Eleições da AMB

"Juízes têm o dever ético de receber advogados"

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7 de agosto de 2013, 9h00

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Dr. Roberto Bacellar - 06/08/13 [Divulgação]

Com o slogan "AMB para os Magistrados, Justiça para o Brasil – Juiz Forte, Brasil Melhor", o juiz parananese Roberto Portugal Bacellar é o candidato da situação à presidência da Associação dos Magistrados Brasileiros, marcada para o dia 22 e 23 de novembro. Atualmente, a entidade é presidida pelo desembargador Nelson Calandra

"O juiz que eu quero que julgue meu caso é um juiz com total independência, e cabe às associações de magistrados assegurar essa independência aos magistrados brasileiros", diz.

Se eleito, Bacellar irá comandar uma das principais associações de magistrados, que congrega 36 associações regionais, sendo 27 de juízes estaduais, sete de trabalhistas e duas de militares. Ao todo são 14 mil associados, incluindo também magistrados federais.

Ainda sem a definição de quem serão os 11 vice-presidentes que comporão sua chapa, Bacellar lançará oficialmente sua candidatura na próxima segunda-feira (12/8), em Brasília. Ele explica que por ser um país continental, a composição da chapa é feita de forma gradativa, buscando a representatividade pelos estados.

Em entrevista à revista Consultor Jurídico, Bacellar afirmou que dará continuidade ao trabalho feito pela a atual gestão, que, segundo ele, sempre buscou a valorização do magistrado. “Falar que acabar com as férias vai acabar com o problema da magistratura é como falar que para melhorar a educação nós temos que acabar com as férias de 60 dias dos professores. Na verdade, me parece um erro no foco. Existe uma compensação exatamente adequada daquilo que se exige de determinadas profissões”, defende.

Na entrevista, o juiz fala sobre remuneração do magistrado, o papel da AMB e sua relação com o Conselho Nacional de Justiça. “Quando houver qualquer ruído, deve haver a firmeza necessária e o respeito devido”, diz após afirmar que o CNJ deve atuar de maneira menos midiática.

Ao ser questionado sobre eleições nos tribunais, Bacellar defende a participação dos juízes nas eleições para a direção dos tribunais, porém ressalta que o corregedor não deve ser eleito por ter uma função orientadora e punitiva. Também afirma que é contrário à reeleição dos presidentes de cortes: “Reeleição sempre passa uma sensação de algo que não se renova. Então, penso que seja interessante sempre haver o rodízio nas cúpulas dos tribunais”.

Com mais de 20 anos de experiência profissional, Bacellar é mestre em Direito pela PUC e presidiu a Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) no biênio 2002/2003. Hoje é diretor-presidente da Escola Nacional da Magistratura e coordenador nacional do programa Cidadania e Justiça Também se Aprendem na Escola, da AMB.

Leia a entrevista:

ConJur — A AMB é criticada por defender apenas assuntos corporativos. Qual é o papel preponderante da instituição: a defesa das causas sociais ou apenas os pleitos que são de interesse da categoria?
Roberto Portugal Bacellar — A associação tem uma finalidade muito clara, que é a defesa das garantias, dos direitos, das prerrogativas do magistrado e o fortalecimento do Poder Judiciário. Isso está no artigo 1º do Estatuto da AMB. Quando você cumpre a finalidade principal você pode se preocupar com outras ações. Essa é nossa meta. Se preocupar primeiro com aquilo que especificamente são os objetivos primeiros da associação e, em um segundo momento, trabalhar com projetos que tragam uma legitimação social maior para o magistrado, como nós já temos alguns projetos na AMB.

ConJur — A atual gestão conseguiu cumprir esse papel?
Roberto Portugal Bacellar — Em todos os momentos a atual gestão focou sua atuação nos magistrados, cumprindo o que está no artigo primeiro da AMB. Em relação a projetos de responsabilidade social, desenvolveu alguns como o Cidadania e Justiça Também se Aprende na Escola, que é um projeto que eu coordeno e que já atingiu mais de 13 milhões de crianças e jovens, em todos os estados da federação. Essa foi uma das ações pontuais que nós tivemos de aproximação do magistrado com a sociedade.

