Defesa da Advocacia

"Advogado tem o dever de não delatar o cliente"

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21 de abril de 2013, 8h03

Spacca
O Movimento de Defesa da Advocacia, ou MDA, surgiu em 2002, como forma de protesto e instrumento de defesa dos advogados diante das recorrentes invasões de escritórios pela Polícia Federal. Passados mais de dez anos, a instituição continua sua luta em defesa das prerrogativas profissionais. As frentes de batalha são várias: mais tempo para sustenções orais, não restrição ao Habeas Corpus, defesa dos conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), honorários, processo eletrônico, posição da advocacia nos tribunais em relação ao MP e outras.

O MDA é relativamente pequeno se comparado com a Ordem dos Advogados do Brasil, por exemplo. São cerca de 400 membros e 66 conselheiros. Sua força, porém, está na qualidade de seus quadros: presidentes e ex-presidentes da OAB, de suas comissões e das seccionais e de entidades como o Instituto dos Advogados de São Paulo, a Associação dos Advogados de São Paulo e o Centro de Estudos das Sociedades dos Advogados.

Para o presidente do MDA, Marcelo Knopfelmacher, mais conhecido como "Marcelo K", ao congregar numa única entidade os representantes das diversas áreas de atuação da advocacia, os problemas enfrentados pela classe são compartilhados de maneira rápida e combatidos de modo eficaz.

Uma das principais lutas da entidade é pela inviolabilidade dos departamentos jurídicos das empresas. “Não é porque o advogado é interno que ele não é advogado. Ele também está sujeito ao Estatuto da Advocacia, tem os mesmos direitos, prerrogativas e garantias”, diz.

Em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico, ele detalhou a atuação do MDA e falou sobre questões como honorários, exame de Ordem, lavagem de dinheiro e delação. Sobre esse último tópico, é taxativo: “O advogado tem o dever de não delatar o cliente, sob pena de incorrer na prática de crime previsto pelo artigo 154 do Código Penal, que define a revelação sem justa causa de segredo profissional”.

ConJur — Quando surgiu o MDA?
Marcelo Knopfelmacher — O MDA surgiu em 2002, de uma necessidade momentânea de combater invasões aos escritórios de advocacia. Depois vieram portarias do Ministério da Justiça disciplinando a questão, e a alteração da Lei da Advocacia mencionando isso.

ConJur — Como ele está estruturado?
Marcelo Knopfelmacher — Temos quatro comissões. Prerrogativas, que é a espinha dorsal de toda a entidade representativa da classe dos advogados; Direito Penal; Direito Tributário; e Direito Empresarial. Presidem essas comissões Rodrigo Jorge Moraes (prerrogativas); Fabio Tofic Simantob (Direito Penal); Walter Carlos Cardoso Henrique (Direito Tributário), que é ex-presidente da Comissão de Direito Tributário da Ordem; e o Guilherme Setoguti (Direito Empresarial).

ConJur — Vocês têm quantos associados?
Marcelo Knopfelmacher — Sessenta e seis conselheiros, 400 associados aproximadamente. Estão em alguns dos estados da federação e temos representações nas principais capitais: Rio de Janeiro, Brasília e Porto Alegre. Muitas vezes, [o MDA] funciona no próprio escritório do representante, mas com representação formal nessas localidades.

ConJur — Quando foram as eleições?
Marcelo Knopfelmacher — Dia 27 de fevereiro. Fui reeleito presidente, o Romeu Amaral foi eleito diretor adjunto, Humberto Gouveia foi eleito diretor financeiro, Adriano Salles Vanni, criminalista, o presidente do nosso conselho, Rodrigo Rocha Monteiro de Castro, societário, vice-presidente do conselho. Criamos a figura do conselheiro honorário, aquele que pelas suas próprias ações já fez muito pela advocacia ou já fez muito pelo MDA.

ConJur — Poderia citar alguns?
Marcelo Knopfelmacher — Antonio Cláudio Mariz de Oliveira; Braz Martins Neto; Arystóbulo de Oliveira Freitas; Márcio Kayatt; Eduardo Salusse; Sérgio Rosenthal, que foi primeiro presidente do MDA, atualmente presidente da AASP; Roberto Podval, que foi presidente do conselho do MDA.

