Proteção cibernética

Congresso volta a discutir Marco Civil da Internet

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11 de julho de 2013, 6h29

A revelação de que o governo americano também monitora trocas de e-mails de residentes no Brasil e de empresas instaladas no país trouxe à tona, de novo, o debate sobre o Marco Civil da Internet. A notícia fez com o que o governo federal pressionasse a Câmara dos Deputados para que aprove logo o projeto, demanda antiga do PT. Em troca, a oposição cobrou do governo posicionamento e informações a respeito da segurança cibernética dos internautas do país.

Os debates estão relacionados às denúncias feitas pelo jornal britânico Guardian de que o governo dos Estados Unidos monitora trocas de e-mails e conversas telefônicas dos cidadãos americanos. A informação foi revelada pelo ex-funcionário da CIA, a Agência Nacional de Inteligência dos EUA, Edward Snowden, que hoje busca asilo internacional. 

Reportagem do jornal O Globo revelou que o governo americano também espionou internautas residentes no Brasil e empresas sediadas no país. O jornal se baseia em documentos da CIA e afirma que o monitoramento remonta às últimas décadas e não fica atrás dos acompanhamentos feitos dentro do território americano, onde 2,3 bilhões de telefonemas e mensagens foram espionadas.

O reflexo dessas revelações no Brasil se deu no Congresso. Esta semana, a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, foi à Câmara dos Deputados articular com as lideranças petistas da casa para que levem logo o Marco Civil a votação. E cobrou celeridade dos deputados. Já o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, afirmou que o projeto, que estabelece direitos e deveres aos usuários, provedores de acesso e empresas de internet no Brasil, é prioridade do governo para este ano.

O relator do projeto de Marco Civil na Câmara é o deputado Alessandro Molon (PT-RJ). Ele afirmou à ConJur que a aprovação do texto é “a resposta mais efetiva que a Câmara pode dar” à demanda por mais segurança dos internautas. “É preciso mudar a lei brasileira para que não possam usar os dados dos internautas brasileiros sem autorização”, atesta o parlamentar. Para ele, essa garantia mudaria drasticamente a postura das empresas de internet que atuam no país.

Problemas antigos
Só que essa opinião não é unânime. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), quando da vista da ministra Ideli à Casa, afirmou que não há consenso sobre os termos do projeto. Segundo disse à Agência Câmara de Notícias, as lideranças do PMDB e do PSDB não estão satisfeitas com a redação atual do Marco Civil, e isso trava a ida do texto para votação. “Não é só levar a matéria à pauta: é ir à pauta e ser aprovada", declarou.

O deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB-SP), da Comissão de Ciência, Tecnologia e Informação, explicou que “os problemas de agora são os problemas de sempre”. Enumera duas questões: a da guarda, por provedores, das informações digitais dos internautas, os chamados logs de acesso, e a forma com que os provedores distribuem a velocidade de acesso às informações na web, ou a neutralidade da rede.

Azeredo está envolvido na discussão há alguns anos. Quando era senador, entre 2007 e 2011, elaborou o Projeto de Lei 84, que propõe alterar o Código Penal para tipificar crimes cibernéticos. O projeto, que ficou conhecido como Lei Azeredo, foi duramente criticado e levou o apelido de AI-5 Digital. Os opositores afirmavam que o texto criminalizava atividades inerentes ao convívio digital, como a troca de arquivos entre internautas e o download de músicas.

Fonte também envolvida no debate e ligada ao governo disse à reportagem da ConJur, sob a condição de não ser identificada, que parlamentares ligados ao PSDB e ao PMDB têm travado a discussão deliberadamente. Segundo ela, as empresas de telecomunicações não querem a aprovação do Marco Civil porque suas receitas serão diretamente afetadas. “As companhias não querem ser impedidas de guardar as informações dos usuários para ganhar dinheiro em cima”, disse.

Ela afirma que a discussão é antiga e não sai do lugar, sempre pelos mesmos motivos. Mas não concorda com a atitude do governo. “O absurdo é a Ideli vir agora nos cobrar pressa depois de o governo ter ficado três anos para apresentar o projeto de Marco Civil ao Congresso”, critica. O Marco Civil da Internet foi ideia do governo federal, que sempre tratou o texto como alternativa à Lei Azeredo, e, entre colocar o texto para consulta pública e elaborar o anteprojeto a ser enviado ao Legislativo, demorou três anos.

Espionagem internacional
Nesta quarta-feira (10/7), o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, foi ao Congresso a pedido de deputados e senadores para se explicar. Participou de sessão conjunta das comissões de Relações Exteriores do Senado e da Câmara, e disse que o Brasil levará o caso à Organização das Nações Unidas.

Patriota informou que vai criar uma comissão técnica para apurar os principais temas que precisam ser esclarecidos pelos Estados Unidos. O primeiro passo, contou, será chamar o embaixador dos EUA no Brasil, Thomas Shannon, ao Itamaraty.

Mas, para a oposição, o que ficou claro da visita de Patriota ao Congresso foi que “até pouco tempo atrás o governo nem sabia o que era defesa cibernética”, disse Azeredo. “Há atraso e até certa omissão. Temos de ter participação mais ativa nos foros internacionais”, afirmou o deputado.

O ministro da Defesa, Celso Amorim, que também foi ao Congresso nesta quarta, reconheceu a falta de proteção do Brasil, mas declarou que nenhum país tem condições de criar um “escudo total” em torno de suas informações. Segundo informações do jornal Folha de S.Paulo, Amorim disse que “as vulnerabilidades existem e são muitas”. Para ele, a única solução para o país se proteger é que use equipamentos completamente fabricados no Brasil. Isso porque o monitoramento americano das comunicações brasileiras se deu com a cooperação de empresas americanas que atuam no Brasil, como o Google. 

Em nota, a Presidência da República informou que criou um Grupo Técnico Interministerial com as pastas da Justiça, Defesa, Comunicações, Ciência e Tecnologia, Gabinete de Segurança Institucional e Assessoria Especial da Presidência da República para apurar o caso. Também avisou que “o governo brasileiro não autorizou nem tinha conhecimento das atividades denunciadas. A eventual participação de pessoa, instituição ou empresa do país nestas atividades é inconstitucional, ilegal e sujeita às penas da lei”. A Polícia Federal e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) abriram inquéritos para apurar as denúncias.

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