Agência em falta

"A Susep está limitando o negócio de seguros no Brasil"

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15 de dezembro de 2013, 8h55

Spacca
Sérgio Barroso de Mello [Spacca]

Há três décadas na área de seguros, o advogado Sérgio Barroso de Mello está receoso com os rumos do mercado de seguros no Brasil. Em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico ele critica os rumos da Superintendência Nacional de Seguros Privados e afirma que ela está fechando um mercado que é crescente.

O advogado divide o tempo entre seu escritório, Pellon & Associados Advocacia, e a presidência do Comitê Ibero-Latino Americano da Associação Internacional de Direitos de Seguros (Cila/Aida), entidade que reúne esforços em defesa do estudo e a divulgação do direito de seguros e de suas matérias afins.

Em junho, Mello esteve à frente do Congresso do Cila/Aida. De lá trouxe novidades como a criação do tribunal arbitral para países latinos, batizado de Arias Latam (Tribunal Arbitral da Aida na América Latina). O tribunal está localizado na Universidade Católica do Chile, em Santiago. “Por estar em uma faculdade tem custos menores e está em um ambiente onde o Direito é o Direito Romano, como o nosso, o Direito positivo que privilegia a lei, as normas, e muito menos a jurisprudência”, explica Mello.

Formado em 1988 pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Mello possui vasta experiência na área de seguros do Brasil e do Exterior. Além da experiência profissional, Mello conta também com especializações na área como o doutorado em Contrato de Seguro e Resseguro pela Universidade de Santiago de Compostela, Espanha.

Além do escritório e da presidência do Cila/Aida, Sérgio Melloatua como árbitro do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem. Também é professor de Direito e Previdência Complementar Privada do MBA em Previdência Complementar da UFRJ, da Cadeira Direito de Seguros e Resseguros MBAs da Universidade Cândido Mendes, da Fundação Nacional Escola de Seguros (Funenseg), da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da Pontifícia Universidade Católica de Belo Horizonte (PUC Minas).

Leia a entrevista:

ConJur — Quais são os principais problemas do seguro hoje em dia?
Sérgio Barroso de Mello — No seguro em si, nós temos um problema hoje que é o nosso órgão regulador. Nele há dois problemas. O primeiro é que a Susep, a  Superintendência Nacional de Seguros Privados não é uma agência, e sim uma superintendência. Com isso não possui mandato e a cada um ano e meio ou dois anos troca o superintendente e muda a filosofia. Isso é muito ruim porque você perde o norte.

ConJur — E qual seria o outro problema?
Sérgio Barroso de Mello — A falta de profissionais que conhecem seguro com profundidade. Ao longo do tempo a Susep perdeu gente que tinha a memória do seguro, que se aposentou, e não absorveu profissionais com capacidade. Nos concursos são contratados basicamente atuários recém-formados, que nunca trabalharam em uma rotina de seguro, de resseguro ou mesmo junto a um corretor. Além disso falta treinamento. O investimento em treinamento é muito baixo. Com isso, nos últimos dois ou três anos começaram a estabelecer normas que criam padrões. Quando você cria padrão é fácil regular. Você tem uma receita, tudo que está fora dela é penalidade, multa.

ConJur — Quais as conseqüências dessa prática?
Sérgio Barroso de Mello — O mercado de seguro nacional e internacional é muito criativo e faz negócios de risco. A essência do segurador é a criatividade. Se você limita a sua criatividade, você limita o negócio de seguros. Quando esse órgão regulador cria padrões ele começa a impedir o mercado de produtos específicos para cada necessidade. A gente tem isso historicamente, a gente chama de seguros taylor made, feito especificamente para cada tipo de risco. A partir de agora a Susep começou a expedir várias circulares criando padrões. Isso é muito ruim porque ela proíbe uma série de práticas que são absolutamente salutares e a Susep não entendeu isso. O que acaba prejudicando os clientes.

ConJur — O senhor fala a partir de agora. Agora quando?
Sérgio Barroso de Mello — A Susep editou algumas normas pequenas em 2010 e 2011, mas a grande norma que mais assusta foi a Circular 437 de 2012. Ela trata dos seguros de responsabilidade civil, que entrou em vigor em junho. Era para ter entrado em vigor em dezembro do ano passado, mas a Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg) e nós da Associação Internacional de Direito de Seguros (Aida) conseguimos a prorrogação por seis meses após apontarmos em um relatório uma série de circunstâncias ruins da circular. Existem alguns seguros de RC, de grandes segurados, que eram para ser renovados e que não estão podendo ser renovados devido a essa circular. Esses segurados estão tendo que comprar uma apólice com muito menos cobertura do que antes.

