Reforma legal

A execução da sentença penal condenatória injusta

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16 de maio de 2013, 11h07

Sua Excelência, o ministro Sidnei Agostinho Beneti autorizou cada um dos membros da Comissão Especial de Juristas, com a finalidade de realizar estudos e propor a atualização da Lei de Execuções Penais, a se manifestarem publicamente na qualidade de membros.

Permitiu, portanto, que individualmente manifestassem suas opiniões e sugestões sobre a referida Lei. Pediu apenas o cuidado de ao manifestar deixar claro que as posições pessoais não representavam, até serem votadas, a posição da Comissão. Com estas ressalvas é que se escreve.

O tema que motiva este texto é decorrente de um turbilhão de ideias que se formam, se esbarram e, enfim, se encontram na cabeça de quem tem a obrigação de, no mínimo, tentar realizar algo de bom para o Direito do país.

A memória recente se sobrepõe. A última consulta, o último caso, a última sensação de injustiça. O último caso, interessantemente envolvia a execução de uma sentença penal condenatória.

Um pai vem e conta que seu filho foi condenado e que a condenação estava sendo executada em prisão domiciliar.

Explicou que na execução da pena um oficial foi à casa de seu filho ver se o mesmo encontrava-se recolhido e, por um defeito do interfone, não conseguiu fazer o contato. Seu temor, como pai era de que o filho na audiência perante o juízo de execução fosse regredido em seu regime prisional e submetido ao cárcere.

Adiantou ao advogado que o seu temor decorria da “fama” da magistrada responsável pela execução da pena.

À cabeça vêm os artigos 647 e 648, VI do Código de Processo Penal que explicitam:

Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.
Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:
VI – quando o processo for manifestamente nulo;

O processo era nulo.

De forma imediata, contrapondo o pensamento inicial surge a recente decisão do ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal:

HABEAS CORPUS – JULGAMENTO POR TRIBUNAL SUPERIOR – IMPUGNAÇÃO. A teor do disposto no artigo 102, inciso II, alínea “a”, da Constituição Federal, contra decisão, proferida em processo revelador de habeas corpus, a implicar a não concessão da ordem, cabível é o recurso ordinário. Evolução quanto à admissibilidade do substitutivo do habeas corpus. PROCESSO-CRIME – DILIGÊNCIAS – INADEQUAÇÃO. Uma vez inexistente base para o implemento de diligências, cumpre ao Juízo, na condução do processo, indeferi-las.
(HC 109956, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 07/08/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 10-09-2012 PUBLIC 11-09-2012)

Vêm à cabeça outras inúmeras decisões amparadas no julgado do Supremo Tribunal Federal, tais como:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. DESCABIMENTO. MODIFICAÇÃO DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO STJ, EM CONSONÂNCIA COM NOVO POSICIONAMENTO ADOTADO PELO PRETÓRIO EXCELSO. CONDENAÇÃO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. ALEGAÇÃO QUE DEMANDA APROFUNDADO REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS. INVIÁVEL NA VIA ESTREITA DO HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO E CONCURSO DE PESSOAS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
– Este Superior Tribunal de Justiça, na esteira do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, tem amoldado o cabimento do remédio heróico, adotando orientação no sentido de não mais admitir habeas corpus substitutivo de recurso ordinário/especial. Contudo, a luz dos princípios constitucionais, sobretudo o do devido processo legal e da ampla defesa, tem-se analisado as questões suscitadas na exordial a fim de se verificar a existência de constrangimento ilegal para, se for o caso, deferir-se a ordem de ofício.
– O magistrado singular concluiu, com base nas provas produzidas em juízo, que a participação do paciente nos delitos restou suficientemente comprovada nos autos. Dessa forma, a análise da questão demanda imersão no conjunto fático-probatório, incompatível na via do habeas corpus, caracterizado pela estreiteza cognitiva – A prática de furto qualificado pelo rompimento de obstáculo e concurso de pessoas, como ocorreu in casu, denota maior reprovabilidade da conduta e evidencia a efetiva periculosidade do agente, o que afasta o reconhecimento da atipicidade material da conduta pela aplicação do princípio da insignificância. Precedentes.
Habeas corpus não conhecido.
(HC 260.802/RS, Rel. Ministra MARILZA MAYNARD (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE), QUINTA TURMA, julgado em 23/04/2013, DJe 25/04/2013)

O até então Tribunal da Cidadania alargou a restrição, o Habeas Corpus não poderia substituir recurso especial. De certo, os tribunais de justiça passaram a dizer que o Habeas Corpus não pode substituir o recurso em sentido estrito que visa reforma de decisão “queindeferir o pedido de reconhecimento da prescrição ou de outra causa extintiva da punibilidade (artigo 581, IX do CPP).

Nada há a ser feito, para aquele caso em concreto em razão da guinada jurisprudencial.

Explanaria o mais afoito: — CABE REVISÃO CRIMINAL!

Não cabe a revisão criminal porque o caso não se adequa aos requisitos do artigo 621 do Código de Processo Penal.

E assim como este caso, existem muitos outros e outros. Nas penitenciárias existem muitos e muitos casos de prisão decorrente de sentença penal condenatória inválida.

A oportunidade de mudança desta situação surge com o convite para integrar a Comissão de Juristas do Senado.

É que se um dos problemas da execução penal é o cumprimento de sentença nulas ou injustas, a forma de desconstituição destas sentenças possui vinculação temática à Comissão Especial de Juristas, com a finalidade de realizar estudos e propor a atualização da Lei de Execuções Penais.

Daí a sugestão para constar no texto da Lei de Execuções Penais artigo que expressamente a possibilidade da utilização do Habeas Corpus como meio hábil à desconstituição do título executivo penal.

Talvez seja esta a melhor forma para se trazer ao debate o absurdo que é a guinada jurisprudencial tomada pelos tribunais superiores, que obstaram, com certeza a evolução do Direito e da Jurisprudência.

Vale lembrar, foi o Habeas Corpus de um preso que fez o Supremo Tribunal Federal reconhecer a inconstitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 2º da Lei 8.072/90 que proibia a progressão de regime de cumprimento de pena nos crimes hediondos (HC 82.959).

Também foi por Habeas Corpus que o Supremo Tribunal Federal entendeu que era inconstitucional a execução provisória da pena (HC 84.078). Isso sem dizer que existem estatísticas que indicam que cerca de trinta por cento dos Habeas Corpus impetrados no Supremo Tribunal Federal eram concedidos.

O atual posicionamento precisa ser revisto ou reposto por Lei, caso contrário terá que estipular na Lei de Execuções Penais um capítulo especial para cuidar do caso de presos injustamente encarcerados.

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