Estabilidade necessária

Deixem a parte geral do Código Penal como está

Autor

  • Alaor Leite

    é professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (Portugal) doutor e mestre pela Ludwig-Maximilians Universität de Munique (Alemanha).

19 de abril de 2013, 7h00

Depois das críticas que recebeu,[1] a comissão de reforma do Código Penal (PLS 236/2012) resolveu, em 28 de novembro de 2012[2], sobrestar o prazo para a entrega do relatório final. Uma manifestação que fez conferenciar prudência e humildade, indicando que, pela primeira vez nesse movimento reformador, legislador e ciência falavam o mesmo idioma, fato de que todos que acompanham a reforma, corretamente, já começavam a duvidar. Sobrestaram. Não arquivaram. Na vida e nos processos legislativos, vez por outra, dá-se um passo atrás para, após, avançar. O movimento reformador segue seu curso, já sem a afobação vertiginosa de outrora, mas, ingenuidades à parte, ainda ambicionando virar lei vigente neste país. Enquanto o PLS 236/2012 tramitar, a crítica científica deve manter-se atenta e ativa.

“A crítica apontou açodamento; a comissão sobrestou o prazo. A crítica indicou a inexistência de diálogo entre ciência e legislador; a comissão agendou formalmente uma série de audiência públicas, nas quais tomam parte juristas ligados à ciência jurídico-penal. De que mais poderia, então, reclamar a crítica científica?”, afirmaria em tom de perplexidade um personagem fictício cujo nome pode ser, na falta de outro, legislador.

De fato, o refrear da pressa legislativa, que não era apenas um problema de forma, mas afetava sobremaneira o conteúdo do projeto de Código Penal, bem como a boa intenção em ouvir e debater com juristas que haviam sido ignorados em um primeiro momento demonstram um fato relevante: o legislador reconheceu alguns equívocos anteriores, o que não pode receber outra manifestação senão a de aplauso. A disposição que o senador Pedro Taques, ex-membro do Ministério Público Federal e conhecedor da matéria jurídica, demonstrou em ouvir as críticas ásperas que fizeram especialmente Miguel Reale Júnior e Juarez Cirino dos Santos[3] é também louvável, e se contrapõe à humildade antes apenas propagada pela comissão, mas pouco demonstrada. É louvável, igualmente, que tenham sido aprovadas, na última reunião (9 de abril de 2013)[4], as convocações de vários outros juristas para comparecerem ao Senado Federal, entre eles, por exemplo, Juarez Tavares.

Se o formato das audiências públicas realmente é adequado, se as críticas efetivamente serão levadas em consideração, são assuntos para outra oportunidade. Mas a disposição em ouvir de um legislador antes inacessível e afoito é, induvidosamente, um alento. Um alento que indica que esse é o momento correto de fazer, também humildemente, um pedido. Nem apelo apaixonado, nem brado sem fundamento, mas sim um pedido verdadeiramente legítimo —isto é, sem excessos retóricos ou berros de palanque—, fundado em razões jurídicas:

O sentido da parte geral do código penal: estabilidade como fundamento
A palavra de ordem deste movimento reformador é a consolidação das leis penais. Tudo o que anda perdido pelo mar das leis esparsas deve encontrar guarida na terra firme do Código, e a isso dá-se o nome de princípio da codificação. As razões são, fundamentalmente, a segurança jurídica alcançada ao submeter todos os crimes em espécie ao mesmo sistema, cujos contornos são conferidos pelo que se chama de parte geral do Código Penal e o oferecimento de um catálogo que englobe todos os fatos puníveis no país, a fim de que os cidadãos possam orientar de forma geral os seus comportamentos.

De outro lado, ouve-se muito a ideia de que é necessário adaptar a legislação penal aos novos tempos. Os tempos mudaram, todos sabem e ninguém duvida. Será essa ideia de adaptação, no entanto, aplicável também à parte geral, à alma de um código? Não, é a resposta[5]. Quero me concentrar, neste texto, essencialmente na parte referida à teoria do crime, deixando de lado, por ora, a parte referida às penas e medidas de segurança, que também compõe formalmente a parte geral do Código, mas que está inegavelmente mais sujeita às alterações circunstanciais e aos estudos empíricos e criminológicos[6].