ConJur — Menos cobertura?
Sérgio Barroso de Mello — Os grandes prejudicados são os segurados. Porque  não só no que diz respeito à RC, mas também quanto às outras modalidades que a Susep está padronizando, a Susep está impedindo essa criatividade para você dar certas coberturas.

ConJur — Pode dar um exemplo?
Sérgio Barroso de Mello — No seguro de RC, especialmente o D&O [sigla em inglês para Directors and Officers Liability Insurance] — que o executivo faz para cobrir uma responsabilidade dele, uma penalidade qualquer que ele venha receber por algum erro que cometeu — a Susep não deixa você cobrir mais multa. E isso não tem justificativa. A multa é da essência do seguro de RC. Isso está causando no Brasil uma crise de produtos específicos de seguro. O país vai perder prêmio de seguro, prêmio de resseguro, pois muitos segurados, multinacionais especialmente, vão contratar nas suas chamadas apólices guarda-chuva.

ConJur — Como funciona isso?
Sérgio Barroso de Mello — As grandes multinacionais têm o que eles chamam de programa mundial, que nada mais é do que uma grande apólice contratada na matriz. Você pega uma Volkswagen, por exemplo, está na Alemanha e ela contrata uma apólice gigantesca para o mundo inteiro. Só que ela estabelece uma franquia. Por exemplo, uma franquia de R$ 50 milhões para o Brasil, abaixo disso eles não cobrem. Então a Volkswagen vem aqui e contrata uma apólice de R$ 50 milhões. Isso já é feito há muito tempo e a tendência é que se amplie.

ConJur — E como que a Volkswagen daqui será indenizada?
Sérgio Barroso de Mello — É muito fácil. Acontece o sinistro e eles enviam técnicos, os reguladores e isso não passa pela Susep. Os advogados estrangeiros virão para acompanhar e vão entregar os relatórios para um segurador de fora. Para enviar o dinheiro eles fazem um aumento de capital social e pronto. O dinheiro entra aqui no Brasil como alteração societária. Essa é apenas uma das formas. Tem outras. Isso acontece muito, só que ninguém vê.

ConJur — Essa é a ponta de uma crise no mercado?
Sérgio Barroso de Mello — Exato.

ConJur — E só acabará com o fim da Susep?
Sérgio Barroso de Mello — Então, quando você me pergunta qual é o maior problema hoje no mercado, é a intervenção. Tem outra circular, a 458, que estabelece a proibição para contratação do que a gente chama de planos singulares. Essa proibição de você fazer os seguros específicos ou singulares é a morte do nosso mercado. Essa circular cria padrões: se você não fizer um seguro igual àquele que a Susep estabeleceu, com aquelas condições básicas, você não pode fazer outro. Como não poderemos mais cobrir, o cliente vai procurar seguradoras de fora. Essas circulares citadas são os dois maiores exemplos nefastos de perda de receita e de morte de uma boa parcela do nosso mercado de seguros. Todos vamos perder lamentavelmente.

ConJur — Essa criação de padrões é uma tendência da Susep ao longo dos anos ou é pontual da atual gestão?
Sérgio Barroso de Mello — A gente está vivendo o ápice de várias medidas equivocadas tomadas ao longo dos últimos 15 ou 20 anos, especialmente pela falta de gente capacitada, de treinamento, de uma norma mais perene transformando a superintendência em um órgão de regulação, propriamente dito, como uma espécie de agência, que pudesse ter mandatos bem definidos. Então, essas mazelas todas prejudicaram um setor que é pujante.

ConJur — Como você iniciou na área de seguros?
Sérgio Barroso de Mello — Estou no mercado há quase 30 anos. Comecei muito novo, logo no primeiro ano de faculdade comecei a estagiar em uma companhia de seguro onde eu fique 12 anos. Chamava-se Companhia Internacional de Seguros. Quando comecei lá pertencia à família Rocha Miranda. Depois o Naji Nahas comprou e, em março de 91, ela foi liquidada. Nessa época montei o escritório com o meu sócio, o Luís Felipe Pellon. No início éramos nós dois, um office boy e uma secretária. Hoje nós somos 480 pessoas, 160 advogados.