ConJur — Qual a sua proposta para defender o aumento da remuneração da magistratura? E o que seria um subsídio digno para um magistrado?
Roberto Portugal Bacellar — Primeiro, a remuneração tem que garantir a independência do magistrado. A independência econômica é que dá segurança para que ele possa se comportar, independente de qualquer pressão e de quaisquer circunstâncias. Essa independência econômica surge em face das grandes limitações que ele tem no exercício da carreira: não pode ter outra atividade, não pode ser empresário, não pode nem mesmo ser sindico do prédio se ele quiser, não pode se filiar a partidos políticos. Então, esse é o ponto fundamental. Essa função — buscar manter reposições nos subsídios —, entretanto, em primeiro lugar, é voltada ao Supremo Tribunal Federal. Quem tem que defender em primeiro lugar o subsídio digno é o próprio Supremo. Os movimentos associativos têm um papel fundamental, e é também seu papel institucional, pugnar por essa remuneração que garanta essa independência.

ConJur — E teria uma valor definido para o juiz ser independente?
Roberto Portugal Bacellar — É difícil falar em valor. A magistratura deveria ser a função mais valorizada dentre todas as carreiras do Estado, pois todas se baseiam nela. Ninguém pode ganhar mais que o ministro do Supremo, significa dizer que o ministro do Supremo por ser juiz, por ser magistrado, é o cargo maior do país. É essa lógica que tem que ser construída. Hoje, líquido, o salário é de R$ 12 mil a R$ 15 mil, já com os eventuais descontos. Se você pensar nessa remuneração para linhas gerais de mercado para profissionais com capacitação semelhante e que não se submetem a concursos públicos e que exercem outras profissões, você vai ver que realmente houve uma defasagem natural. Por isso que hoje se pleiteia tanto o adicional por tempo de serviço, para que o magistrado com mais tempo de carreira possa ser melhor remunerado do que aquele que acaba de ingressar na carreira. 

ConJur — Os juízes federais reclamam de serem menos valorizados que os estaduais. Existe essa diferenciação? Isso divide a classe?
Roberto Portugal Bacellar — Existem situações em que juízes estaduais e juízes federais têm defesas diferenciadas. Por exemplo, em determinado momento há uma postura de juízes federais querendo ocupar o espaço perante a Justiça Eleitoral, comandada pelos juízes estaduais. Os juízes estaduais estão em todas as comarcas do Brasil, enquanto os federais ficam nas grandes cidades. Então, a Justiça Eleitoral só funciona porque a Justiça Estadual está em todas pequenas comarcas. Essa disputa algumas vezes divide juízes estaduais e juízes federais. Outra disputa pontual é com relação a federalização de crimes referentes aos direitos humanos. Há uma definição que se procura dar a alguns tipos de crimes pela sua importância e os juízes federais entendem que esses crimes deveriam ser julgados pela Justiça Federal. Na verdade, a magistratura é nacional e a distinção entre Justiça Estadual e Federal é apenas uma distribuição de atribuições de competências. Isso não é fator para que haja um distanciamento entre essas duas esferas. Os pontos em comum são muito maiores do que os pontos que nos diferenciam.

ConJur — Como o senhor avalia a relação entre advogado e o juiz? O juiz que não recebe advogado deve ser punido?
Roberto Portugal Bacellar — As associações e entidades de classe sempre trabalharam de uma maneira a harmonizar os seus papeis, trabalhando muitas vezes em conjunto para ações voltadas ao aperfeiçoamento do Poder Judiciário e da própria classe jurídica. Nas pequenas comarcas do Brasil há um bom contato de juízes e advogados. São raros os exemplos em que um juiz que não recebe o advogado. A regra é essa, uma relação com urbanidade. Claro que existem exceções. O magistrado, muitas vezes, pelo volume de serviço, compelido a produzir, cumprir metas e produzir mais, algumas vezes se sente na condição de achar que é preciso produzir mais e por isso, em alguns momentos, encontra-se sem tempo de atender o advogado. Pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), o magistrado deve atender os advogados. Então, até que essa norma seja modificada, os magistrados têm o dever ético de recepcionar os advogados e ouvir suas demandas. 

