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Autorização para laqueadura feita na hora do parto não tem valor

3 de agosto de 2013, 5h37

Por Jomar Martins

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Autorização para laqueadura feita na hora da cirurgia não tem valor, pois vai contra os requisitos estabelecidos no artigo 10 da Lei 9.263/1996, que trata do planejamento familiar. Por ter constatado essa irregularidade numa cirurgia de cesariana, a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul mandou médico e hospital pagarem, solidariamente, R$ 35 mil de indenização moral a uma mulher submetida ao procedimento num hospital do interior.

A sentença do juízo local negou o pedido de indenização por não vislumbrar nenhuma espécie de dano ou ‘‘perda de uma chance’’. E também não acolheu o argumento de que ela e o marido não leram o conteúdo da autorização da laqueadura tubária, que viria a ser feita após a cirurgia de cesariana.

O relator da Apelação, desembargador Jorge Alberto Schreiner Pestana, no entanto, disse que o procedimento foi efetivado em total inobservância às normas legais que regem a matéria, atraindo a responsabilidade tanto do médico quanto do hospital.

Citando as exigências do referido artigo, o desembargador constatou que a mulher assinou a autorização para a esterilização no dia em que foi submetida à cesariana, o que é proibido. Além disso, destacou, é pouco provável que ela tenha ficado ciente de todos os riscos e consequências da operação naquele momento, como exige a lei.

Pestana afirmou ainda que a mulher não se enquadrava nas exceções que autorizam, excepcionalmente, a laqueadura, pois não fizera nenhuma cesariana anteriormente — dava à luz seu primogênito.

‘‘Por outra, sequer ficou demonstrado risco à mulher ou ao concepto [feto] a permitir a laqueadura, pois, a despeito de a demandante sofrer de esquizofrenia, não há laudo médico atestando a necessidade de se realizar a ligadura de tubas uterinas’’, complementou. O acórdão foi lavrado na sessão de julgamento do dia 27 de junho.

O caso
A autora contou à Justiça que no dia 20 de janeiro de 2004 chegou ao Hospital Roque Gonzales, no município de Caibaté, para se submeter a uma cesariana. Na ocasião, ela e o marido assinaram o termo de autorização da cirurgia. Decorridos quatro anos do nascimento do primeiro filho, resolveu consultar um médico, porque não conseguia engravidar novamente.

Para chegar à causa do problema, o seu marido foi submetido a vários exames, os quais não apontaram nenhum fator de ordem física. Depois, foi a sua vez de passar por intensa bateria de exames, quando, então, ficou constatado que tinha sido submetida a laqueadura.

A autora saiu de Santa Rosa, sua cidade, e foi até Caibaté, para saber por que tinha sido submetida ao procedimento, já que não o autorizara. Disse que não encontrou, nos documentos disponibilizados pelo hospital, nenhuma autorização formal nesse sentido. Face à irregularidade, resolveu ajuizar Ação de Indenização contra o hospital e o médico que lhe assistiu durante o parto.

Formalmente citado pela 1ª Vara Cível da Comarca de Santa Rosa, o médico apresentou contestação. Afirmou que a indicação para a laqueadura tubária estava na doença psiquiátrica da autora, tanto que ela e seu marido assinaram o termo de responsabilidade. Destacou que a cesariana decorreu de sugestão de psiquiatra, exatamente em decorrência da saúde mental da autora, que se agravara com a gravidez. E mais: a patologia poderia ser transmitida à descendência.

O hospital também se defendeu, alegando que o procedimento cirúrgico foi expressamente autorizado pelo casal. Tanto que repassou à autora cópia dos documentos da autorização de cirurgia e do Termo de Responsabilidade.

A sentença
A juíza Miroslava do Carmo Mendonça, após tecer considerações acerca da legislação consumerista, disse que não ficou comprovada a ocorrência de danos à autora. Além disso, a documentação acostada ao processo mostra claramente que ela e o esposo, efetivamente, autorizaram o procedimento de esterilidade. A alegação de que ambos desconheciam o que estavam assinando — destacou a juíza — não é suficiente para sustentar os pedidos.

‘‘Assim, não tendo a autora trazido aos autos elementos suficientes para provar que o hospital e o médico deram causa ou contribuíram para a situação apresentada na inicial, qual seja, a realização de laqueadura tubária sem autorização, ocasionando-lhe danos morais, danos pela perda de uma chance e danos materiais, e nem mesmo comprovado que o médico agiu de forma negligente, a improcedência dos pedidos é a medida que se impõe’’, encerrou a juíza.

Clique aqui para ler a sentença e aqui para ler o acórdão.