ConJur — Muitos ex-presidentes ou da OAB ou da AASP.
Marcelo Knopfelmacher — Atualmente, temos o privilégio de contar no nosso conselho com os presidentes atuais da Aasp, Sérgio Rosenthal; do Iasp, José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro; do Cesa, o Carlos Mateucci; o ex-presidente da Ordem Antonio Cláudio Mariz de Oliveira; e o ex-secretário geral da Ordem, na gestão anterior, Braz Martins. Mateucci também é tesoureiro da atual gestão da Ordem.

ConJur — O que significa ter tantas entidades reunidas no MDA?
Marcelo Knopfelmacher — O MDA é uma entidade que congrega os demais presidentes, portanto, tem uma representatividade muito significativa. Isso faz com que os problemas da advocacia sejam compartilhados de maneira muito rápida e eficaz.

ConJur — Em quais frentes o MDA atua?
Marcelo Knopfelmacher — Estamos trabalhando muito pelo Projeto de Lei que visa equiparar os departamentos jurídicos das empresas aos escritórios de advocacia do ponto de vista da sua inviolabilidade. Não é só o espaço físico que deve ser delimitado dentro das empresas. A gente viu operações da Polícia Federal nas empresas e não havia essa separação do jurídico com as demais áreas. Tivesse havido, não teriam tido o acesso indiscriminado aos computadores dos advogados que estão lá trabalhando. Da mesma forma também não teriam acesso aos computadores dos psiquiatras do RH, que têm contato com informações sigilosas. Também não teriam contato com a parte de assessoria e de relações institucionais, em que o jornalista deveria preservar o sigilo da sua fonte. Por não haver uma delimitação de espaço, houve abusos.

ConJur — Poderia detalhar mais a proposta?
Marcelo Knopfelmacher — O que se propõe é que a mesma inviolabilidade que há para os escritórios de advocacia seja estendida aos departamentos jurídicos devidamente delimitados e também as comunicações entre os advogados internos e os seus constituintes. Não é porque o advogado é interno que ele não é advogado. Ele também está sujeito ao Estatuto da Advocacia, tem os mesmos direitos, prerrogativas e garantias.

ConJur — O advogado de departamento jurídico trata basicamente de Direito Empresarial ou questões conexas. Não são questões criminais. Por que a inviolabilidade desses departamentos? São as questões comerciais que estão em jogo?
Marcelo Knopfelmacher — Há questões de segredo de mercado, portanto de natureza concorrencial. Há também questões de natureza fiscal que muitas vezes podem resvalar em questões de natureza penal. Às vezes essas questões de natureza fiscal podem fragilizar o balanço das empresas com a própria compreensão do valor da empresa.

ConJur — Mas isso não pode trazer um risco de o departamento jurídico das empresas ser utilizado como um biombo para práticas ilícitas?
Marcelo Knopfelmacher — Precisamos fazer uma separação muito clara entre a prática profissional lícita da prática profissional ilícita. Nós não queremos transformar o departamento jurídico nem o escritório de advocacia em um local no qual pode ser escondido o produto do crime. O que se propõe é que haja uma sensibilidade, um cuidado para que naquela área delimitada os mesmos direitos e garantias previstas para o profissional que trabalha fora sejam estendidos ao profissional que trabalha lá dentro, que ele seja visto como profissional e não como um executivo, apesar de muitas vezes acumular as funções. Isso tem que ser visto caso a caso, mas é muito importante haver essa conceituação.

ConJur — O MDA também atua em questões tributárias?
Marcelo Knopfelmacher — O MDA teve uma destacada e muito bem noticiada atuação na defesa intransigente dos conselheiros do Carf. Fomos procurados por inúmeros conselheiros que estavam se sentindo acuados no exercício da sua judicatura administrativa em função daquele posicionamento inicial que a procuradoria da Fazenda Nacional tinha adotado de perseguir cegamente o crédito tributário, sem atentar para a definitividade das decisões proferidas em âmbito do Carf. Isso consta no artigo 45 do decreto 70.235. As decisões do Carf são definitivas em relação a União. Se o particular se sente prejudicado pelas decisões do Carf, ele pode procurar o Judiciário, a União não.

ConJur — As ações populares incluíam o nome pessoal dos conselheiros.
Marcelo Knopfelmacher — Alguns conselheiros do Carf que também são conselheiros do MDA estavam muito desconfortáveis com essa situação. Não podemos transformar a atividade judicante, tanto por parte dos representantes do contribuinte como por parte dos representantes do fisco, em uma atividade de risco.