ConJur — E os que não fazem isso devem ser punidos?
Roberto Portugal Bacellar — É preciso uma análise. Não posso falar em punição sem conhecer as circunstâncias.  Da mesma maneira que a Ordem dos Advogados do Brasil faz quando algum advogado é acusado de praticar algum ato que contraria a urbanidade dos atos da audiência. Quer dizer, os atos são analisados no contexto em que ocorreram, e depois se verifica se cabe ou não punição. Esse é o papel das corregedorias e do próprio Conselho Nacional de Justiça. Em todas as profissões há bons e maus profissionais. Os profissionais que não cumprem regularmente os seus deveres precisam ser punidos. 

ConJur — Juízes também devem votar nas eleições para a direção dos tribunais?
Roberto Portugal Bacellar — O momento exige que se democratize a forma de escolha da cúpula dos tribunais, com a exceção de corregedores. Explico: o presidente é responsável pelo estabelecimento das diretrizes, de um plano de ação para o prestigio do Poder Judiciário. Já o corregedor tem uma função orientadora, mas ao mesmo tempo punitiva. Então, eleger corregedor poderia transparecer que nós estaríamos elegendo aquele que apresenta proposta menos punitiva. Essa é uma posição já definida, em assembleia pela AMB. Eu gostaria muito, como juiz, de poder escolher o presidente do meu tribunal. Isso vai permitir com que ele apresente propostas e eu possa escolher dentro das melhores propostas. 

ConJur — E o senhor acha que os presidentes de tribunais podem ser reeleitos?
Roberto Portugal Bacellar — Atualmente não. E não devem poder. Há nos tribunais um número de magistrados suficiente, com pessoas capacitadas, para que haja alternância. Mesmo nos tribunais pequenos há um rodízio e isso é propício a ensejar novas ideias. Reeleição sempre passa uma sensação de algo que não se renova. Então, penso que seja interessante sempre haver o rodízio nas cúpulas dos tribunais.  

ConJur — E o senhor defende alguma atualização da Loman? O que precisaria mudar?
Roberto Portugal Bacellar — O adicional por tempo de serviço é uma proposta fundamental para melhor profissionalizar a carreira da magistratura, permitir que o magistrado fique mais tempo na carreira e não se aposente prematuramente. Isso depende de uma emenda constitucional e depende da reforma da Loman. Em relação ao magistrado, isso é fundamental. E depois preservar as nossas garantias de independência para que possamos prestar o melhor serviço a população. Isso é inegociável, isso que faz com que o juiz possa ser juiz independente de qualquer pressão. 

ConJur — Quanto a proibição dos juízes participarem de eventos patrocinados pela iniciativa privada. Qual a sua opinião?
Roberto Portugal Bacellar — Me parece um exagero estabelecer quando o juiz pode ou não participar de um evento. Ficaria mais adequado analisar de qual evento o magistrado participou e se isso afetou de alguma forma sua independência. Após investigação e análise do contexto, [deve-se] aplicar as medidas adequadas. Inclusive punitiva, se ficar comprovado que ele fez algo que contrarie os princípios éticos. Não concordo em generalizar, imaginar que um magistrado, por ter comparecido a um evento que tem apoios de instituições privadas, possa julgar favoravelmente a uma das partes. O magistrado tem plenas condições de decidir, de se aperfeiçoar, de poder buscar o conhecimento onde quer que o conhecimento esteja, e voltar para sua Vara e decidir com independência. 

ConJur — O senhor defende as cobranças de meta de produtividade do CNJ. Elas pressionam os juízes?
Roberto Portugal Bacellar — A existência de metas é positiva. Elas são fundamentais para a gestão do Poder Judiciário. Com elas é possível fazer um planejamento estratégico, saber onde se almeja chegar, atingir um processo mais célere. O que não é possível é considerar cada juiz como unidade produtiva, como se fosse possível tratar as relações humanas como se fosse um fábrica ou uma produção em série, exigindo do juiz quantitativamente números de sentença superiores à capacidade humana. O juiz tem que ser um cidadão humano para produzir uma sentença que possa pacificar as convivências entre os cidadãos, o que, afinal de contas, é nossa missão fundamental.