O sentido da parte geral repousa, precisamente, em sua estabilidade, e não em sua constante alteração. O legislador não deve criar conceitos “modernos” e nem resolver dilemas dogmáticos na parte geral do Código Penal. Neste ponto, há, por parte do movimento reformador, uma má compreensão da relação entre legislador, ciência e jurisprudência. A parte geral, com a sua estrutura sistemática e com enunciação das categorias jurídicas básicas que formam a aplicação da Lei Penal, as formas de imputação do crime e a determinação da aplicação judicial da pena é justamente o instrumento que serve à “adaptação” de eventuais inadequações e dilemas dos delitos em espécie, e isso por meio dos estudos científicos e das decisões judiciais, e não por meio de alterações legislativas. A estrutura da parte geral é instrumento contínuo de adaptação e não deve ser objeto, evidentemente, ela própria, de adaptações periódicas e circunstanciais. A estabilidade é, aqui, uma garantia de todos os cidadãos[7].

Nossa parte geral não é antiquada e imprestável e sequer está em descompasso completo com o que há no resto do mundo em matéria de teoria do crime. O discurso de que temos um código editado no Estado Novo, em 1940, serve apenas em relação à parte especial, já que nossa parte geral foi objeto de reforma em 1984, no contexto de redemocratização de nosso país. Se o reformador daquele tempo resolveu manter a estrutura do legislador de 1940 quanto às formas de imputação do crime, o fez conscientemente, especialmente motivado pela ideia de que, no que se refere à parte geral, é preciso manter a estabilidade e mudar apenas diante de comprovados equívocos, com a mais extrema parcimônia. Não é crível que a atual comissão partilhe da ideia de que, a cada nova teoria sobre o dolo, sobre a autoria, deve, então, o legislador alterar a parte geral de um código.

Há, sim, dilemas dogmáticos tormentosos, como a distinção entre dolo eventual e culpa consciente nos delitos de trânsito, mas um rabisco invencionista e desvinculado da discussão científica contemporânea certamente apenas agravará a situação. É papel da ciência e da jurisprudência resolver esses dilemas. Desconfio, com a toda a sinceridade, de que por trás de todas as inovações propostas pelo PLS 236/2012 na parte geral há um afã inventivo, fundado mais em razões estéticas do que em razões materiais, e tentei, junto com outros juristas, demonstrar esse fato, ponto por ponto, em outros trabalhos[8]. Um exemplo desse aspecto estético: todas as tentativas de recepção de teorias germânicas estão flagrantemente equivocadas[9].

“Alterar é fácil, corrigir efetiva e completamente, difícil”, afirmou certa vez o consagrado teórico do direito austríaco Franz Bydlinski ao esboçar uma teoria da legislação.[10] Um erro do legislador na parte especial do Código Penal é grave. Um erro na parte geral é, todavia, ainda mais grave, pois se multiplica em progressão geométrica e espalha seus efeitos por todo o Código e, portanto, por todos os tipos penais da parte especial. O cuidado deve, portanto, ser aumentado na mesma progressão. Os equívocos da parte especial são, além disso, objeto de constante controle de constitucionalidade, tanto pelos magistrados e tribunais, como pelo Supremo Tribunal Federal (ver, por exemplo, interpretação conforme à Constituição que o STF conferiu ao delito de apologia ao crime previsto no artigo 287 do Código Penal no julgamento da ADPF 187)[11].

Jamais veremos, no entanto, uma declaração de inconstitucionalidade do conceito de dolo ou de autor oferecido pelo legislador na parte geral do Código Penal. Os erros, aqui, uma vez postos, perdurarão, serão lei vigente a que estarão submetidos os juízes e cidadãos. As normas da parte geral de um código destinam-se, em primeiro lugar, aos seus aplicadores, aos juízes, e não aos cidadãos, e por isso o cuidado técnico deve ser redobrado. As normas da parte especial, os delitos em espécie, destinam-se também aos cidadãos que devem poder compreender as condutas proibidas e utilizar a Lei Penal como um instrumento geral de orientação de comportamento. “Consolidar” a legislação penal é um termo que só faz sentido se referido aos crimes em espécie, já que nesse caso ocorre, sim, uma facilitação real na orientação de comportamentos dos cidadãos[12].

