Segurança e celeridade

Marco Aurélio quer composição permanente no TSE

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25 de dezembro de 2013, 12h37

Vice-decano do Supremo Tribunal Federal e presidente pela terceira vez do Tribunal Superior Eleitoral, o ministro Marco Aurélio defende alterações na composição da corte eleitoral. Para dar mais celeridade e segurança nos julgamentos, o ministro defende uma composição permanente.

Ele lembra que o sistema atual sobrecarrega os juízes na véspera das eleições. "Não se justifica ficarmos servindo a dois tribunais simultaneamente e atuando no TSE depois do expediente normal", disse em entrevista à Revista IstoÉ.

Carlos Humberto/SCO/STF
Ministro Marco Aurélio [Carlos Humberto/SCO/STF]

Apesar de ter assumido recentemente a presidência do TSE, o ministro não conduzirá as eleições 2014, pois seu mandato de ministro eleitoral termina no dia 5 de maio. Apesar disso, o ministro está preocupado com a composição do TSE durante as eleições em 2014, mas garante que deixará tudo pronto para o ministro Dias Toffoli, próximo presidente.

"A concepção dos ministros que formarão o tribunal no ano que vem durante as eleições, é de que o tribunal deve atuar o mínimo possível. Isso pode levar à prevalência do mais forte ou daquele que utilize meios que não são legais para chegar ao cargo, em detrimento de quem observa o figurino legal".

Leia a entrevista concedida à Revista IstoÉ:

É a terceira vez que o senhor assume o comando do TSE. A primeira vez foi em 1996 e depois em 2006. O que mudou nesses últimos anos?
O aperfeiçoamento do sistema é inquestionável. O uso da urna eletrônica foi um grande avanço e tem evitado as dúvidas e impugnações. Ainda há um ranço sobre a segurança da urna, mas a máquina é algo objetivo e ficou claro que é a melhor opção. O tribunal mudou muito porque há mandatos. Penso que já está na hora de haver um corpo permanente de integrantes. Não se justifica ficarmos servindo a dois tribunais simultaneamente e atuando no TSE depois do expediente normal.

O senhor vai tentar implementar essa mudança?
Isso teria de ser emenda constitucional, precisa passar pelo Congresso. Mas vou insistir que já passou da hora de valorizar e criar uma estrutura permanente e fixa para a Justiça Eleitoral.

Qual seria o efeito disso?
A celeridade no julgamento dos casos e a segurança sobre a composição da corte. A dedicação exclusiva dos juízes daria outro tom e outro ritmo ao tribunal. Não estaríamos servindo em outros locais, não seria aplicada uma sobrecarga aos juízes. Durante os três meses que antecedem as eleições, as sessões entram na madrugada e ficamos na angústia de conciliar celeridade e conteúdo nos julgamentos. Essa pressão ocorre principalmente na Justiça Eleitoral, onde a passagem do tempo é fundamental, porque o mandato vai se esvaindo e quem teria o direito ao cargo fica aguardando por anos o fim do processo.

Há governadores prestes a deixar os cargos e com processos ainda pendentes no TSE. Pelo menos 11 ganharam mais tempo com o entendimento recente de que recursos contra a expedição de mandatos devem ser julgados pela Justiça dos estados. Eles vão terminar os mandatos sem julgamentos?
Teremos pouco tempo. A corte entra em recesso e ficarei na presidência até maio. Essa falta de julgamento das ações envolvendo políticos alimenta um sentimento que é péssimo: o sentimento da impunidade.

Qual é a sua expectativa em relação à atuação do TSE nas eleições de 2014?
Sinceramente, preocupa-me o período posterior a maio de 2014 no TSE. Teremos o tribunal com uma formação majoritária de juízes que sustentam a ideia de que o ideal é o mínimo de atuação judicial. Isso é péssimo. Quando você não censura judicialmente uma conduta, você termina estimulando práticas ilegais.

Isso quer dizer que os ministros que atuarão durante a campanha podem permitir que o TSE atue mais como expectador da eleição?
Até certo ponto, sim. A concepção dos ministros que formarão o tribunal no ano que vem, durante as eleições, é de que o tribunal deve atuar o mínimo possível. Isso pode levar à prevalência do mais forte ou daquele que utilize meios que não são legais para chegar ao cargo, em detrimento de quem observa o figurino legal. Não se dá um bom exemplo com essa postura passiva. E me preocupo com a formação que o TSE terá.

O senhor deixa a presidência porque completa quatro anos seguidos na corte. Se continuasse, conduziria o pleito de forma ativa quanto às punições?
Não defendo o justiçamento ou a punição a ferro e fogo. Defendo a prevalência da norma, a observância das leis. As leis são feitas para serem cumpridas e os políticos precisam entender isso e saber que há um tribunal disposto a punir quem não observá-las.

