Primeiro precedente

Cade orienta casos de operação não autorizada

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30 de agosto de 2013, 18h45

Pouco mais de um ano de vigência da nova Lei de Defesa da Concorrência (Lei 12.529/2011), o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) proferiu a primeira decisão que penaliza empresa por consumação prematura da operação, o chamado gun jumping.

Em sessão de julgamento nesta quarta-feira (28/8), a conselheira Ana Frazão, acompanhada pelos demais conselheiros do tribunal, aprovou a celebração de acordo entre Cade e OGX Petróleo e Gás S.A. (OGX), por meio do qual a referida empresa comprometeu-se a pagar o montante de R$ 3 milhões por prática de gun jumping. O acordo deu-se no contexto do Ato de Concentração, que tratou da aquisição de 40% da Petrobras, no Bloco BS-4, localizado na Bacia de Santos (SP).

O regime de submissão prévia de Atos de Concentração Econômica foi introduzido em junho do último ano e impede a concretização de operações econômicas, como fusões, incorporações, aquisição de ações e ativos e contratos associativos, antes da aprovação do Cade. No regime anterior, era possível consumar imediatamente o negócio, independentemente de chancela da autoridade concorrencial.

Na hipótese de a operação ser de notificação obrigatória (realizada por empresas ou grupo de empresas que tenham registrado faturamento bruto, no ano anterior, de R$ 750 milhões, de um lado, e R$ 75 milhões, de outro), as partes não deverão concretizar o negócio sem prévia manifestação do Cade.

As penalidades impostas pela lei, em caso de descumprimento, são severas. Os atos consumados prematuramente podem ser objeto de nulidade, sem prejuízo da aplicação de multa, que pode variar de R$ 60 mil a R$ 60 milhões, e de abertura de processo administrativo para apuração de infração à ordem econômica.

Embora a adoção do regime prévio tenha muitos benefícios e alinhe o Brasil com as melhores práticas internacionais, a modificação do sistema causou insegurança e foi objeto de debate robusto, à medida que exige significativa alteração da cultura empresarial brasileira.

Da parte das autoridades, houve esforço para regulamentar a lei. O Regimento Interno do Cade trouxe orientação sobre a preservação das relações entre as empresas envolvidas. As partes devem preservar estruturas físicas e condições competitivas até a decisão, sendo vedados transferência de ativos e qualquer tipo de influência entre elas. Também é proibido compartilhar informações sensíveis sob o ponto de vista concorrencial.

Em que pesem tais diretrizes, os conceitos empregados são muito amplos. Consequentemente, muitas dúvidas ainda persistem sobre quais os limites e cuidados a serem observados pelas empresas, no período entre o início das negociações e o efetivo fechamento da operação.

Muitas situações são inequívocas e não exigem grandes esforços de interpretação. Outras, todavia, como as relativas às “cláusulas de curso ordinário dos negócios”, são comuns e suscitam dúvidas que não encontram respostas na regulamentação. De fato, mecanismos de preservação dos ativos negociados e efetiva “influência de uma parte sobre a outra”, dependendo do caso, podem se confundir.

Devido à ausência de doutrina consolidada, bem como de jurisprudência, o pronunciamento do Cade sobre o assunto foi muito aguardado durante o primeiro ano da nova lei.

Nesse contexto, a decisão no caso OGX tem importância significativa, sobretudo por trazer orientação um pouco mais concreta sobre as hipóteses de incidência de gun jumping, bem como dos critérios de aplicação de penalidades.

Naquele caso, a conselheira-relatora, citando pareceres técnicos, considerou que a operação foi prematuramente concretizada, diante de três fatos principais, ocorridos antes da aprovação do Cade: (i) assunção imediata, pelo comprador, de direitos e obrigações previstos no contrato, a partir da assinatura; (ii) efetiva participação do comprador nas decisões a serem tomadas pelo vendedor; e (iii) compartilhamento de informações concorrencialmente sensíveis entre as partes, que, no caso, são concorrentes.

No que se refere à nulidade dos atos, o Cade, excepcionalmente, deixou de aplicar penalidade, por conta de características específicas da operação: (i) não gerou efeitos prejudiciais à concorrência, sendo aprovada sem restrições; (ii) os ativos ainda não estavam em operação; e (iii) os atos praticados foram considerados secundários, meramente administrativos. Além disso, conferiu tratamento mais benéfico à OGX em razão de cenário regulatório atípico.

O valor da multa é representativo e foi calculado com base nos critérios legais, como boa-fé e situação econômica do agente, com destaque para a gravidade da infração. Não obstante a operação ter sido aprovada sem restrições e os ativos não estarem operando, o Cade reputou elevada a gravidade da infração, por ferir o conceito basilar do regime de submissão prévia.

O precedente leva em conta aspectos específicos da operação em discussão e não esgota o tema, mas é, no momento, a melhor orientação disponível.

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