ConJur — Como o escritório cresceu tanto?
Sérgio Barroso de Mello — Quando comecei, o mercado de seguros era 0,7% do PIB, hoje é mais de 5% do PIB. Não teve ano que o mercado de seguro não crescesse menos de 10%. Agora essas restrições regulatórias são um tiro no pé. Isso vai prejudicar fortemente os prêmios de seguro e resseguro, cuja indústria hoje é muito forte e muito importante. Gera empregos, gera impostos. Vamos pegar só o exemplo do resseguro. Quando o mercado se abriu há cinco anos, o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) faturava de prêmio de resseguro de R$ 2,7 bilhões. Hoje, com cinco anos de mercado aberto, temos R$ 7 bilhões, entre seguradores locais, admitidos e eventuais.

ConJur — E não é um aumento de sinistro, é um aumento de cobertura.
Sérgio Barroso de Mello — Exatamente. É um aumento de produtos. A gente começou a ter uma serie de produtos — que chamamos de produtos de coberturas — que começou a ser oferecida ao mercado que não tinha antes. O D&O é outro exemplo. Quando o mercado de resseguros abriu todos os resseguradores trouxeram os seus produtos de D&O para o Brasil e começaram a vender. Com a concorrência, estima-se que os prêmios de D&O estão 40% abaixo do que deveria estar, o que é bom para o segurado. O recall é outro problema sério do mercado de seguros.

ConJur — Temos visto muito recall ultimamente. Por quê?
Sérgio Barroso de Mello — Você não tem um produto no Brasil de recall. Você tem os seguros de responsabilidade civil que garantem uma parte de recall. O que nós conseguimos vender é uma cobertura chamada recall. A Susep nessa circular ela fechou ainda mais essa cobertura. Na Europa, que é sempre uma referência, você tem os produtos de responsabilidade civil e de recall específicos. Você chega a ter apólices com 20 ou 30 laudas, muito bem definidas, com várias coberturas, para as diferentes situações: momento de recolhimento do produto, momento de reconstituição e o da reparação do dano. No Brasil, com esse fechamento pela circular 437, com padrões que diminuem a cobertura, os clientes vão procurar as seguradoras estrangeiras.

ConJur — Isso em um momento em que temos muitos casos de recall no Brasil.
Sérgio Barroso de Mello — Exato. No momento que aumenta a demanda por recall a Susep, que é o órgão regulador que deveria dar condições para todo mundo vender recall, diz: “Não. Não quero que você venda recall. Se vender, vende só com essa ou aquela cobertura.” Os clientes vão buscar esse mercado lá fora. Há uma demanda, o mercado precisa e a Susep não deixa o mercado oferecer.

ConJur — Qual a conseqüência disso no mercado?
Sérgio Barroso de Mello — Isso vai ocasionar uma crise, perda de receita, essa pujança toda de empregos, de geração de impostos. A arrecadação do governo cresceu junto com esse faturamento do mercado, que hoje é de R$ 7 bilhões. Também tem a geração de empregos. Antigamente você só tinha 600 empregados no IRB. Hoje, estima-se que você tem mais de 10 mil pessoas trabalhando diretamente com o resseguro. Então, um país tem que ter modelos que possam produzir um desenvolvimento adequado ao mercado. O que a gente vê no nosso mercado é a superintendência em uma visão contrária, na contramão de toda atividade econômica.

ConJur — Isso está relacionado com a política do governo federal?
Sérgio Barroso de Mello — Acredito que não está diretamente relacionada a política do governo. Hoje quem está no comando não está ligado ao PT propriamente dito, o que é perverso também. Quando você pega um órgão absolutamente técnico e coloca representantes da classe política e não da categoria, você pode criar o que está acontecendo, que é falta de compromisso com o negócio. Falta compromisso com a perenidade das regras que seriam suficientes para a gente ter um crescimento com consistência. O que eles estão fazendo é criar regras para fechar esse crescimento, em beneficio, infelizmente, dos países concorrentes.

