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Criação de novas Câmaras no Rio atesta prática antiga

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1 de janeiro de 2013, 14h38

O Pleno do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, reunido em sessão no dia 10 de dezembro de 2012, decidiu pelo encaminhamento de Projeto de Lei à Assembleia Legislativa, propondo a criação de mais sete Câmaras Cíveis, sendo cinco com competência exclusiva para o julgamento de recursos de ações de consumo. A proposta foi aprovada sem unanimidade, embora com expressiva votação dos presentes.

Após meses de discussão que envolveu desembargadores cíveis e criminais (com acusações mútuas de injustiça na divisão do volume de trabalho e com as regalias usufruídas por cada grupo), a proposta inicial de redistribuição dos feitos cíveis para os desembargadores criminais, por período de tempo razoável, até que se alcançasse uma justa equalização, foi praticamente arquivada. Em seu lugar, foi apresentado o projeto de criação das novas Câmaras.

O que se pode concluir de todo o episódio é a permanência da antiga prática de se criar novas-velhas estruturas para consertar o que não vem funcionando a contento. Ao invés de se enfrentar o problema central da má-gestão dos recursos disponíveis (e que são imensos, tanto em estrutura quanto em pessoal), optou-se pela solução mais fácil: criam-se novas estruturas, novos cargos, aumentando a máquina estatal.

A proposta tem assento na transformação dos desembargadores itinerantes (35, no total, que, até alcançarem assento em umas das Câmaras existentes, são designados para atuarem nas ausências dos demais) em desembargadores efetivos nas novas Câmaras.

Em princípio, não haveria aumento de despesas. Uma análise mais aprofundada do projeto, no entanto, indica no sentido contrário, tal qual acontece com as novas-velhas estruturas que a política brasileira insiste em apontar como solução de velhos problemas: CIEPs, UPPs, UPAs, Clínicas Populares, Juizados Especiais, Delegacias Especializadas, etc. etc.

As novas-velhas estruturas passam a funcionar ao lado das velhas e, em pouco tempo, também deixam de apresentar desempenho minimamente razoável, servindo apenas para aumentar os custos permanentes de manutenção do Estado-Paquiderme Brasileiro, custeado por toda a sociedade carente de serviços de qualidade.

Além disso, os cargos de diretor de secretária e outros mais deverão ser criados, para fazer jus à administração das novas-velhas Câmaras, além de, em pouco tempo, novos desembargadores itinerantes.

A solução simplista de apenas aumentar o número de juízes a cada aumento da demanda, é prática que vem sendo seguida, sem solução de continuidade, por diversas administrações.

No caso da proposta aprovada, a ideia de “desafogar” os desembargadores cíveis do grande volume de trabalho, em pouco tempo estará superada, pois as novas-velhas Câmaras estarão sobrecarregadas de recursos exclusivamente consumeristas e as velhas Câmaras estarão recebendo todos os demais recursos, como antigamente.

Além da consequência funesta para a qualidade intelectual do trabalho, concentrando em poucas Câmaras Cíveis o maior volume de demandas hoje existente —justamente a defesa do consumidor— corre-se o sério risco de se nivelar tais ações “por baixo”, passando a considerá-las fruto da “indústria do dano moral” e, em consequência, reduzindo ou não reconhecendo a ocorrências de sérias violações aos consumidores.

Não se advoga o engessamento das estruturas administrativas jurisdicionais em um ambiente de crescente demanda social. O que se deve perseguir, como em todo o mundo, é a otimização da gestão dos recursos públicos, fazendo com que as unidades administrativas se organizem de modo a prestarem o melhor serviço público que a sociedade tem o direito de exigir dos órgãos estatais. No caso da Justiça, por ser o Poder com a exclusiva incumbência de prestar jurisdição (o poder-dever de resolver o conflito de interesses), a gestão pública apresenta caráter ético insuperável, pois, detendo o Poder Jurisdicional, indelegável constitucionalmente a qualquer outro, a utilização dos recursos para o seu melhor desempenho devem ser sopesadas socialmente em seus resultados, sob pena de perda de sua própria legitimidade.

Soluções outras existem para resolver o problema da maior demanda cível em relação à demanda criminal. A mais simples é a transformação dos cargos já existentes de desembargador criminal, na medida em que o seu ocupante se aposente, em desembargador cível, agregando-o, temporariamente, a uma das Câmaras Cíveis também já existentes, até que se alcance o número mínimo (3) para se transformar uma Câmara Criminal em Cível.

Tal medida, além de respeitar o direito de especialização do magistrado (cível ou criminal), preserva sua vocação até que se ultime sua aposentadoria. A repercussão na distribuição dos recursos criminais para os desembargadores remanescentes, considerando o tempo que demandará tal transformação (mais de 2 anos), será absorvida naturalmente e sem qualquer estresse de trabalho pelos demais. Além disso, toda a estrutura original das Câmaras Criminais permanece intocável, até que se ultime a criação, por transformação, em Câmara Cível.

Nessa proposta, não ocorre qualquer aumento de despesa, porquanto tudo se dará de maneira a aproveitar as estruturas já existentes. E, principalmente, sem ferir suscetibilidades, preservando a harmonia que deve reinar entre os integrantes de um mesmo tribunal, porquanto o trabalho intelectual desenvolvido por cada magistrado é tão valioso para a sociedade, seja na esfera cível, seja no âmbito criminal, sem qualquer desvalia para este ou aquele juiz.

O que deve nortear a atuação do agente público —e os Magistrados o são— é a melhor forma de usar os recursos públicos que lhe são destinados pela sociedade, retribuindo em atuação jurisdicional de qualidade, visando a pacificação social.

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