ConJur — O MDA tem alguma atuação no Tribunal de Impostos e Taxas?
Marcelo Knopfelmacher — Temos no nosso conselho alguns juízes do TIT, da Câmara Superior, e estamos lutando para ampliar o exíguo prazo de cinco minutos para produção de sustentação oral no TIT São Paulo. Vamos propor a alteração do decreto que trata disso, a lei não estabelece o prazo.

ConJur — Como é essa norma?
Marcelo Knopfelmacher — É um decreto. A lei trata do processo administrativo tributário. Ela confere o direito de produzir sustentação oral, mas a regulamentação se deu por decreto e ele fala em cinco minutos. É incompatível com o Estatuto da Ordem e com os regimentos internos de todos os demais tribunais judiciários e administrativos.

ConJur — Qual é o tempo dado nos tribunais?
Marcelo Knopfelmacher — Todos falam em 15 minutos. Fizemos um levantamento. O CNJ tem um prazo de dez minutos para a sustentação oral, mas estamos falando aqui do prazo geral de 15 minutos, que é conferido pelos tribunais de Justiça do país, pelos cinco TRFs, pelo Supremo e pelo STJ.

ConJur — Por que a sustentação no TIT precisa de mais que cinco minutos?
Marcelo Knopfelmacher — Cinco minutos é muito pouco. Os autos de infração contemplam vários itens acusatórios. Muitas vezes é necessário compulsar provas, documentos. São processos volumosíssimos. Não se consegue em cinco minutos nem pedir para um filho arrumar um quarto, que dirá defender os direitos daquele que está sendo acusado e cujo resultado daquela defesa pode inclusive resvalar em um processo criminal.

ConJur — Vocês também atuam no Conselho Municipal de Tributos?
Marcelo Knopfelmacher — O MDA está avaliando a conveniência de fazer um ofício respeitosamente ao Conselho Municipal de Tributos, sugerindo que a marcação dos julgamentos ocorra com maior antecedência. Hoje são só dois dias.

ConJur — E qual seria o prazo adequado?
Marcelo Knopfelmacher — Um prazo de no mínimo uma semana, dez dias corridos, seria justo para que todos possam se organizar.

ConJur — Nesses órgãos administrativos, em caso de empate, a decisão é pelo voto de qualidade. Isso não os torna uma espécie de ficção?
Marcelo Knopfelmacher — Absolutamente não. Os três tribunais, Carf, TIT São Paulo e Conselho Municipal de Tributos, são tribunais em que efetivamente se produz justiça fiscal. Não necessariamente os representantes do Fisco acompanham as posições dos autos de infração. Falo isso por experiência própria, profissional e também institucional.

ConJur — E em relação às punições?
Marcelo Knopfelmacher — No que diz respeito à penalidade, se há empate, não pode ter o voto de qualidade desempatando. Isso consta no Código Tributário Nacional. Na dúvida, sempre em favor do acusado. Mas não podemos estender isso para o imposto, para a contribuição ou para o tributo. No TIT, tem os presidentes ímpares do fisco e as câmaras pares do contribuinte. Pode ter um voto de qualidade vindo de um representante do contribuinte, por exemplo. As coisas têm andado bem. Esses tribunais têm desempenhado um trabalho importante.

ConJur — Em questões tributárias, é comum o Executivo dizer ao ministro do Supremo que aquela causa irá gerar um impacto bilionário no Orçamento. O Fisco está ganhando a queda de braço por causa desses elementos de pressão sobre os julgadores?
Marcelo Knopfelmacher — Os elementos numéricos e os argumentos econômicos sempre foram considerados pelos julgadores de todos os nossos tribunais. Às vezes o tamanho não é exatamente aquele que está expresso nos números, mas é importante ter a dimensão do impacto da causa. Os argumentos econômicos não só podem como devem influenciar um julgamento. Aí entra a necessidade de ter uma racional, razoável e efetiva modulação dos efeitos dessas decisões. Não podemos imaginar que a partir de uma decisão do Supremo tenha-se a falência do governo brasileiro. Há de se reconhecer que aquela norma ou que aquela questão é inconstitucional, que aquela cobrança é inválida perante o ordenamento jurídico, mas há de se reconhecer também um mecanismo justo que permita fazer com que os litigantes sejam ressarcidos pelo recolhimento indevido.