Trocar um presidente às vésperas da eleição não causa insegurança?
Acho que sim. Saio porque completo quatro anos de mandato, apesar de ainda ter dois anos como presidente. Não há disposição apontando que, em ano eleitoral, o presidente em exercício deve continuar e presidir as eleições. Depois que eu deixar a presidência, pretendo propor que o tribunal observe a continuidade do mandato quando se tratar de ano eleitoral. Não fiz isso porque não vou agir em causa própria para garantir minha própria permanência. Mas, no futuro, acho que isso deve mudar. Deixarei as eleições preparadas e Dias Toffoli vai comandar o pleito.

Muito se especula sobre as tendências de ministros favorecerem a esse ou aquele partido, levando em conta as afinidades e a atuação pregressa na carreira. O senhor acha que a composição da corte pode beneficiar partidos como o PT em detrimento do PSDB ou PSB?
Quando o presidente Lula nomeou os primeiros três integrantes do Supremo, disseram que a corte seria aparelhada por ele. Busquei esclarecer que não se agradece indicação com a toga. Não se pode fazer isso. Julgar é uma missão sublime e a gente precisa julgar de acordo com a consciência. Acho que todos sabem que não se pode tentar agradar a quem quer que seja. Como procedo dessa forma, imagino que os colegas adotem idêntica postura.

Há com que se preocupar em relação ao partidarismo de alguns ministros dentro do TSE?
De início, acho que não. Errar é humano e não temos semi-deuses. Imaginamos que todos atuem percebendo a importância dessa atuação para dias melhores no Brasil.

Há uma discussão cada vez mais recorrente sobre as falhas no modelo de indicação de ministros. Especialmente pelo jogo político e pelo lobby que se trava nos bastidores para conseguir uma indicação. O que o senhor pensa sobre esse processo?
Nosso modelo foi decidido à imagem da corte americana. A pergunta que se deve fazer é: por que lá o sistema funciona e no Brasil se aponta que não funciona? Alguma coisa está errada. Precisamos que o presidente da República realmente escolha os melhores. Acho que o ideal é afastar desse sistema as mazelas. Não sei o que aconteceria se a escolha dependesse dos políticos ou apenas das listas de entidades.

O senhor é um defensor da judicialização da política?
Não sou um legalista extremado. Ao contrário. Percebendo que as leis são feitas para os homens, eu humanizo a norma. Não vivemos na Suécia, não vivemos na Suíça. Penso que, se não houver uma atuação rígida, principalmente no campo eleitoral, onde as paixões são exacerbadas, valerá a lei do mais esperto. Os políticos precisam se lembrar, durante a campanha, que importa muito não apenas chegar ao cargo, mas nessa caminhada observar as leis. Se o Congresso não faz o seu trabalho, o Judiciário pode fazer.

O Congresso aprovou uma minirreforma eleitoral que beneficia os próprios políticos, reduzindo, por exemplo, os custos de campanha e relaxando as proibições sobre a atuação de cabos eleitorais. Eles insistem que deve valer em 2014.
Não vale. Essa minirreforma é um filme que todos já vimos. A lei que, de alguma forma, altere o processo eleitoral entra em vigor no mesmo ano, mas não se aplica na eleição seguinte. Isso é uma questão de coerência; a sociedade não pode viver aos solavancos.

O Supremo caminha para decidir sobre o financiamento de campanhas. O senhor acha que é importante avançar nessa esfera?
Ainda não votei sobre a matéria no plenário do STF, mas sou a favor do financiamento público, com regras rígidas quanto à participação do setor privado. Entendo que não há nesse campo nenhum altruísmo. Não há concepções ideológicas nem das pessoas nem de empresas em relação a partidos, se é que no Brasil há alguma diferença entre os partidos.

Não há?
Acho que, no passado, até chegamos a acreditar que existisse pelo menos um diferente. Mas esse partido (o PT), ao assumir o poder, se mostrou igual aos demais. O que acho é que as doações de empresas saem muito caro para a sociedade. A pessoa jurídica abre o leque de financiamentos para depois cobrar do eleito seus interesses.

Aprovar o financiamento público não pode criar um sistema eleitoral paralelo e clandestino?
Não dá para pensar assim. Caixa dois já é crime e cabe à Justiça Eleitoral atuar para coibi-lo. Problema é se a Justiça for flexível com a corrupção e os tribunais não forem ativos na sua atuação. Isso vai estimular as praticas à margem da legislação. Essa celeuma no futebol, que salvou o Fluminense na esfera judicial, tem um simbolismo importante que pode servir para a política.

O que exatamente ficou demonstrado?
Provou que as regras são para serem cumpridas e quem não cumpri-las vai ser punido. É preciso impor punições para desvios de conduta. No meu discurso de posse no TSE, eu disse que a democracia não admite o minimalismo judicial. Quis falar isso para registrar nos anais do TSE que me preocupo com a postura do tribunal no próximo ano. Temo que a corte peque por omissão nos casos referentes à eleição de outubro.

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