ConJur — Existe um seguro para agente público no Brasil?
Sérgio Barroso de Mello — É o mesmo do agente privado, é o que a gente chama de D&O, para diretores e gerentes. Esse seguro foi montado para qualquer diretor ou gerente. Mas é claro que todo produto privado sempre é acessível em um primeiro momento pelas empresas privadas e se tornou um produto de grande importância — há casos em que na entrevista para determinados cargos você é questionado se possui seguro D&O. Esse sucesso na área privada começou a ser melhor visualizado pela área pública, os gestores públicos começaram a se preocupar com isso, especialmente gestores de economia mista, empresa pública de capital direto. Esses executivos começaram a buscar uma forma de contratar, alguns poucos até contrataram do seu próprio bolso, outros menores ainda a empresa pagou. Mas há uma discussão dentro do governo se é possível ou não que uma empresa pública pague o prêmio do seguro D&O. É uma discussão que, pelo que eu tenho acompanhado, tende a ser superada no sentido de confirmarem essa possibilidade. E se isto ocorrer a tendência é você ter também, em um curto espaço de tempo, apólices de seguro D&O para todos os gestores públicos, porque ela não faz distinção, o que cobre para o privado cobre para o público também.

ConJur — Não importa o tipo de empresa?
Sérgio Barroso de Mello — É a responsabilidade dele como gestor. Qualquer ato de gestão que não seja doloso, porque se for doloso é má-fé, aí não tem cobertura, mas qualquer ato de gestão que venha a causar um dano à sociedade, a terceiros, etc., ele está coberto.

ConJur — E no caso, por exemplo, de funcionário que causou um acidente de trabalho. Quando a culpa é provada do funcionário. Foi ele que não seguiu uma regra da empresa, a seguradora cobre isso?
Sérgio Barroso de Mello — Cobre e isso acontece muito. Um exemplo: um canteiro de obras em que a empresa oferece material de prevenção de acidentes, mas não fiscaliza. O ato de não fiscalizar foi o que gerou o não uso dos equipamentos.

ConJur — A culpa então é de quem não fiscalizou?
Sérgio Barroso de Mello — Isso. Mas é culpa e não dolo. Quer dizer, o segurado que não fez a fiscalização, ele não fez por quê? Porque ele esqueceu, porque ele não contratou. Ele não fez a fiscalização porque queria que o sujeito morresse. Então, não dá para negar a indenização, está coberto. O que o mercado está fazendo é estabelecer com os seus clientes linhas preventivas para evitar esses acidentes.

ConJur — Como assim?
Sérgio Barroso de Mello — Em situações como essas na área de engenharia há uma obrigação de se manter uma vigilância, uma fiscalização mais efetiva, sobre o uso, por exemplo, dos equipamentos de proteção e que evitam os acidentes. Com isso a gente estava indenizando bastante os acidentes, o que é bom, porque no fundo é o seguro contribuindo para que a população não perca vidas. Isso é muito bom, muito importante.

ConJur — E a questão da arbitragem no seguro, como que ela funciona? Em regra, o segurador pede uma cláusula arbitral?
Sérgio Barroso de Mello — A lei de arbitragem não permite que o segurador faça uma cláusula e obrigue o segurado. A lei de arbitragem exige, para que haja validade em uma cláusula arbitral, que o segurado assine nela com duas testemunhas. Mas poucos fazem. Em geral, apenas alguns grandes têm solicitado nos últimos anos uma cláusula compromissória.

ConJur — Por que apenas grandes clientes?
Sérgio Barroso de Mello — Motivados por dois aspectos fundamentais: o primeiro é que eles sabem que se tiver um litígio na Justiça com a seguradora vai durar no mínimo seis anos. Ninguém está disposto a esperar esse período todo. Uma arbitragem dura um ano, um ano e meio ou dois, no máximo. E segundo, a qualidade da decisão arbitral. Na Justiça comum seu processo é distribuído a um juiz que tem centenas de outros para julgar e que não tem uma estrutura funcional que o ajude a pesquisar. Esses juízes procuram resolver a maioria dos casos por questão de ordem processual de forma que passam ao lado do mérito. Quando tem que examinar o mérito eles demoram, porque é mais fácil enrolar. Ouvir testemunha, juntar documento, fazer a perícia, cada procedimento são meses e meses. Quando termina tudo isso bate aquela preguiça, o processo vai para a banca do juiz e fica lá no gabinete junto com um monte de processos. Ele olha o tamanho do processo e junto um monte de pequenos. Ele vai soltando os pequenos e aquele vai ficando. Quando finalmente pega para examinar, faz de maneira superficial. Não vai estudar cada documento, cada evidência de direito como deveria. Vai dar uma opinião singela no campo do Direito que vai prevalecer. Pode ver que as sentenças são todas assim, nenhuma dela vai dar profundidade no caso.

