Panis et circenses

Para jornais dos EUA, há razões para protestos no Brasil

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24 de junho de 2013, 10h31

Em sua edição online, o jornal The New York Times publicou uma reportagem para explicar o que está acontecendo no Brasil, com base apenas em comentários de seus leitores brasileiros e de outras nacionalidades. Um dos destaques foi a opinião de um leitor da Malásia: "O povo está aprendendo que mais circo resulta em menos pão", ele escreveu, em referência à crença dos políticos da Roma Antiga de que, para conter a insatisfação popular contra os governantes, bastava dar ao povo "pão e circo". Para esse leitor, a construção dos estádios para a Copa de 2014 significa exatamente isso: mais circo e menos pão.

Em outra reportagem, o The New York Times escreve que os manifestantes brasileiros querem mais que pão e circo. "No coração do movimento, está a rejeição da política tradicional no Brasil". Para o jornal, os manifestantes têm expressado um cinismo profundo em relação aos partidos políticos e seus líderes. E querem, entre outras coisas, que o Brasil "construa hospitais e escolas em conformidade com o padrão Fifa, em vez de estádios".

Em seu editorial Social Awakening in Brazil (O Despertar Social no Brasil), a revolta popular não é uma surpresa. Apesar de o Brasil estar, na lista do Banco Mundial, na sétima colocação entre as maiores economias do mundo, o país permanece, há anos, entre os dez piores países em disparidade de renda. Os políticos estão constantemente envolvidos em esquemas flagrantes de corrupção e de mau uso de recursos públicos.

Não surpreende que a elevação das tarifas de transporte público tenha disparado o movimento da classe média e da população menos favorecida, em um país em que o sistema de impostos regressivos (que é mais pesado para os grupos de menor renda) e que não investe na educação, mas investe pesado na construção de estádios de futebol, diz o editorial.

O jornal The Washington Post comparou, em editorial, os movimentos de protesto no Brasil aos eventos na Turquia. Apesar de os motivos serem diferentes, é possível identificar similaridades, diz o jornal. A principal delas é um descaso com parte da população. No caso do Brasil, o PT, há dez anos no poder, tem tolerado uma corrupção generalizada e está investindo bilhões em infraestrutura para a Copa do Mundo e para as Olimpíadas, quando os serviços públicos, como educação, saúde e transporte público, são altamente deficientes, afirma o jornal.

Mas há diferenças significativas. No Brasil, o governo tenta negociar com as lideranças do movimento popular. Na Turquia, o governo convocou uma reunião só para identificar as lideranças e depois mandou prendê-las. No Brasil também há esperanças de que um movimento popular desse porte irá, no fim das contas, fortalecer a democracia. Isso não é esperado para a Turquia, que adotou uma política de linha dura.

Para o jornal The Wall Street Journal, o surpreendente crescimento econômico do Brasil na última década tirou milhões da pobreza e criou uma nova classe média, a mesma que agora está encostando contra a parede políticos de todos os partidos. Os protestos em massa revelaram que o país, que se tornou o favorito da comunidade mundial de investidores, tem muito mais problemas do que se sabia. Por exemplo: enquanto o país investe pesado em dois grandes eventos mundiais, a Copa do Mundo e as Olimpíadas, não há progresso dos programas que realmente podem causar um impacto positivo na vida cotidiana da maioria da população.

O jornal USA Today diz que a maior demonstração pública na América Latina nas últimas duas décadas é uma confrontação dos gastos públicos com a Copa do Mundo com a pobreza dos serviços públicos e a alta carga tributária imposta à população, tudo embalado pela corrupção generalizada. O jornal destacou que os manifestantes criticam a Proposta de Emenda Constitucional 37, que limita o poder do Ministério Público de investigar crimes. Segundo a publicação, a mudança iria proteger políticos corruptos contra processos judiciais e condenação à prisão.

A rede Aljazeera viu semelhança entre os movimentos de protestos no Brasil e as rebeliões da "Primavera Árabe", que sacudiram toda a região. Segundo a Aljazeera, as manifestações foram organizadas por meio das redes sociais e nunca teria tomado as proporções que tomou não fosse pela nova geração de cidadãos conectados virtualmente. No Brasil, o que começou com um protesto contra um aumento de 20 centavos nas tarifas de ônibus explodiu na agitação social mais significativa nas últimas décadas, provocadas por injustiças econômicas e sociais, afirma a Aljazeera.

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