Direito de defesa

Apuração de doação eleitoral tem de seguir processo legal

Autor

22 de agosto de 2013, 13h59

A fim de minorar a possibilidade de ocorrência de abuso do poder econômico nas eleições, a Lei 9.504/97 estabeleceu que as pessoas naturais só poderiam doar até 10% de seu rendimento bruto anual e que as jurídicas estariam limitadas a 2% de seu faturamento. Como forma de assegurar a eficácia da norma, estabeleceu-se que a empresa — e somente ela — que doasse acima dos limites ficaria sujeita a pesada multa e a proibição de participar de licitações e contratar com o Poder Público por cinco anos.

Não havia, portanto, qualquer previsão de sanção em desfavor dos dirigentes da empresa. Em razão disso, a representação para apurar a licitude, ou não, da doação, normalmente movida pelo Ministério Público, tinha como figurante no polo passivo apenas a empresa. Os sócios, já que a eles nada se poderia imputar, não eram chamados ao processo.

A Lei Complementar 135/2010, a chamada Lei da Ficha Limpa, alterou esse cenário. Previu que os dirigentes de empresas que doassem acima dos limites se tornariam inelegíveis pelo longo prazo de oito anos.

A partir desse momento, parece, com a devida vênia dos que entendem em sentido oposto, imprescindível a citação dos dirigentes da empresa para a ação em que se discutirá a legalidade, ou não, da doação. São eles, a meu ver, litisconsortes passivos necessários, pela simples razão de que serão brutalmente atingidos pela sentença a ser proferida, caso condenatória.

Note-se que o Tribunal Superior Eleitoral entende que inelegibilidade em questão é decorrência do julgamento da representação que considere ilegal o ato de liberalidade. Isso, a meu juízo, reforça ainda mais a necessidade de integração à lide dos dirigentes da empresa doadora.

Caso não se promova tal integração, pode ocorrer de o dirigente da empresa, sem nunca ter tido a chance de se manifestar sobre o tema, ter um de seus direitos políticos, o de ser votado, suspenso.

Isso acontecerá porque, na representação feita para apurar e punir a eventual doação ilegal, ele não será sequer citado e no processo de registro não é cabível qualquer defesa pessoal do dirigente quanto ao tema.

Desse modo, mesmo que existam razões que afastariam a responsabilidade, como ausência de participação no ato da doação, exclusão do dirigente da empresa doadora antes do ato, entre outras, o cidadão será punido sem poder se defender.

Note-se, ainda no mesmo sentido, que a alínea “p”, do inciso I, do artigo 1º, da Lei Complementar 64/90, em sua redação atual, estatui que, para a configuração da inelegibilidade em questão, deva ser respeitado o procedimento previsto no artigo 22 da mesma lei. Tal procedimento garante maior possibilidade de defesa. Ora, se exige que se respeite tal procedimento, exatamente no artigo que prevê a inelegibilidade, parece claro que a lei pretendeu dar àqueles que nela puderem vir a incidir o máximo direito de defesa. É claro que, sem serem sequer citado, defesa nenhuma poderão oferecer.

Não me parece, por outro lado, suficiente, como se tem aventado, a admissão, como assistente, do dirigente. Se ele não é citado para a representação, há grandes chances de nem saber de sua existência. Imagine-se, por exemplo, a hipótese de dirigente de área que não foi a responsável pela doação, ou mesmo aquela em que se afastou da empresa. Como poderá saber que uma representação foi movida?

A conclusão, segundo penso, é inarredável: a citação dos dirigentes das pessoas jurídicas, na hipótese suscitada, é de rigor.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!