Espero que não tenhamos de assistir ao vergonhoso espetáculo em que a parte geral do Código Penal transformar-se-á em uma espécie de súmula qualificada, editada para viver um certo tempo, mas não muito. Afinal, os tempos mudam. Será o dia, então, em que a lei temporária será o protótipo de lei em matéria penal, e o seu termo final será sempre uma surpresa. Mal-aventurada a próxima geração de penalistas se isto acontecer. Se as forças políticas realmente indicarem a inevitabilidade da reforma do Código Penal, que ao menos limitem o objeto da reforma à parte especial, em consonância com o sentido consolidador que a move. Reformar a parte geral do Código Penal não é consolidar, é começar do zero[13]. Um resultado muito diverso daquele que a própria comissão de juristas reformadores afirma querer alcançar.

Um pedido
Dessa vez, o texto, além do diagnóstico e da crítica, contém, como dito, um pedido direcionado aos membros da comissão reformadora e ao relator no Senado Federal, senador Pedro Taques, para que aquilo que constitui o requisito mínimo para que continue a existir um direito penal como ciência em nosso país —a parte geral do Código Penal, mais especificamente a parte relativa à teoria do crime— não seja alterado. A estabilidade da parte geral de um Código Penal revela-se como genuíno mínimo existencial de nossa ciência, cujo fim último é, sempre, exigir razão de um poder que tende ao excesso e reclamar o respeito ao direito de todos os cidadãos.

Sem a garantia de mínima estabilidade da parte geral do Código, não há perspectiva de que esse fim possa ser alcançado. Como desenvolver critérios científicos sólidos que sirvam àqueles que têm de decidir os casos penais diante de um legislador que, diante da próxima mudança circunstancial  —e sempre mudam as circunstâncias, a isso se dá popularmente o nome de vida—, responde com uma alteração justamente na alma de nosso Código, naquilo que por definição deve possuir perenidade, estabilidade? Teremos, talvez, de reviver, já em outro contexto, o pesadelo de acre sabor que von Kirchmann lançou aos juristas ao desconfiar da cientificidade do Direito e dizer: “três palavras retificadoras do legislador, e bibliotecas inteiras se transformam em papel velho”[14]. Se von Kirchmann conhecesse nosso legislador —o personagem fictício que mencionei acima— talvez fosse mais longe e dissesse que também a parte geral de um código pode se transformar, de repente, em papel velho.

“Exercer a crítica afigura-se a alguns que é uma fácil tarefa, como a outros parece igualmente fácil a tarefa do legislador”[15]. Nem um, nem outro. Ambas são tarefas complicadas e que demandam a mais alta responsabilidade dos envolvidos. Todos aqueles que compõem a comissão de reforma do Código Penal instalada no Senado Federal e presidida pelo senador Pedro Taques possuem legitimidade democrática para elaborar um novo Código Penal e é igualmente certo que o legislador possui grande margem de avaliação em relação às complexas decisões que resolve tomar. As canetas dos membros da comissão assinam legitimamente, mas os equívocos vigem em face de todos e as palavras mal redigidas encarceram. A caneta da ciência não possui tinta oficial e não assina em papel timbrado. Nossas razões não têm força de lei e nem sequer há a garantia de que seremos lidos. A nós, da ciência, não resta outra coisa, senão pedir, fundados sobriamente em boas razões jurídicas: deixem a parte geral do código penal como está[16].


