Acusações de improbidade

Acordo com MMX faz procurador representar contra MP

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5 de dezembro de 2013, 15h08

A Procuradoria da República no Amapá recebeu, na última quinta-feira (28/11), uma Representação contra a procuradora da República em Mato Grosso do Sul, Damaris Rossi Baggio de Alencar Gavronski; e a procuradora-geral de Justiça do Amapá, Ivana Lúcia Franco Cei. Ambas são acusadas de improbidade administrativa pelo procurador da República Manoel Pastana, lotado em Porto Alegre.

As condutas caracterizadoras dos atos de improbidade teriam sido praticadas na execução de um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta Ambiental, assinado entre os MPs e uma mineradora então pertencente ao empresário Eike Batista, que teria acabado se livrando de cumprir a legislação ambiental.

Conforme Pastana, os fatos narrados na peça oferecem elementos suficientes para, ‘‘no mínimo’’, a instauração de Inquérito Civil Público contra as representadas. ‘‘O caso é escandaloso, é vergonhoso, é lamentável, é ilegal, é imoral, é antiético. Foram gastos R$ 6 milhões, que deveriam estar à disposição do Juízo, no bojo da Ação Civil Pública 2006.31.00.001801-2’’, acusa o procurador.

Pastana explica que a Representação não tem o objetivo de questionar o que foi pactuado no TAC, mas chamar à responsabilização administrativa os que promoveram gastos indevidos dos recursos. Aqueles que, de fato, atuaram como ordenadores de despesas, expedindo ofícios com determinação de transferências bancárias para conta de particulares, autorizações para aquisições e pagamentos de bens e de serviços e outros atos típicos de administradores.

‘‘Os representados, membros do Ministério Público, profundos conhecedores da lei, autorizaram e celebraram vários negócios jurídicos com terceiros, que resultaram no gasto de quase R$ 6 milhões, uma vez que apenas pequena quantia foi restituída, ignorando por completo, entre outras coisas, a regra elementar da contratação no serviço público: a licitação’’, destaca na peça protocolada.

Contatado pela Consultor Jurídico, Pastana diz esperar que o procurador da República ao qual for distribuída a Representação ‘‘cumpra com o seu dever legal de promover a responsabilidade, como nós, membros do MPF, fazemos com qualquer pessoa que infrinja a lei’’.

Ação Civil Pública
O caso teve início quando o Ministério Público Federal manejou uma Ação Civil Pública, em trâmite na 2ª Vara Federal de Macapá (AP) desde outubro de 2006, contra a Mineração Pedra Branca do Amapari (MPBA). O objetivo principal era pedir a nulidade de dois documentos: a Licença Ambiental de Instalação emitida pelo Estado do Amapá, concedida pela Secretaria do Meio Ambiente sem o estudo prévio de impacto ambiental (EIA/RIMA); e a Declaração de Interesse Social (DIS) da empresa mineradora. Tais documentos levaram à autorização de pesquisas para prospecção de minério de ferro na região.

O MPF também questionou o Decreto 193, de 22 de julho de 2006, da Prefeitura de Pedra Branca do Amapari, que beneficiou a mineradora. Além de ferir o Código de Mineração e não encerrar ‘‘interesse social’, o decreto alcança terras da União. Conforme a inicial, ‘‘isso significa dizer que antes mesmo de iniciar qualquer tipo de atividade em área pertencente à União, a requerida deveria ter realizado estudo de impacto ambiental e solucionado a situação daqueles que lá se encontravam, indenizando-os em razão de sua posse legítima”.

No dia 21 de dezembro de 2007, o Ministério Público do Amapá e o MPF celebraram um Termo de Ajuste de Conduta com a empresa MMX Amapá e Mineração, cessionária dos direitos minerários da Mineração Pedra Branca do Amapari, ré na ACP. O pacto resultou no pagamento de R$ 6 milhões.

Conforme a cláusula primeira, parágrafo único, o montante se destina ao desenvolvimento de projetos socioambientais, a cargo dos Ministérios Públicos pactuantes, cujos projetos serão encaminhados à empresa MMX pelos promotores de Justiça titulares das Promotorias de algumas comarcas do Amapá e a Procuradoria da República. No curso dos fatos, a empresa MMX concluiu negociação com a Anglo Ferrous Brazil, tornando-se, esta, cessionária dos direitos minerários daquela. E também das obrigações assumidas.

Dimensão reduzida
O juiz federal João Bosco Costa Soares da Silva, entretanto, considerou a importância pactuada no TAC muito aquém da dimensão do empreendimento. Em despacho, registrou sua inconformidade: ‘‘Portanto, reputo o acordo (…) como sendo perigosamente ‘lesivo’ ao interesse público, pois é muitíssimo aquém, inclusive, do que a requerida MMX Amapá Mineração se predispôs a pagar. Isso é muito grave, muito grave. Ora, tal acordo é firmado pelo valor de 5 milhões de reais, sendo que a Requerida ofertou 1% do faturamento líquido que, em 20 anos — estimativa de operação do empreendimento — importará numa cifra de, aproximadamente, 100 milhões de reais. Só por aí já se divisa absoluta incongruência desse acordo em face do interesse social’’.