ConJur — E como funciona na arbitragem?
Sérgio Barroso de Mello — Se duas partes forem fazer uma arbitragem, cada uma vai nomear o seu árbitro. Se os dois não chegarem a um acordo a câmara nomeia um terceiro, porque tem que ser um número ímpar. Os árbitros escolhidos são aqueles profissionais que conhecem o problema que será decidido. Ele vai dialogar com você e com seus advogados na arbitragem em um nível muito mais elevado que o juiz. Em uma audiência arbitral você, advogado, tem que conhecer muito, sobre aquela matéria, porque está diante de um sujeito que conhece muito mais que você. Não adianta você querer usar filigranas, chicana forense, encher de celulose, fazer o que parece uma Disneylândia jurídica. Se você fizer isso na arbitragem é ruim para você e seu cliente.

ConJur — Podemos dizer que é uma decisão mais justa?
Sérgio Barroso de Mello — As relações na arbitragem são muito mais éticas. Não é justo e correto trabalhar, como na justiça, com essa chicana toda. Então temos uma relação mais correta, mais leal, entre advogados, partes e árbitros, mas exige alto nível. A consequência é uma decisão arbitral, normalmente, muito bem fundamentada. Você pode até perder, mas você vai ver que eles foram a fundo em todo caso. Não tem decisão sem qualidade. Você pode até discordar da tese, mas é uma tese que vai ser apresentada a você com uma série de elementos, de evidências, de apoio. Bem diferente de uma sentença.

ConJur — Mas depois desta sentença não há mais contestação.
Sérgio Barroso de Mello — De fato a decisão arbitral é única e ao decidir se fará ou não uma arbitragem é preciso ter consciência disso. A arbitragem é uma decisão só. O máximo que você pode fazer é o chamado embargo, mas ele serve apenas para corrigir erros materiais, o mérito não se altera.

ConJur — A arbitragem deveria ser mais utilizada?
Sérgio Barroso de Mello — Acho, mas é caro. Arbitragem não é um procedimento barato e por isso não é possível popularizar. Para se ter uma relação custo/beneficio boa você tem que partir de um caso de no mínimo de R$ 1 milhão, porque senão você acaba gastando muito entre honorários de advogado, árbitro, câmara e não compensa. Talvez esse seja o calcanhar de Aquiles da arbitragem, ela é cara. Mas tem esse custo porque é feita sob medida e é célere. O fato é que se você tem um caso grande vale a pena não vai ficar 10 anos esperando.

ConJur — Qual é exatamente o papel da Aida?
Sérgio Barroso de Mello — Nosso trabalho é intelectual. Nós fazemos um congresso anual e temos 15 grupos de trabalho temáticos que produzem leis e dão apoio aos legisladores. Nós damos apoio atualmente a quatro projetos, por exemplo, que estão no Congresso Nacional.

ConJur — E quem financia a Aida?
Sérgio Barroso de Mello — A fonte de receita é a anuidade que os advogados pagam e, eventualmente, a receita dos eventos. Uma característica interessante é que praticamente todos advogados que são sócios são concorrentes, porém, como a associação tem um objetivo bem acadêmico, a gente consegue conviver bem.

ConJur — Como é a composição da Aida?
Sérgio Barroso de Mello — A Aida é formada por advogados, juízes, estudantes, magistrados e professores do mundo inteiro. Sua sede fica em Londres, mas ela tem as chamadas sessões nacionais espalhadas por 92 países, entre eles o Brasil. Aqui a sede é em São Paulo e conra com cerca de 480 sócios. O Conselho Mundial da Aida tem 18 membros, eu sou o membro que representa os países de língua latina. A Aida mundial tem dois comitês, um de países latinos e um de países de outros idiomas. Esse comitê chama-se SILA, ele faz um congresso a cada dois anos de todos os países que falam português ou espanhol. A Aida tem ainda o que a gente chama de Arias, que é o Tribunal Arbitral da associação. Há tribunais em Londres, em Paris, em Nova York, em Sidney, na Austrália e no México.

ConJur — E agora tem um Arias ibero americano?
Sérgio Barroso de Mello — Tomamos essa decisão por perceber o aumento de litígios envolvendo seguro e resseguro em países latinos sendo levados para Londres, o que é muito caro, e que a Inglaterra é um pais que não tem a tradição do nosso Direito. Então escolhemos montar um Tribunal Arbitral no Chile por ser geograficamente o melhor ponto e porque é um país que tem uma tradição de arbitragem muito boa.

