Despacho e ameaças

OAB-DF e juiz discordam sobre violação de prerrogativas

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30 de abril de 2013, 16h52

A seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil deve entrar na tarde desta terça-feira (30/4) com uma série de medidas judiciais e administrativas contra o juiz titular da 8ª Vara Federal de Brasília, Antonio Claudio Macedo da Silva, por abuso de autoridade. A decisão foi tomada, por unanimidade, durante sessão plenária do conselho da OAB-DF nesta segunda (29/4), depois de o juiz representar criminalmente contra o presidente da seccional, Ibaneis Rocha, na quinta-feira (25/4).

O caso teve origem com as reclamações do advogado Guilherme Pupe da Nóbrega em relação ao comportamento do juiz federal que, de acordo com o advogado, se recusou a recebê-lo em audiência, violando assim seu direito de despacho com o magistrado. De acordo com Nóbrega, o juiz exigiu agendamento prévio de uma semana para a audiência, a despeito das justificativas de urgência apresentadas por ele, que informara que o perecimento do direito do cliente ocorreria dali a três dias.

O juiz, por sua vez, relatou que o advogado já havia sido recebido pelo juiz substituto quando ele, o titular, estava de licença médica e que, mesmo assim, Nóbrega exigiu ser atendido imediatamente, chegando a “destratar” a diretora de Secretaria da Vara e ameaçar o juiz titular, “enviando recados de que iria representar contra o juiz se não fosse imediatamente atendido”.

Ao extinguir o pleito do processo sem o exame de mérito, o juiz fundamentou ainda, na própria sentença, acusações contra o advogado, a fim de representar criminalmente contra ele. O juiz federal encaminhou cópia da sentença à Procuradoria da República no Distrito Federal, de modo que servisse como peça de Representação Criminal, dadas “as ameaças endereçadas” a ele pelo advogado. O titular da 8ª Vara determinou também a expedição de ofício à seccional da OAB-DF para apuração de infração ético-disciplinar.

Dostoiévsky, temperança e antecedentes
“Parece desconhecer o causídico princípios básicos de urbanidade e não entender que todo profissional, assim como o advogado, trabalha com uma agenda, e que o magistrado não está à disposição do advogado para atendê-lo várias vezes até que ele obtenha a medida liminar ou outro provimento de urgência”, disse o juiz na sentença.

Citando o escritor russo Fiodor Dostoiévsky e o filósofo francês André Comte-Sponville, o juiz observou que faltou ao advogado a virtude da temperança. “Assim, o comportamento do advogado referido, além de espancar a polidez, ignora solenemente a prudência para atravessar as fronteiras do universo jurídico-penal, perdendo a clareza tão cara a Dostoiévski”, disse. “Indubitavelmente, faltou-lhe um dos frutos do Espírito Santo, qual seja, temperança”.

O juiz Antonio Claudio Macedo da Silva lamentou também ter que receber “recados” de um “jovem advogado”, que desconsiderou os mais de 20 anos de serviço público e ampla experiência acadêmica do titular da vara federal. “Este magistrado é MASTER OF LAWS (LL.M.) pela Universidade de Michigan em Ann Arbor, nos Estados Unidos, e conhece bem o sistema jurídico norte-americano, já fez cursos em diversas escolas judiciais no mundo […] e nunca imaginou receber recados desse naipe de um jovem advogado, como tudo indica do seu número de inscrição na OAB/DF”, argumenta em um dos trechos da sentença.

Frente ao caso, o presidente da OAB-DF, Ibaneis Rocha, expediu ofício ao juiz, comunicando sobre a representação contra ele junto à seccional e solicitando, dessa forma, informações sobre o incidente. Ao receber o ofício, o juiz encaminhou nova representação criminal à Procuradoria da República no Distrito Federal, desta vez contra o próprio presidente da OAB-DF.

“Igualmente serve este ofício para representar criminalmente contra o advogado Ibaneis Rocha […] o qual também surpreendentemente, nesta tarde, enviou ofício notificando uma magistrado federal para prestar informações em procedimento administrativo interno da OAB, sem poder legal e com o inusitado fundamento no art. 18 do Regulamento do Estatuto da OAB”, justifica o juiz no ofício.

Para o presidente da OAB-DF, trata-se de um caso de flagrante violação das prerrogativas dos advogados. “Ele usou um instrumento do Estado para representar contra o advogado. Poderia ter feito de outra forma”, disse Ibaneis Rocha à revista Consultor Jurídico. “Não podemos recuar na defesa das prerrogativas frente a abusos de autoridade como este.”

Entre as medidas a serem adotadas pela seccional estão previstas representação no Conselho Nacional de Justiça e à Corregedoria-Geral da Justiça. Na sexta-feira (26/4), a OAB havia entrado com Mandado de Segurança com pedido de liminar junto ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, visando a suspensão dos atos administrativos contra o advogado e que fossem riscados da sentença os trechos de acusação contra ele.

Já o juiz acusa o advogado e o presidente da OAB de calúnia, ameaça, usurpação de função pública e coação no curso do processo. “ O caso é insolito e surreal”, diz o juiz no ofício encaminhado ao procurador-chefe da Procuradoria da República no DF. “O advogado e o presidente da seccional da OAB arvoraram-se à sucursal da corregedoria do TRF-1, e advogam direito inexistente, qual seja, ser recebido pelo magistrado antes de qualquer decisão! E ainda faltam com a verdade, pois foi o causídico atendido pelo órgão judicante em exercício nesta Vara antes da prestação das informações da autoridade impetrada”, escreveu o juiz.  

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