ConJur — O Conselho de Controle da Atividades Financeiras (Coaf) encerrou a polêmica sobre a obrigatoriedade de informar em casos de lavagem?
Marcelo Knopfelmacher — A resolução número 24 esclarece o que já consta da lei e diz o seguinte: os órgãos reguladores próprios tratarão do dever de informar. Para situações em que não houver órgão regulador próprio ou para situações em que o órgão regulador próprio não se pronunciar ou não regulamentar, o Coaf lhes fará as vezes. O Conselho Federal da OAB, respondendo a uma consulta provocada pela seccional de São Paulo, normatizou a questão no sentido de que os advogados não devem se sujeitar ao cadastro, não devem promover o dever de informar. Com estes arcabouços — nova lei de lavagem, a regulamentação do Conselho Federal e a própria resolução do Coaf confirmando aquilo que já está na lei, a questão está encerrada.

ConJur — Se o advogado souber que os valores são ilícitos, quais são os procedimentos que ele deve seguir?
Marcelo Knopfelmacher — Existe um princípio chamado pecunia non olet, dinheiro não tem cheiro. Se o Estado tributa o IPTU do criminoso, se o criminoso paga a escola da criança com dinheiro ilícito, se ele paga assinatura do seu jornal de manhã com produto do dinheiro ilícito, a sociedade não pode se transformar em um órgão de investigação de lavagem de dinheiro. Como é que eu posso afirmar que aqueles valores que o cliente está pagando ao advogado têm origem ilícita? Isso é a consagração de um Estado de terror, ninguém trabalha. A questão dos honorários está de ligada à incompreensão sobre a atividade. O médico sabe que a pessoa tem problemas de saúde, mas vai deixar de receber os seus honorários por ter feito uma cirurgia no acusado de ser o grande praticante de atividade ilícita? O resort onde se hospeda o acusado da prática da atividade ilícita está praticando lavagem ao aceitar aquela reserva? Como é que ficam essas questões?

ConJur — Mas a sociedade não tem obrigação de coibir quando sabe da existência de crimes de corrupção e de lavagem de lavagem de dinheiro?
Marcelo Knopfelmacher — A sociedade tem o dever de vigilância e o dever de informar aos órgãos competentes que vão fazer essa apuração. No caso da advocacia muitas pessoas são tratadas em uma relação de confiança. São segredos que o advogado vai levar para o túmulo. O advogado não tem o dever de delatar o cliente. Ele tem o dever de não delatar o cliente, sob pena de incorrer na prática de crime previsto pelo artigo 154 do Código Penal, que define a revelação sem justa causa de segredo profissional. O jornalista em relação à sua fonte também tem seus direitos assegurados. Isso está previsto pela Constituição, uma grande conquista de uma sociedade democrática. O advogado funciona como porta voz de alguém, assim como a imprensa. Nós somos, como diz o doutor Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, “boqueiros”, nós falamos em nome dos outros, nós não falamos em nome próprio. Aquilo que nos é confiado em segredo profissional deve ser mantido como tal.

ConJur — Quais são as outras bandeiras do MDA?
Marcelo Knopfelmacher — Nós tomamos a frente na questão da pretensão de abolição do Habeas Corpus substitutivo de Recurso Ordinário. No dia 17 de setembro de 2012 oficiamos o então presidente do Supremo, ministro Ayres Britto. Depois levamos cópia do nosso ofício a todos os demais ministros, manifestando a nossa grande preocupação em decisões até então na 1ª Turma, no sentido de abolir ou restringir o uso do Habeas Corpus.

ConJur — E que avaliação o MDA faz dessa questão do HC?
Marcelo Knopfelmacher — O Supremo volta a admitir o uso do Habeas Corpus substitutivo, que de certa forma foi um alento, mas a gente continua vigilante. O Habeas Corpus não é uma conquista da advocacia, mas da cidadania. Qualquer pessoa pode impetrar um Habeas Corpus, não precisa ser advogado. É um instrumento que nos resguarda, que nos traz liberdade. Quem viveu a época da ditadura, não é o nosso caso, nos conta que, com a abolição do Habeas Corpus, nós estávamos vivendo uma época de barbárie, tempos sombrios que não queremos nem rememorar.

