissões. A conclusão vale para 103 profissões. Não vale para advocacia.

Os advogados, no exercício da profissão, são consistentemente pessimistas, revelou o estudo — desde a faculdade de Direito (o autor não tinha dados sobre jardim de infância). E, no estudo, o pessimismo foi correlacionado aos advogados que fazem sucesso na atuação profissional. Na faculdade, os alunos mais pessimistas eram os que obtinham notas mais altas. "Na advocacia, o pessimismo é um atributo positivo", conclui o estudo. "Ele exerce efeitos profundos nos indivíduos com essa qualidade profissional, afetando suas capacidades de resistir e seus relacionamentos profissionais e pessoais", escreveu.

Em outra avaliação de personalidade, em uso há 40 anos, feita com mais de um milhão de profissionais, com base na ferramenta "Caliper Personality Profile" (Perfil Caliper), revelou uma qualidade que distingue os advogados dos demais seres humanos: o ceticismo.

O método define ceticismo como uma característica que varia da capacidade de ser cínico, crítico, interrogador, discutidor e autoprotetor, no polo superior, a tolerante, confiante, favorável ao benefício da dúvida, no polo inferior. Entre a população "normal", a "taxa de ceticismo" está em torno de 50%. Entre os advogados, ela está em torno de 90%.

"Essa característica pode ser muito útil na advocacia, particularmente nas áreas de contencioso, tributária e de fusões e aquisições", diz o estudo. "O problema, é que as pessoas tendem a usar seus atributos de personalidade característicos em todas as áreas de suas vidas. E nível tão alto de ceticismo pode complicar reuniões de sócios, deliberações da equipe, trabalhos de comissões e os relacionamentos pessoais, que exigiriam mais confiança e colaboração", afirma o estudo.

Outros atributos que se evidenciaram em altas doses nos advogados são o de sentimento de urgência (senso de imediação ou impaciência) e o de autonomia (independência ou morte). Atributos manifestos em baixa dose são resiliência (processamento de retorno de informações, comentários e opiniões e recuperação de derrotas) e sociabilidade (interação com outros e iniciação de conexões íntimas).

Inteligência emocional
O teste de inteligência emocional, conhecido como "Mayer Salovey Caruso Emotional Intelligence Test (MSCEIT)", trouxe uma boa notícia e uma má notícia para os advogados. O escore de inteligência dos advogados (115-130) é bem mais alto do que a média nacional dos EUA. No entanto, a inteligência emocional foi o contrário, basicamente. A pontuação mais baixa foi em "capacidade de perceber suas próprias emoções e as dos outros". A mais alta foi em "capacidade de entender emoções, como uma habilidade mais cognitiva".

Isso significa, segundo o estudo, que os advogados são capazes de racionalizar, com competência, sobre emoções e suas implicações, mas os dados emocionais que analisam dia sim, dia não, provavelmente são incompletos ou imprecisos — os advogados têm dificuldade de entender o que eles mesmos e os outros estão sentindo. O resultado é que os advogados podem ter mais dificuldades do que outros profissionais de reagir tranquilamente diante de um cliente insatisfeito ou irritado, a um colega subjugado por excesso de trabalho ou a um sócio raivoso — e, às vezes, até mesmo às próprias reações.

Esse estudo pode ser comparado com a pesquisa que colocou a maioria dos advogados americanos como extrovertidos, intuitivos, mas não sentimentais. Também se pode estabelecer correlações entre advogados brasileiros e americanos.

De qualquer forma, os administradores do escritório, munidos de conhecimentos sobre a personalidade e comportamentos dos advogados, podem entender melhor a dinâmica organizacional da banca e utilizar melhor os atributos de seus colaboradores, diz a consultora.

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