Representação da indignação

Uso de palavras fortes não prova parcialidade do juiz

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28 de dezembro de 2013, 10h18

O uso de palavras fortes durante a sentença condenatória, por si só, não é suficiente para caracterizar a parcialidade do juízo durante a análise do caso e a consequente suspeição do julgador. Com base neste entendimento, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça rejeitou a alegação de dois réus detidos durante as operações roupa suja e vampiro, promovidas pela Polícia Federal contra grupos que fraudavam licitações. Os ministros conheceram parcialmente dos recursos movidos por Vittorio Tedeschi e Altineu Pires Coutinho, e deram parcial provimento aos pedidos.

Relator do caso, o desembargador convocado Campos Marques informou que o magistrado responsável pela sentença em que Vittorio Tedeschi foi condenado utilizou os termos "bandido travestido de empresário” e "delinquente de colarinho branco”. No entanto, de acordo com ele, as afirmações representam apenas a expressão da indignação, provavelmente com os frequentes casos de crimes contra os cofres públicos, sem que isso implique em parcialidade. Os excessos foram percebidos pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que censurou “alguns termos utilizados, mas não viu, como, de fato, não há, a configuração da hipótese legal apontada no apelo nobre”, afirmou o relator.

O Recurso Especial pedia o alargamento do artigo 254, inciso I, do Código de Processo Penal, para que fosse declarada a suspeição do juiz de primeira instância, mas o relator rejeitou o pedido, citando a jurisprudência do STJ e do Supremo Tribunal Federal. Como disse Campos Marques, os dois tribunais já definiram que as causas de suspeição e impedimento de magistrados “estão dispostas taxativamente no Código de Processo Penal, não comportando interpretação ampliativa”.

O desembargador convocado também rejeitou a alegação de que o desmembramento do processo contra os 28 réus ocorreu sem motivo que o autorizasse, causando prejuízo à defesa. Segundo ele, o artigo 80 do CPP permite que o juiz desmembre o caso quando existir excessivo número de acusados, para não prolongar a prisão preventiva ou a seu critério, sendo que neste caso o número de denunciados justifica o desmembramento. Campos Marques não conheceu do REsp em relação à argumentação de que o juiz de primeira instância rejeitou pedido “de diligências objetivando a efetivação de perícias, que comprovariam o prejuízo causado aos cofres públicos e o valor do alegado superfaturamento”. De acordo com seu voto, o recurso não atacou todos os fundamentos da decisão anterior, como previsto na Súmula 283 do STF.

A alegação de falta de fundamentação da sentença, feita por Altineu Pires Coutinho, foi rejeitada sob a alegação do relator de que o juiz de primeira instância respondeu a todas as questões relevantes em sua peça, indicando os motivos de fato e de direito que justificaram sua decisão. Também não foi conhecido o recurso referente à condenação dobrada, com o desembargador apontando que os crimes previstos nos artigos 90 e 96, I, da Lei 8.666/93 — fraudar licitações mediante ajuste ou combinação e elevar arbitrariamente os preços para fraudar licitações — são distintos, sem que um absorva o outro.

O voto de Campos Marques rejeitou a alegação de irregularidade nas escutas telefônicas, mas conheceu a parte referente ao cálculo da pena. Ele alterou as penas dos réus pelos crimes de fraude de licitações mediante ajuste ou combinação e elevação arbitrária de preços, mantendo as punições por formação de quadrilha e corrupção ativa qualificada. No total, a pena de Tedeschi foi reduzida de 19 anos e um mês de privação de liberdade — nove anos e cinco meses de detenção e nove anos e oito meses de reclusão — para 14 anos, cinco meses e 15 dias de privação de liberdade — sete anos, três meses e 15 dias de detenção e sete anos e dois meses de reclusão.

Já a pena de Pires Coutinho teve a pena reduzida de 13 anos de privação de liberdade —quatro anos e oito meses de detenção e oito anos e quatro meses de reclusão — para dez anos e oito meses de privação de liberdade — três anos e seis meses de detenção e sete anos e dois meses de reclusão. Ficou vencida a ministra Laurita Vaz, que votou por uma pena de 15 anos e oito meses para Tedeschi, acompanhando o relator nos demais pontos.

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