No despacho, datado de 25 de fevereiro de 2008, o juiz informou a realização de uma nova audiência antes de apreciar o pedido de homologação da TAC. O seu objetivo era ‘‘tentar resolver numa só decisão, não apenas a questão de fundo desta demanda, como também o da necessidade de melhor adequação do percentual compensatório pela exploração dos recursos minerais’’.

Inconformado com a não-homologação do TAC, o MPF entrou com Agravo de Instrumento no Tribunal Regional Federal da 1ª Região contra a decisão do juiz. No dia 18 de outubro de 2013, saiu a decisão terminativa do recurso, negando seu seguimento.

Segundo a Representação, a ACP ficou paralisada, mas os representados não. Eles não se preocuparam com a falta de homologação e trataram de gastar o dinheiro em finalidade diversa do pactuado e sem observância das formalidades legais, inclusive ignorando disposição do próprio TAC, assegura Manoel Pastana.

‘‘Como homologar um acordo financeiro se o dinheiro ofertado para tanto não mais existe? Não há respaldo jurídico que justifique a Justiça homologar acordo financeiro, em processo de interesse público, como o é a Ação Civil Pública, sem a existência do recurso à disposição do Juízo ou com justificativa, devidamente comprovada nos autos, do emprego do recurso na finalidade pactuada e dentro dos ditames legais’’, questiona o procurador.

O outro lado
A redação da ConJur contatou as representadas por telefone e e-mail, enviando cópia da Representação, para ciência. Até a publicação desta reportagem, a procuradora da República no MS, Damaris Rossi Baggio de Alencar Gavronski, não se manifestou a respeito.

Já a procuradora-geral de Justiça do Amapá, Ivana Lúcia Franco Cei, se manifestou oficialmente por meio de nota, enviada por sua Assessoria de Comunicação. Leia na íntegra:

Nota de Esclarecimento MP-AP

”Ministério Público do Estado do Amapá (MP-AP) esclarece que as denúncias contra a Procuradora-Geral Ivana Lúcia Franco Cei foram extensamente e exaustivamente investigadas por todos os órgãos de controle do Ministério Público Federal e Ministério Público Estadual, sendo atestadas a regularidade, legitimidade e legalidade dos atos funcionais dos membros do Ministério Público.

Causa estranheza a insistência de ações com o mesmo objeto, que já foram arquivadas, e com o único objetivo de macular a imagem da instituição Ministério Público, que tem junto à população merecido reconhecimento pela atuação em defesa dos direitos da sociedade amapaense. 

Contra fatos não há argumentos!
Tudo começou em 2011, quando se iniciaram as investigações, pela Polícia Civil e Ministério Público Estadual (MP-AP), no âmbito da Assembleia Legislativa do Estado (ALEAP), à época tendo como presidente o deputado estadual Moisés Reátegui de Souza, que duplicou o valor da verba indenizatória dos deputados estaduais. Fato que mereceu matéria-denúncia no ‘Fantástico’, programa dominical da Rede Globo.

No dia 21 de dezembro de 2011, o deputado Moisés Souza requisitou à empresa Anglo Ferrous Amapá Mineração toda a documentação referente à movimentação financeira e pagamentos oriundos dos Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), assinados, em 2006 e 2007, com o Ministério Público Estadual e Federal, por intermédio de seus Promotores e Procuradores.

A partir de então, o deputado Moisés Souza e o juiz federal João Bosco Soares passaram a engendrar várias representações para fastar os Procuradores da República, a Procuradora-Geral de Justiça do Amapá, assim como os Promotores de Justiça que atuavam contra o primeiro nos processos relacionados à ‘Operação Eclésia’.

Em maio de 2012, depois do levantamento de vários indícios apurados por meio da quebra de sigilo bancário e telefônico, a Polícia Civil do Amapá, em conjunto com o MP-AP, deflagrou a chamada ‘Operação Eclésia’, que resultou no afastamento do presidente e do primeiro secretário da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Amapá, deputados estaduais Moisés Souza e Edinho Duarte, respectivamente.

Os dois parlamentares são réus em diversas Ações de Improbidade Administrativa (ACP), ajuizadas pelo MP-AP por desvio de recurso público, causando danos ao erário. 

Em relação à conduta do magistrado João Bosco, o Ministério Público Federal (MPF), a Advocacia-Geral da União (AGU) e o Ministério Público Estadual (MP-AP) formularam denúncias que resultaram no trâmite de Reclamações Disciplinares junto à Corregedoria Nacional de Justiça, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)."

Clique aqui para ler a íntegra da Representação. 

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