ConJur — É possível melhorar a estrutura da primeira instância sem aumentar salários?
Roberto Portugal Bacellar — A estrutura do magistrado, principalmente em primeira instância, ainda é deficitária em muitos estados. Em alguns casos você tem um juiz sem a mínima estrutura para poder fazer cumprir aquelas metas que são exigidas pelo CNJ. Então, antes de se exigir o cumprimento dessas metas tem que se dar condições ao juiz. O Poder Judiciário precisa melhor redistribuir as formas de assessoria afim de que o juiz de primeira instância possa ser melhor aparelhado para poder produzir melhores decisões. 

ConJur — E se for necessário optar entre melhorar a estrutura de primeira instância ou aumentar o salário do magistrado, qual o senhor defende?
Roberto Portugal Bacellar — Na verdade, são rubricas diferenciadas onde jamais essa opção vai ser possível dentro da estrutura legal do país. Subsídios saem de uma fonte especifica. Algumas vezes as pessoas confundem isso como se nós pudéssemos usar os mesmos recursos para aparelhar o sistema Judiciário economizando em outra parte. As duas coisas têm que caminhar juntas. O magistrado mal remunerado não será um bom prestador de serviços público à sociedade. Essa opção de escolher entre um ou outro não é possível no país. 

ConJur — Nem como uma bandeira do presidente da associação?
Roberto Portugal Bacellar — Não posso defender uma bandeira que seja impossível de ser articulada legalmente. Jamais defenderia uma bandeira que fosse apenas uma venda de ilusões para dizer que eu faria algo, quando isso não é possível de se fazer legalmente. Além disso, trata-se de coisas distintas. O profissional bem remunerado — e isso quem trabalha com gestão de pessoas sabe — presta um melhor serviço. De outro lado vem uma estrutura suficiente para que ele possa cumprir as suas metas. As duas coisas devem caminhar juntas. Eu vou trabalhar pelo juiz bem remunerado e pelo juiz com toda estrutura necessária, e trabalhando com gestão.

ConJur — Um dos problemas do Judiciário é a produtividade dos juízes. Há casos em que no mesmo tribunal alguns desembargadores julgam processos que chegaram na última semana enquanto outros possuem um grande acervo. O que pode solucionar essa questão da produtividade?
Roberto Portugal Bacellar — A produtividade, hoje, tem uma relação direta com a demanda. Temos um estoque de 90 milhões de casos e todos os anos ingressam 25 milhões de novos processos. Esse volume faz com que os juízes brasileiros tenham que efetivamente produzir muito. Quais são as possibilidade para auxiliar nesse processo? Uma é estimular métodos consensuais de resolução de disputas como a medição e a conciliação. Por outro lado, tem a questão fundamental, que é mudar a cultura do povo brasileiro de procurar para tudo o Poder Judiciário. É preciso mudar também a cultura dos operadores do direito, dos próprios advogados, no sentido de buscar maior número de conciliações, antes de ingressar com uma demanda em juízo. A partir do momento que se abre esse leque de opções para resolver uma demanda de forma mais adequada, é prestado um melhor serviço para população e é cumprido aquilo que está na Constituição, que é o tempo razoável do processo. Os juizados especiais também precisam ser mais bem aparelhados para resolver as questões de menor complexidade. Assim os juízos tradicionais, menos sobrecarregados, poderão resolver as questões de maior complexidade e chegar a uma solução final em um tempo razoável.