ConJur —Há de fato então uma restrição ao uso do Habeas Corpus?
Marcelo Knopfelmacher — Procurou-se criar uma vedação ao uso do Habeas Corpus substitutivo de Recurso Ordinário, mas a jurisprudência do Supremo está sendo revista para permitir novamente o uso do Habeas Corpus substitutivo de recurso ordinário.

ConJur — Como vocês veêm a discussão quanto à posição que os advogados ocupam nos tribunais em relação ao MP?
Marcelo Knopfelmacher — Fomos admitidos como amicus curiae na reclamação proposta por um juiz federal de São Paulo, em que questiona com toda razão o assento do Ministério Público nas audiências criminais. Nas causas de natureza criminal ou nas causas em que o Ministério Público figura como parte e não como custos legis, não portanto como fiscal da lei, o Ministério Público deve ocupar o mesmo patamar físico que os advogados. A expressão parquet significa tablado em francês. Na França os membros da Promotoria sempre falavam a partir de um tablado, que era abaixo da bancada dos juízes, mas isso já os diferenciava.

ConJur — Por que essa questão é importante?
Marcelo Knopfelmacher — É fundamental que se tenha uma verdadeira paridade de armas. Quando uma testemunha entra em uma audiência e verifica a figura do juiz ao lado do promotor, sentados na mesma bancada, automaticamente se sente muito intimidada quando perguntada por essa autoridade. Pode influenciar um julgamento.

ConJur — A ideia dessa reclamação é colocar o promotor na tribuna junto com o advogado ou de dar assento para o advogado ao lado do juiz?
Marcelo Knopfelmacher — Tem algumas propostas: ou se fazer um “U”, ou se fazer um “T”. No “T” o magistrado estaria em cima, e o advogado e o promotor frente a frente.

ConJur — Como funciona nos tribunais dos Estados Unidos?
Marcelo Knopfelmacher — Sim. No “U” há também o magistrado no centro, e o advogado e o promotor também frente a frente, no mesmo nível. A advocacia não pode estar simbolicamente em um patamar menor ou menos significativo do que o órgão acusador. Isso é injusto.

ConJur — Quem mais está como interessado?
Marcelo Knopfelmacher — A Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais, a Defensoria Pública da União, o Conselho Federal da Ordem. Além disso, também estamos atuando na questão da tramitação direta dos inquéritos entra a Polícia Federal e o Ministério Público.

ConJur — Por que essa questão é importante?
Marcelo Knopfelmacher — A Resolução 63 [do Conselho de Justiça Federal], a pretexto de tornar mais célere o inquérito, acaba por banalizar os prazos para a conclusão dos inquéritos policiais. Na Justiça Estadual, são dez dias para acusados presos, 30 dias para soltos. Na Federal, 15 dias prorrogáveis por igual período, o que acarreta grave violação dos direitos e garantias do investigado, das prerrogativas dos advogados, da polícia judiciária e o próprio Poder Judiciário, que se pretende agora que permaneça alheio ao controle e trâmite dos inquéritos policiais, sendo chamado a manifestar-se somente em casos excepcionais.

ConJur — Alguns juízes continuam se negando a receber advogados, apesar da determinação do Estatuto da OAB. Já outros, como o ministro Joaquim Barbosa, por exemplo, dizem só receber se a outra parte também esteja. Como o senhor vê essas restrições?
Marcelo Knopfelmacher — Isso ainda lamentavelmente acontece, inclusive no estado de São Paulo. Temos recebido reclamações na nossa Comissão de Prerrogativas. Existe muita incompreensão e intolerância com a atividade do advogado. O advogado é visto como um mal necessário, e isso é ruim. Quanto a atender o advogado junto com a outra parte, não vejo grandes problemas, desde que isso não impeça o próprio exercício profissional. Se a situação for de urgência, deve estar dispensada a presença da contraparte, mas se não houver essa necessidade e puder ter um agendamento, não vejo isso como uma restrição indevida. Acho até salutar.

ConJur — Vocês brigaram muito por causa do horário de atendimento no fórum central aqui no TJ de São Paulo. Essa história acabou?
Marcelo Knopfelmacher — Essa história não acabou, e está sendo encampada mais diretamente pela Ordem de São Paulo, pela Aasp e pelo Iasp. Nós deliberamos por aguardar. Estamos nos sentido representados pelas demais entidades nessa questão.