ConJur — Em caso de empresas, existe alguma tipo de seguro tributário? No caso da empresa receber uma multa do Fisco ou algo nesse sentido?
Sérgio Barroso de Mello — Essa é uma grande demanda do mercado, mas a Susep não está mais permitindo. Havia no seguro de Responsabilidade Civil a cobertura para multa, agora, sem a menor justificativa, a Susep não permite mais. Certamente essa é uma das coberturas que começará a ser comprada no exterior.

ConJur — Falta uma legislação no Brasil especifica para evitar esse tipo de ingerência da Susep?
Sérgio Barroso de Mello — Não. O que falta é o governo transformar a Susep em uma agência. A atividade de seguros é uma atividade com uma participação muito significativa no PIB. Não é mais possível a gente conviver com um órgão regulador que não tenha uma perenidade, e só uma agencia pode ter, porque são constituídas por lei com regras muito fixas. O mercado de seguros precisa disso, para ter mais tranquilidade, segurança jurídica e poder continuar crescendo.

ConJur — O resto não precisa mexer na legislação do seguro.
Sérgio Barroso de Mello — Não. Não há conflitos no Judiciário que não encontrem um amparo no Código Civil, que está em vigor há 10 anos e possui 50 artigos sobre seguros que deixa tudo muito bem definido. O que está ali regula perfeitamente as relações. Nós temos um player de normas que vão ao encontro do que se faz no exterior. São normas que vão ao encontro do direito, do seguro nos países mais desenvolvidos. Essas leis são muito parecidas com o nosso Código Civil, porque são os direitos fundamentais que precisam estar estabelecidos.

ConJur — O senhor falou do crescimento do mercado. Como é que fica para a advocacia a falta de gente que entende dessa área no Brasil?
Sérgio Barroso de Mello — Há 10 anos faltava, agora há muitos advogados que estão envolvidos com a operação. Nós tivemos nos últimos anos vários cursos de extensão, de pós graduação, vários advogados começaram a atuar mais no setor, a treinar, a ir para o exterior, aprender um pouco mais. A própria abertura do mercado de resseguros propiciou uma integração dos advogados brasileiros com os advogados estrangeiros, e isso fez com que houvesse uma troca de experiência. O número de profissionais hoje supre o mercado, não tem nem carência, nem excesso. Há um número razoável de advogados e há mercado para todos.

ConJur — Existe um tipo de seguro para jornalistas, para dano moral em caso de publicações?
Sérgio Barroso de Mello — A evolução dos seguros de Responsabilidade Civil estava indo em uma linha no chamado seguros de Responsabilidade Civil profissional. Hoje você tem seguro de advogados, de engenheiros, de arquitetos, de médicos, e uma das coisas que o mercado estava preparando era seguro para áreas de comunicações, dentre outras áreas. Que tipo de garantia? Basicamente todas as garantias relativas a um dano que você causa a terceiros com as medidas que você venha a adotar, matérias publicadas, etc., desde que não sejam dolosas. Só que a Susep com a circular cortou pela raiz esses produtos. Então, o produto não existe.

ConJur — E é possível eu contratar um seguro estrangeiro?
Sérgio Barroso de Mello — Isso é interessante. A Lei de Seguros diz que é possível você contratar um seguro no exterior quando o Brasil não tem aquele tipo de cobertura. Mas para isso você tem que seguir uma regrinha, de pelo menos buscar em cinco companhias de seguro diferentes um pedido de seguro e eles têm que dizer que não vendem o produto. Se você conseguir isso aí você pode contratar de fora. Eu não tenho dúvida, por exemplo, na área de comunicação essa é uma demanda que a cada momento aumenta. Esse aumento deveria resultar no produto no mercado, mas o mercado não consegue ter produto porque o órgão regulador não permite. Com isso, contratar no exterior é a saída.

ConJur — E no caso de advogado é a mesma coisa?
Sérgio Barroso de Mello — Advogado não. A gente já tinha um produto especifico para profissionais liberais que englobava advogado, médico, engenheiro, arquiteto… Você tem isso disponível no mercado. Mas são coberturas que tendem a se reduzir por conta dessas normas nefastas. Eu não sei nem como será nas renovações, porque muitas coberturas não vão mais poder ser concedidas como antes, como as multas.

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