Casamento gay

Para advogados, decisão do CNJ é válida, mas falta lei

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14 de maio de 2013, 19h28

Nesta terça-feira (14/5), o Conselho Nacional de Justiça aprovou uma resolução que determina aos cartórios de todo o país que convertam a união estável homoafetiva em casamento civil. De acordo com o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, a decisão do Conselho torna efetiva a decisão do STF que reconheceu, em 2011, a legalidade da união estável entre pessoas do mesmo sexo.

Barbosa qualificou como contrassenso ter de esperar que o Congresso Federal estabeleça a norma e afirmou também que os cartórios estão descumprindo a decisão do STF. "O conselho está removendo obstáculos administrativos à efetivação de decisão tomada pelo Supremo, que é vinculante”, afirmou.

Para Luiz Eduardo Gomes Guimarães, do escritório Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra, a resolução vai de acordo com o que foi decidido no Supremo Tribunal Federal. “Se foi reconhecida a união estável não há porque não reconhecer o casamento”, explica. Ele pondera que apesar de acertada, a decisão do CNJ não é protegida por lei. “Pode ter a união homoafetiva. É inegável que um casal homossexual é uma entidade familiar. Porém, não pode se tornar casamento porque o Código Civil e a Constituição são específicos ao definir que a união estável e o casamento é a união entre homem e mulher. Da maneira como foi feito, o casamento homossexual não é protegido pela Constituição”.

“A decisão não é equivocada, porém a forma é. Isto deveria ser feito por lei. Está claro para a sociedade que o direito da união homoafetiva existe, porém esta deve ser definida por lei. O CNJ não deveria definir isto, pois quem faz a lei é o legislativo”, diz Guimarães. Segundo ele, ao legislar o Judiciário extravasa sua competência.

Já para Álvaro Villaça Azevedo, presidente da Comissão de Estudos de Direito de Família do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), a fundamentação do ministro Joaquim Barbosa está equivocada. “Jamais poderia haver conversão de união estável homoafetiva para casamento pois o Supremo Tribunal Federal não reconheceu a união estável homoafetiva. O Supremo admitiu a proteção do casal homoafetivo, dando a eles os mesmos direitos, mas não a união estável”, explica. Azevedo explica que o ministro poderia ter usado como fundamento decisão do Superior Tribunal de Justiça, que admitiu o casamento entre duas lésbicas.

Para Luiz Kignel, especialista em direito de família e planejamento sucessório, sócio da PLKC Advogados, o CNJ e o STF acertaram, ao definir um anseio da sociedade na qual o Congresso se omitiu. “O CNJ fez bem em regulamentar este ponto. Isso é cidadania. É princípio da igualdade. O cidadão que está nesta situação precisa de uma resposta. Como o Congresso foi omisso, o Judiciário foi provocado e obrigado a decidir”, explicou.

Quanto ao fato do Judiciário estar legislando, ele explica que a norma deveria ter partido do Congresso, porém o Judiciário não poderia deixar de se manifestar ao ser questionado pelo cidadão. “Diante desta provocação ele é obrigado a decidir. O correto seria a regulamentação ter vindo do Congresso, porém o projeto lá está parado e diante da omissão, o Judiciário decidiu. Depois virá o Congresso atrasado regulamentar o que já está definido”, conclui.

O presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos de OAB, Wadih Damous considerou um " avanço" a resolução. "Trata-se de uma norma impessoal, genérica e destinada a todos – ao Estado e aos que querem apenas exercer o direito de constituir uma família independente de sua orientação sexual".

A decisão do CNJ, disse Damous, deve ser comemorada porque "o estado com essa decisão deixa de ser um fator de estigmatização e passa a ser de legitimação". Ele lembrou que no último ano, segundo levantamento da Associação de Notários e Registradores do Brasil (Anoreg-BR), mais de 1.200 casais do mesmo sexo registraram suas uniões nos principais cartórios de 13 capitais.

Dúvidas no Judiciário
Em setembro de 2012, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reconheceu a possibilidade de a união estável entre dois homens ser convertida em casamento depois de decisões contrárias em primeira instância.

Na ocasião, o relator do recurso, desembargador Ricardo Moreira Lins Pastl, salientou que o Código Civil, ao regular o casamento, refere claramente que se trata da união entre um homem e uma mulher. Contudo, observou que decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.183.378/RS) reconheceu a possibilidade jurídica do casamento homoafetivo, por considerar que o Código Civil não o veda expressamente.

‘‘Sem margem a dúvidas, os indivíduos devem ser livres para escolher o parceiro conjugal’’, afirmou o desembargador. ‘‘Permitir-se que heterossexuais se casem e não os homossexuais é ato discriminatório, é ato atentatório à igualdade perante a lei’’. Ele lembrou que a questão foi julgada também pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 4.277 e ADPF 132), confirmando o entendimento pela possibilidade da união entre pessoas do mesmo sexo. ‘‘Se é juridicamente possível o reconhecimento de uma união estável homoafetiva, (…) não há por que não se permitir que seja convertida em casamento, aliás, como recomenda o artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição Federal, ao determinar que a lei facilite essa conversão’’, escreveu.

Em sentido oposto, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou nesta semana a conversão da união estável em casamento a um casal homossexual. De acordo com o relator, desembargador Luciano Rinaldi, embora muitos países venham reconhecendo, mediante reformas legislativas, a possibilidade de casamento entre pessoas do mesmo sexo, o Brasil ainda não o fez, não havendo, portanto, amparo legal que autorize tal concessão.

Para ele, em respeito ao princípio da segurança jurídica, é inconcebível a desvirtuação do texto normativo, conferindo-lhe novas conceituações, a critério do julgador, que não é legislador positivo. Destaca ainda que a Constituição Federal faz referência expressa aos termos homem e mulher quando trata da sociedade conjugal. “Por evidente, duas pessoas do mesmo sexo podem constituir família, podem constituir patrimônio comum, podem reivindicar direitos sucessórios e previdenciários, enfim, podem viver em união estável. Mas não têm direito ao casamento civil, por ausência de autorização legal”, completou.

Clique aqui para ler a minuta da Resolução do CNJ.

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