Saúde pública

Revalida não fere princípios da ordem pública

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25 de julho de 2013, 6h59

No último dia 9 de julho, o Governo Federal publicou conjunto de medidas que formalizam o Programa Mais Médicos, entre elas a possibilidade de se contratar médicos estrangeiros, flexibilizando os critérios atuais de “revalidação” do exame Revalida, que tem por objetivo padronizar o reconhecimento de diplomas médicos expedidos por universidades estrangeiras e subsidiar procedimentos das universidades públicas nacionais para essa finalidade.

Esta diretriz da administração pública trata o tema com deficiência e falta de zelo, revestindo-se de postura ilegítima quanto ao reconhecimento de diplomas médicos adquiridos no estrangeiro.

De início, insta esclarecer que a terminologia “revalidação” merece questionamento, já que à administração pública brasileira não compete revalidar ato regularmente adquirido alhures. Tal inferência se faz inapropriada. À administração pública é facultada a atribuição de efeitos a atos originalmente realizados no estrangeiro, em território nacional.

Os estados, no exercício da soberania e face ao princípio da extraterritorialidade das leis, adotam normas para regulamentar o reconhecimento de atos jurídicos realizados ou adquiridos em ordenamento jurídico estrangeiro. No Brasil, há uma reserva legal a ser observada: a vedação do reconhecimento de leis, atos, sentenças estrangeiras ou quaisquer declarações de vontade que firam a soberania nacional, a ordem pública brasileira e os bons costumes.

Sobre o tema, merece particular atenção o instituto da ordem pública. E, como este princípio de direito tem definição ampla e seu conceito varia no tempo e no espaço — pois os elementos que o compõem abarcam preceitos de ordem moral, costumeira, filosófica, econômica, social e política de uma sociedade —, faz-se substancial identificar quais tipos de normas o ofenderiam.

Neste sentido, há quem defenda que somente poderiam ser considerados ofensivos à ordem pública atos, leis, sentenças estrangeiras ou manifestações de vontade que firam preceito cogente: aquele expressamente previsto em lei e que não pode ser derrogado pela vontade das partes.

Tal reflexão se faz válida. Contudo, partilho do entendimento de que referida assertiva não poderá ser analisada de forma restritiva, pois nem toda norma de ordem pública é cogente.

O real conceito do instituto ordem pública extrapola as diretrizes estabelecidas na norma cogente , abarcando princípios outros que não se encontram expressos em lei.

E a avaliação da aptidão do profissional da saúde instituída pelo Revalida não fere os princípios que norteiam a ordem pública, ao contrário, os consagra. A administração pública aqui não está questionando o mérito do direito adquirido alhures, mas sim avaliando a aptidão, os requisitos necessários ao exercício de sua atividade em território nacional.

Esta premissa, inclusive, norteia a educação de nível superior no Brasil, que tem por escopo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento aptos para a inserção em setores profissionais da sociedade brasileira.

A política administrativa de contratar médicos que tenham adquirido sua graduação fora do território nacional sem observância de critérios técnico-jurídicos plausíveis no direito pátrio não é razoável já que poderá ferir princípios que norteiam os atos administrativos e, assim, a ordem pública vigente.

Fica aqui registrada a expectativa de que uma política de saúde pública coerente e legítima para o eficaz reconhecimento dos diplomas médicos de graduação originalmente adquiridos no estrangeiro venha substituir a proposta ora em debate.

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