Advogado x juíza

'Desentendimentos fazem parte do Judiciário', diz TRT-RS

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17 de maio de 2013, 11h23

"Juízes, desembargadores e advogados não se desvestem de sua ‘‘humanidade’’ no exercício de suas funções, o que não é característica negativa, mas requisito para que se tenha a empatia necessária para lidar com a distribuição da Justiça. Daí que os pequenos desentendimentos que surgem na lida diária no Judiciário são mera decorrência dessa soma de fatores."

Este pequeno trecho de ementa de acórdão, lavrado no dia 8 de maio pelo Pleno do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul, resume bem o fundamento que levou à absolvição de uma desembargadora acusada de cometer infração funcional. A ex-titular da 1ª Vara do Trabalho da Capital gaúcha foi denunciada por ameaçar advogado em plena audiência e de lhe imputar o crime de ‘‘tergiversação’’, por ele ter oferecido seu cartão de visita à parte contrária.

Aos olhos do Pleno da corte, que não acolheu o Recurso Administrativo do advogado após derrota na Corregedoria, não existe motivo para punição disciplinar quando não são extrapolados determinados limites, comuns a todos os contratos sociais.

Para o colegiado, que deliberou o caso em sessão no dia 29 de abril, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento da então juíza, em face também da conduta exasperada do advogado, conduz a uma total inexpressividade da lesão jurídica provocada, observado o "princípio da Insignificância".

A relatora do Recurso Administrativo, a presidente da corte, desembargadora Maria Helena Mallmann, apurou que os ânimos dos presentes à audiência já estavam exaltados desde a reação do procurador-denunciante, incomodado com a censura da juíza.

‘‘Não há dúvidas de que ocorreu um diálogo mais ríspido entre o advogado e a juíza, mas esta não proferiu nenhuma ameaça, tampouco ofensa relevante contra o advogado. Tanto que ambas as testemunhas ouvidas demonstraram certa noção de insignificância quanto ao incidente’’, resumiu a presidente.

Pedido de punição
Os fatos que deram ensejo ao pedido de punição administrativa em desfavor da hoje desembargadora Laís Helena Jaeger Nicotti ocorreram no dia 30 de maio de 2012. Conforme detalha o relatório do acórdão, a então titular da 1ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, durante a audiência, teria acusado o advogado Jacques Vianna Xavier, procurador da parte reclamada, de praticar crime de tergiversação. 

Conhecido como ‘‘patrocínio simultâneo’’, o crime de tergiversação está caracterizado juridicamente no parágrafo único do artigo 355 do Código Penal. Trata-se de crime praticado por advogado ou procurador judicial que defende na mesma causa, simultânea ou sucessivamente, partes contrárias. A pena prevista é de detenção, de seis meses a três anos, além de multa.

Naquela ocasião, conforme registra o Termo lavrado pela secretária Cristina Machado Keunecke, a juíza determinou o adiamento da audiência inaugural, em face de emenda na peça inicial, feita pela advogada da parte reclamante. ‘‘Pela ordem, o procurador do reclamado diz que gostaria que o juiz apreciasse neste momento, face à simplicidade do aditamento, evitando a adiamento e a desnecessidade de 3 testemunhas [da] reclamada voltarem novamente’’. O pedido, entretanto, foi indeferido, e a audiência, remarcada para fins de junho de 2012.

Xavier afirmou que, após ter protestado contra a decisão da juíza, esta teria passado a agir de forma arrogante, sugerindo que ele voltasse a estudar e dizendo, claramente, que ele não tinha ‘‘cérebro’’. Explicou que se recusou a assinar a ata da audiência porque não constaram os incidentes ocorridos, especialmente as ameaças feitas pela magistrada. Ela teria dito, literalmente: ‘‘Tu esqueceu que quem vai julgar este processo sou eu?”

Defesa da magistrada 
Laís Helena Jaeger Nicotti disse que o advogado, insatisfeito com o adiamento da audiência, insistiu para que fosse apreciada a emenda à inicial naquela oportunidade, passando a dirigir a palavra diretamente ao reclamante. Foi advertido por esta atitude.

A magistrada sustentou que em nenhum momento acusou o advogado de tergiversação. Este, ao comparecer na Secretaria da Vara após a audiência, segundo ela, não relatou qualquer insatisfação em relação à sua postura. E mais: afirmar que julgará o processo não é ameaça, já que este está vinculado à sua apreciação, disse a desembargadora.

Depois de ouvida uma testemunha de cada parte, os autos foram enviados para a Corregedoria Regional do TRT, que decidiu pelo arquivamento do Procedimento Administrativo. Contra esta decisão é que o advogado se insurgiu, levando o caso à votação no Tribunal Pleno da corte trabalhista.

Clique aqui para ler o acórdão do Pleno TRT-RS.
Clique aqui para ler o Termo da Ata de Audiência.

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