“Pegadinhas” do silêncio

EUA examinam nuanças do direito do réu de ficar calado

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21 de abril de 2013, 11h35

O réu precisa falar para ter o direito de ficar em silêncio? Essa questão intriga os ministros da Suprema Corte dos EUA, que começaram a examinar o caso de um réu que optou por não responder a uma pergunta em um interrogatório policial. Em vez de simplesmente ficar em silêncio, ele teria de invocar seu direito constitucional de permanecer calado, no entendimento de promotores do Texas, de acordo com o USA Today e a MSNBC

Essa é uma particularidade do caso. Mas há mais. Para obter a condenação do réu, por exemplo, os promotores conseguiram convencer os jurados, no julgamento, que o silêncio do réu era uma prova de sua culpa em um crime de assassinato. Ou equivalia a uma confissão de culpa. 

Teoricamente, isso viola o direito do réu de permanecer calado. Mas Genoveva Salinas não era réu, nem mesmo estava preso quando se recusou a responder uma pergunta de um investigador policial. Era apenas um depoente na delegacia que, em dado momento, pareceu ser tratado como suspeito. 

E aí está o que se pode chamar de "pegadinha" do sistema. O direito de ficar calado, chamado nos EUA de "Miranda rights", só é oferecido ao cidadão em um ato de prisão. No momento da prisão, o policial é obrigado a anunciar ao cidadão que ele tem o direito de ficar calado, de ter um advogado etc. Se a Polícia não está efetuando uma prisão, não precisa anunciar nada. 

Salinas não foi preso. Foi convidado a prestar informações sobre um assassinato na delegacia, depois que os policiais, com mandado judicial, fizeram uma busca em sua casa e encontraram uma arma. Salinas respondeu a todas as perguntas, sem hesitação, até que o investigador quis saber se um exame técnico revelaria que as cápsulas das balas encontradas na cena do crime seriam de sua arma. Salinas percebeu que, para os policiais, ele era realmente um suspeito e, a partir daí, ficou em silêncio. 

Por isso, os policiais nunca recitaram, como de costume em atos de prisão, os direitos de Salinas. Nem ele os reclamou, quando decidiu se calar. E, por essa razão, o estado do Texas e o governo federal defendem que o uso do silêncio do réu contra ele, no julgamento, foi um ato justo. 

A ministra Sontia Soutomayor disse que "assusta pensar que uma pergunta não respondida se torne prova de culpa". A ministra Ruth Bader Ginsburg comentou que um suspeito "astuto" simplesmente invocaria seus direitos constitucionais e seu silêncio estaria protegido durante o julgamento, mas alguém que efetivamente se cala corre risco de condenação. 

"Se formos observar essa diferença, vamos criar uma situação preocupante", ela disse. Mas alguns ministros conservadores parecem não ter qualquer problema com isso, segundo os jornais, porque, para eles, o que vale é a regra de que esse direito só se aplica em atos de prisão. 

No entanto, o advogado de Salinas, Jeffrey Fisher, teve a última palavra. E foi a que pareceu prevalecer, ao final da audiência, segundo as publicações: "O silêncio é um direito, não uma confissão", ele disse aos ministros. "O argumento do estado evoca o sistema inquisitorial de Justiça. Ele transfere, efetivamente, o ônus da prova para o réu".

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