Composição do supremo

Mensalão expôs dificuldade do STF em matéria penal

Autor

  • Arinda Fernandes

    é pós-doutora em Direito pela II Università di Roma —Tor Vergata doutora e mestre em Direito Penal pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro coordenadora-Geral do Centro de Estudos Interdisciplinares em Justiça Criminal da Universidade Católica de Brasília membro da Associação Internacional de Direito Penal e Procuradora de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios onde coordena o Núcleo de Cooperação Internacional.

6 de março de 2013, 7h12

Desde o saudoso Nelson Hungria que o Supremo Tribunal Federal (STF) não possui um jurista penal entre seus membros.

O que é um penalista? Entenda-se, aqui, por penalista, não apenas um prático do dia a dia do Direito Penal/Processual Penal: juízes, promotores de Justiça, defensores públicos e advogados criminalistas. Trata-se, na verdade, de uma pessoa com profunda formação em Ciência Penal, um doutrinador penal, com ideias e prática. Penalista é, assim, aquele que cultiva o Direito Penal como ciência.

Não é segredo para ninguém que a atual competência do STF é, em sua maior parte, constituída por matéria penal.

Em que pese isso, nenhum dos atuais ministros tem formação significativa na área penal. Tem-se ministro especializado em Direito do Trabalho, matéria que, sequer, faz parte da competência da corte. Há constitucionalistas, tributaristas, processualistas civis, administrativistas etc, menos um penalista.

O recente julgamento da Ação Penal 470 —o mais importante julgamento da história do STF— versa, do início ao fim, sobre matéria penal, trazendo a lume questões intrincadas e diretamente relacionadas ao Estado Democrático de Direito e às garantias constitucionais penais e penais constitucionais dos acusados.

Nesse julgamento, visto ao vivo e a cores pelo Brasil e pelo mundo, restou clara a dificuldade com que se houve a Corte Suprema com o Direito Penal e suas implicações, notadamente no que tange à aplicação das penas.

E é, exatamente por isso, que a presidente da República deveria voltar sua atenção e sensibilidade para as necessidades da corte e as expectativas dos estudiosos do Direito Penal de todo o país.

Sem querer interferir no livre processo de escolha de sua excelência, mas impulsionada pelo desejo, apenas, de demonstrar a razoabilidade desse entendimento, pinço alguns pontos que deveriam ser objeto de análise mais detida, diante da importante atualidade.

Questões como garantismo jurídico-penal e direito penal do inimigo; princípios fundamentais do direito penal —verdadeiro pilar estrutural do Estado de Direito, a segurança jurídica—; o Direito Penal Internacional diante do considerável aumento de casos, nessa era globalizada, e, como consequência, o aporte de conhecimentos ligados à cooperação internacional, sobretudo quando não se tem uma homogeneidade das normas penais nos países, são pontos de destacada e delicada observação.

O avanço nas considerações do Direito Penal Internacional sinaliza para importante análise do tema, diante da mondialisation, no dizer dos franceses. A luta pela homogeneidade dos conceitos penais, que deságua necessariamente na desburocratização da cooperação internacional, constitui uma das bandeiras a ser envergada no cenário jurídico globalizado. É necessário, então, que todos falem a mesma língua diante da abolição das fronteiras.

Nos critérios de escolha do novo ministro do STF, um profundo conhecimento da área penal nacional e internacional tornar-se-á imprescindível, mormente nas futuras e acirradas discussões que advirão, caso vingue a reforma penal alavancada pelo Senado.

Outro dado relevante diz respeito à recente apresentação de Proposta de Emenda à Constituição (PEC) referente à forma de composição do STF. Interessante sublinhar, a título de ilustração, que a Itália, desde 1948, busca sempre, na composição de sua Corte Constitucional, um equilíbrio entre a exigência de técnica e competência jurídica —própria de órgãos do poder judiciário e da academia— e o componente inevitavelmente político.

Lá, são quinze juízes. E a escolha recai sobre experts do Direito, vale dizer, magistrados de instâncias superiores (aí, compreendidos juízes e membros do ministério público), professores universitários titulados (doutores) em matéria jurídica e advogados com, no mínimo, vinte anos de exercício da advocacia. E a forma de nomeação é bem interessante, uma vez que um terço se dá pelo presidente da República, outro terço pelo Parlamento em sessão conjunta (deputados e senadores) e, por fim, o último terço pela suprema magistratura (juízes e ministério público).

Com tais considerações, augura-se uma escolha fundada nesses aspectos tão importantes para uma composição equilibrada a contribuir, ainda mais, para o fortalecimento de nosso Judiciário e garantia dos direitos da pessoa humana – que deve ser o centro de todo o Direito.
 

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  • é pós-doutora em Direito pela II Università di Roma —Tor Vergata, doutora e mestre em Direito Penal pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, coordenadora-Geral do Centro de Estudos Interdisciplinares em Justiça Criminal da Universidade Católica de Brasília, membro da Associação Internacional de Direito Penal e Procuradora de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, onde coordena o Núcleo de Cooperação Internacional.

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