ConJur — Qual sua opinião sobre isso?
Marcelo Knopfelmacher — Se há um funcionário dentro das repartições públicas, um servidor, nos termos do artigo 7º, inciso VI, alínea "c" do Estatuto da Advocacia, é garantido ao advogado ingressar livremente em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado deva praticar ato ou colher prova, ou informação útil ao exercício da atividade profissional. Se há funcionários trabalhando, necessariamente o advogado tem que ser atendido.

ConJur — Temos um CPC que fala de uma margem de 10% a 20% do valor da condenação como honorário para advogado, mas esse limite não é respeitado. Em que uma nova proposta para o CPC pode resolver esse problema?
Marcelo Knopfelmacher — Está-se querendo consagrar o desrespeito. As pessoas têm muito preconceito em relação a essa questão de honorários. Os honorários representam a remuneração do profissional. Se ele contribuiu para o resultado, é justo que o juiz arbitre entre 10% e 20% do valor da condenação. O que se vê, lamentavelmente, é que em causas de altíssima complexidade, em que o profissional teve de levar o caso até as mais altas instâncias, os honorários são fixados em valores irrisórios. Uma causa de R$ 10 milhões, ou de R$ 5 milhões pode ensejar honorários de R$ 2 mil. É uma questão de proporcionalidade. Estamos atuando no Congresso Nacional para fazer valer a aplicação da verba honorária mínima. Isso é uma questão de dignidade.

ConJur — Mesmo em questões tributárias em que a Fazenda Pública sofreria um impacto bilionário?
Marcelo Knopfelmacher — Os casos que geram impacto bilionário normalmente são causas cujo valor da causa é baixo. Mil reais. Dois mil reais. Tem que ter uma regra geral, e ela deve ser cumprida. Se tiver uma exceção, vamos tratá-la como tal.

ConJur — Nos últimos anos, houve um boom nos cursos superiores, especialmente nos de Direito. Isso refletiu na qualidade da formação?
Marcelo Knopfelmacher — Essa questão nos remete, necessariamente, à questão do exame de Ordem. A advocacia é uma das carreiras que ainda tem esse exame, e ainda bem que o tem, porque funciona como um filtro. Em todas as demais carreiras jurídicas é necessário fazer um exame, um concurso público rigoroso com tantas provas, com tantos certames, com tantas exigências, e para advogar se discute tanto sobre a necessidade do exame de Ordem. A advocacia é uma carreira jurídica tão importante quanto às demais. Quem defende o fim do exame de Ordem deveria defender também o fim dos concursos públicos.

ConJur — O exame de Ordem é equivalente a um concurso público?
Marcelo Knopfelmacher — Ele faz as vezes. Talvez não seja tão rigoroso quanto um concurso público, mas deveria ser o mais rigoroso possível dentro de uma intenção de trazer as pessoas para a profissão, e não de afastar. Temos que trazer as pessoas que têm preparo.

ConJur — A proposta do novo CPC diminui a possibilidade de recursos. O advogado e o excesso de recursos são realmente os culpados pela morosidade?
Marcelo Knopfelmacher — Não há multiplicidade de recursos. Pode haver um mau uso, e existe uma carência tanto de recursos como de infraestrutura como de pessoal no Poder Judiciário. “Justiça tardia não é Justiça, senão injustiça qualificada”, já dizia Rui Barbosa. Justiça rápida demais é irresponsabilidade. Tem que ter um meio termo. Se realmente configurada a prática de reiteração desnecessária, isso pode ser combatido com imposição de multas e sanções processuais. Muitas vezes, o Judiciário, amparado em uma interpretação de que tal matéria já foi objeto de Recurso Repetitivo ou de alguma decisão final das cortes superiores, acaba em uma interpretação equivocada decidindo outros casos sob o manto daquilo que já está decidido, quando na verdade é uma causa nova.

ConJur — Os institutos da Repercussão Geral e dos Recursos Repetitivos são bem aplicados pelos tribunais?
Marcelo Knopfelmacher — Há casos em que acontece má aplicação, e há casos em que realmente é necessário ter a aplicação desses filtros, porque o volume é muito grande. Mas os erros são muito difíceis de serem reparados. Tudo cai sob o manto do assunto, quando o mesmo assunto pode ser encaminhado por diversos pontos de vista.

ConJur — Acabaram-se as grandes teses tributárias?
Marcelo Knopfelmacher — Tese é uma discussão, debate, e debate nunca vai acabar. Mas as teses massificadas praticamente acabaram. Hoje prevalecem as questões pontuais.

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