Contra a pirataria

Súmula 502 do STJ nasce com prazo de validade por vencer

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21 de dezembro de 2013, 6h51

Avizinhando-se a Copa do Mundo de 2014, muito se tem discutido sobre a real possibilidade de ocorrer equívocos judiciais nos julgamentos preconizados pelas disposições penais temporárias contidas na Lei nº. 12663/2012 (Lei Geral da Copa).

A norma diz respeito, ao que interessa, a condutas que passaram a ser tipificadas como crime, todas, absolutamente todas, relacionadas à proteção de direitos autorais e com prazo de validade em 31 de dezembro de 2014.

Muitos juristas têm alertado, com base nas experiências ocorridas em outros mundiais, quanto à real possibilidade de termos viabilizado o funcionamento de Tribunais de Exceção nas capitais sedes dos jogos.

Recentemente, em relação à proteção ao direito autoral, o Superior Tribunal de Justiça, editou a Súmula nº 502, cujo enunciado dispõe que “Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no art. 184, § 2º, do CP, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas”.

Há vício de inconstitucionalidade grave na edição da Súmula.

Indubitavelmente se verifica que o STJ realizou típica ação de legislador, ou melhor usurpou a competência do poder Legislativo, pois constatou a existência de fato social relevante, exerceu sobre ele um juízo de valor e, posteriormente, editou uma “norma jurídica”. E este, a nosso viso, tenha sido o equívoco do tribunal.

Conquanto o jus puniendi seja um monopólio estatal, não se concebe que o poder Judiciário brasileiro dê interpretação de fatos sociais de acordo com modelos de países de primeiro mundo, ou no melhor estilo “padrão FIFA”, ou, ainda, sob pressão direta de diplomas normativos que Marcelo Neves denomina de “legislação-álibi” ao citar Kindermann[1].

Ora, embora reprovável sob o ponto de vista moral, a compra e venda de mídia é fato socialmente aceitável e, portanto, alcançado pelo principio da adequação social como bem concebido por Hanz Wezel, impondo-se a exclusão da culpabilidade do acusado.

É notório que durante muito tempo a Administração Pública tem incentivado a construção de shoppings populares. Nestes empreendimentos, como fator de inclusão social, são permitidos que lojistas comercializem CD’s e DVD’s gravados. A Feira de Importados de Brasília é um exemplo destes centros tolerados e que se localiza a poucos quilômetros do centro do poder.

A história jurídica recente de nosso país tem apresentado experiências que indicam que a criminalização está sempre voltada às classes mais baixas, especialmente aquelas atendidas pelas Defensorias Públicas.

Não por acaso, o contingente de defesas penais que versam sobre a pirataria de CD’s e DVD’s tem crescido acentuadamente nos últimos meses, coincidindo, portanto, com os anseios de proteção do direito autoral tão sobejamente exigidos pela poderosa entidade esportiva.

Diferentemente de outros enunciados, porém, a edição da Súmula 502 parece já ter nascida com prazo de validade por vencer. É que, a despeito da aplicação (ou não) do princípio da adequação social, que tem vida tão rara e passageira no meio jurídico brasileiro, a existência de mídia em CD e DVD já pertence ao passado de muitos países desenvolvidos.

Somente neste ponto o enunciado se afasta do padrão FIFA.


[1] NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Acadêmica, 1994. P. 37.

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