ConJur — Quanto ao concurso público, o senhor acredita que o modelo de concurso público para ingresso na magistratura é suficiente?
Roberto Portugal Bacellar — Existe uma discussão atual, da qual até eu participo, junto ao Conselho Nacional de Justiça, que é a reformulação de regras para os concursos públicos. A forma de escolha dos juízes é correta, mas temos que ir aperfeiçoando essa forma para conseguir realmente juízes vocacionados: aqueles mais humanistas, que sabem que vão prestar um serviço público essencial à população e que terão limitações. Todas as limitações da carreira têm que ser trabalhadas durante o concurso para aquele que opte pela magistratura saiba que vai ser um juiz com dedicação exclusiva e integral. 

ConJur — A transmissão de julgamentos ao vivo afeta no trabalho do magistrado?
Roberto Portugal Bacellar — Acredito que tem pontos positivos, como a total transparência dos julgamentos e até mesmo a forma de mostrar como funciona o Poder Judiciário. Isso é muito importante para o Brasil. Por outro lado, há um risco, não digo que aconteça, mas há um risco dos magistrados sentirem-se pressionados, até por força daquilo que pensa a opinião pública. E isso seria o ponto negativo dessa transmissão. 

ConJur — O senhor é a favor das férias de 60 dias?
Roberto Portugal Bacellar — Sou. Exatamente por conta do que se exige do magistrado. Cada vez que se regula uma atividade são estabelecidas as peculiaridades e prerrogativas. Tudo isso faz parte de um pacote. O que acontece com os juízes? Quando eles prestam concurso público, assinam um termo de compromisso, de dedicação exclusiva, uma atividade de risco, sem limite de trabalho, sem jornada, atuam em plantões sempre à disposição da população, em domingos, feriados. Então, o contrato constitucional é esse. Ainda tem o dever de cumprir na vida pública e privada uma conduta irrepreensível em todos os momentos. Falar que acabar com as férias vai acabar com o problema da magistratura é mais ou menos falar que para melhorar a educação nós temos que acabar com as férias de 60 dias dos professores. Na verdade, me parece um erro no foco. Existe uma compensação exatamente adequada daquilo que se exige de determinadas profissões.

ConJur — Os juízes estão preparados para o processo eletrônico?
Roberto Portugal Bacellar — Como toda inovação, o processo eletrônico tira as pessoas e os profissionais da zona de conforto e isso gera um primeiro impacto negativo. Sou totalmente favorável à implantação do processo eletrônico como uma forma de você usar toda tecnologia possível e disponível a serviço de uma melhor prestação jurisdicional. Agora, precisa de capacitação para que isso possa ser implementado. Não é possível impor uma informatização sem que haja a adequada preparação para que nós possamos atingir essa melhor prestação usando desse serviço de tecnologia disponível. 

ConJur — O Judiciário tem ultrapassado seus limites e agido como legislador?
Roberto Portugal Bacellar — Não. O juiz é obrigado a decidir, mesmo que não haja legislação. A partir do momento que o juiz é provocado a decidir, ele não tem alternativa. Isso é uma contingência, os juízes estão sendo levados a decidir essas questões por força de algumas omissões legislativas. Portanto, não está nem em jogo ser favorável ou não a essa judicialização, mas sim ser uma necessidade do juiz. Um dever Constitucional de o juiz decidir quando ele é provocado, independente do que seja.

ConJur —Como está a relação das associações de magistrados com o CNJ?
Roberto Portugal Bacellar — O Conselho Nacional de Justiça é um órgão fundamental para estabelecimento de diretrizes no plano nacional e esse papel tem que ser desempenhado de forma efetiva. Mais efetiva e menos midiática. Eu diria que como órgão para estabelecimento de diretrizes o CNJ pode ainda melhorar, mas tem desempenhado bem o seu papel. No caráter de investigação e punição de juízes muitas vezes o que se vê é uma ação mais midiática e menos efetiva. Depois de ações midiáticas, passam-se anos lá e não sabemos o resultado. Na verdade, deveria ser assim: primeiro se investiga, se analisam todos os elementos e depois que da investigação resultar certeza se divulga. Hoje está acontecendo o inverso. Nesse ponto o papel das associações de magistrados é fundamental para defender as prerrogativas, as garantias e os direitos dos juízes.

ConJur — E essa relação tem sido tranquila?
Roberto Portugal Bacellar — Deveria ser tranquila, mas não tem sido. O Conselho Nacional de Justiça tem o seu papel, as associações têm o seu papel. Ao final, o papel de ambos é o prestigio ao Poder Judiciário, a valorização dos magistrados. Quando houver qualquer ruído deve haver a firmeza necessária e o respeito devido. Temos que trabalhar com essa lógica. Cada um cumprindo o seu papel sem nenhum dos dois extrapolar sua finalidade. 

ConJur — Como está a relação entre o CNJ e juízes? O senhor acredita que o perfil punitivo dado pelo presidente Joaquim Barbosa e pela ex-corregedora nacional de Justiça e ministra Eliana Calmon se reflete nas decisões do CNJ?
Roberto Portugal Bacellar — É preciso regularidade na atuação do Conselho Nacional de Justiça. Não pode uma hora ser odiado, e na outra ser amado, a partir da mudança do corregedor ou do presidente. As instituições são perenes, devem funcionar de uma maneira tranquila, equilibrada. Os magistrados têm que ter segurança suficiente para poder decidir com independência sem temer ninguém, nem mesmo o CNJ. O Conselho deve ter uma atuação restrita aos aspectos administrativos sem interferir nas decisões judiciais. Não penso que os juízes se sintam amedrontados pelo CNJ, mas que se o Conselho extrapolar a atuação do ponto de vista administrativo precisará de um limite pelo Supremo Tribunal Federal, como já aconteceu em alguns casos. 

ConJur —Tanto Eliana Calmon quanto Joaquim Barbosa criticaram o que chamam de "conluio entre juízes e advogados". Existe essa corrupção no Judiciário?
Roberto Portugal Bacellar — Nesse ponto, não há nenhuma dúvida que é papel, não só dos juízes, mas de toda sociedade combater a corrupção, porque honestidade é dever de cada cidadão. Todos nós pensamos da mesma maneira. O que discordamos é de generalizações porque você tem nas mãos um processo específico. Quando eu falava da atuação do CNJ mais efetiva e menos midiática é exatamente nesse sentido, vamos buscar a efetividade. Primeiro eu quero saber exatamente tudo que aconteceu, depois de uma investigação que assegure ampla defesa, contraditório, todas as prerrogativas e garantias. Ao final teremos uma solução e uma decisão. Aí sim a decisão deve ser noticiada. Temos visto situações que mais parecem bravatas, [com acusações] que ao final não se confirmam pelo que consta do processo investigativo. Isso em um primeiro momento gera um mal estar para toda sociedade, desvaloriza e desprestigia o juiz perante os seus jurisdicionados, e, ao final das contas, desprestigia o próprio Poder Judiciário, que é aquele guardião da Constituição, aquele que deve assegurar o direito de todas as pessoas.

ConJur — Então, existem casos de corrupção no Judiciário, mas o Judiciário não é corrupto. É isso?
Roberto Portugal Bacellar — O pensador Henry Ward Beecher disse assim: “Tire todas as togas dos bons juízes. Elas não são suficientes para cobrir a iniquidade de um só juiz corrupto”. Em todas as profissões podem existir profissionais corruptos e nesses casos você tem que atuar de maneira especifica. Mas eu não posso falar de uma maneira genérica desprestigiando a função do juiz. As instituições são perenes, precisam ser respeitadas e pontualmente você pode punir os maus profissionais, porque isso interessa a todos nós. Todos os casos que existem nós queremos que sejam bem investigados.

ConJur — Houve algum ponto importante que deixamos de abordar?
Roberto Portugal Bacellar — Um ponto que me parece importante é que a associação e as associações de magistrados têm efetivamente de se preocupar com as prerrogativas, com as garantias e com os direitos da magistratura. Em todos os momentos nós temos de ter uma instituição forte. Não podemos esquecer esse papel fundamental das associações de magistrados que é servir aos magistrados para preservar sua garantia, sua independência, para garantir que ele seja um melhor prestador de serviços. O juiz que eu quero que julgue meu caso é um juiz com total independência, e cabe às associações de magistrados assegurar essa independência aos magistrados brasileiros.

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