[1] Ver o número especial da Revista Liberdades, integralmente dedicado ao PLS 236/2102: Revista Liberdades – Edição Especial – Reforma do Código Penal, 2012, http://www.ibccrim.org.br/upload/noticias/pdf/revista_especial.pdf, em que escreveram Luís Greco (p. 35 e ss.), Paulo Busato (p. 98 e ss.), Alaor Leite (p. 59 e ss.) e Gustavo Quandt (p. 8 e ss.), analisando detalhadamente os aspectos da parte geral do projeto de novo código; ver também as entrevistas de Cirino dos Santos, “Somos o país que mais pune no mundo”, publicada no jornal Folha de Londrina, de 15.7.2012, p. 3; Reale Jr., “Novo Código Penal é obscenidade, não tem conserto”, in: http://www.conjur.com.br/2012-set-02/entrevista-miguel-reale-junior-decano-faculdade-direito-usp e Miranda Coutinho/Rocha de Carvalho, “Há vícios de origem”, in: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/512777-reforma-do-codigo-penal-ha-vicios-de-origem-entrevista-especial-com-jacinto-coutinho-e-edward-rocha-de-carvalho; artigos mais curtos em Luís Greco, O projeto de lei do Código Penal e sua retórica, 2012, in: http://www.conjur.com.br/2012-set-14/luis-greco-projeto-lei-codigo-penal-retorica e Alaor Leite, Formalismo, democracia e cinismo na reforma penal, 2012, in: http://www.conjur.com.br/2012-out-18/alaor-leite-formalismo-democracia-cinismo-reforma-codigo-penal; há manifesto do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), do Instituto Manoel Pedro Pimentel (USP) e do Instituto Transdisciplinar de Estudos Criminais (ITEC) sobre a Reforma do Código Penal, em: http://www.ibccrim.org.br/site/manifesto/manifesto2012.php?acao&manForm; há igualmente os estudos coletados na Revista da EMERJ vol. 15 nº 60 (2012), que reproduzem o conteúdo do Seminário Crítica da Reforma Penal, promovido pela Escola da Magistratura do Rio de Janeiro (EMERJ) nos dias 11-13 de setembro de 2012, com manifestações de, entre outros, de Juarez Tavares (Projeto de Código Penal. A reforma da parte geral, p. 161 e ss.), de Juarez Cirino dos Santos (A ideologia da reforma penal, p. 13 e ss.) e de Salo de Carvalho (Em defesa da lei de responsabilidade político-criminal: o caso do Anteprojeto de Código Penal, p. 156 e ss.); mais recentemente, Cirino dos Santos, A reforma penal: crítica da disciplina legal do crime, in: Tribuna Virtual IBCCrim 1 (2013), p. 27 e ss., um exaustivo diagnóstico e uma impactante análise crítica sobre as imperfeições da parte geral proposta pelo PLS 236/236 e Dotti, Reforma penal: codificação ou consolidação?, in: Tribuna Virtual IBCCrim 1 (2013), p. 23 e ss. Um único respeitado jurista, Lênio Streck, no entanto, em manifestação oral excessivamente otimista concedida à “TvTaques” – canal do Senador Pedro Taques no YouTube, relator da comissão do Senado –, viu mais méritos do que defeitos no PLS 236/2012: http://www.youtube.com/watch?v=IwK0YZW61TY.

[2] Segundo informa o site do Senado Federal: http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?tab=t&p_cod_mate=106404.

[3] As duas manifestações proferidas no Senado Federal estão disponíveis na internet. Manifestação de Miguel Reale Júnior: http://www.youtube.com/watch?v=At2JRWKIXOI; resposta à manifestação de Miguel Reale Júnior realizada pelo relator da comissão de juristas, Luiz Carlos dos Santos Gonçalves: http://www.youtube.com/watch?v=2cCPIGpf4d0; manifestação de Juarez Cirino dos Santos: http://www.youtube.com/watch?v=uc5eternEik.

[4] Como atesta a aprovação do requerimento n. 009/13, apreciado na 9a reunião da comissão de reforma do código penal. A aprovação consta das folhas n. 1696 dos autos em que tramita o PLS 236/2012. Os andamentos estão disponíveis no site do Senado Federal em: http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=125653&tp=1. Ver também as palavras do próprio Senador Pedro Taques: “Com a realização da audiência pública com a presença do Dr. Miguel Reale Júnior e do Dr. Luiz Carlos Gonçalves dos Santos iniciamos um trabalho de expor o texto da proposição a críticas e também a sugestões de especialistas para o necessário aprimoramento do PLS 236, de 2012. O objetivo é colher diversas manifestações sobre o assunto no intuito de subsidiar a pretendida renovação do arcabouço jurídico penal brasileiro, originário de um momento social que já não se coaduna com nossa realidade“ (folhas n. 1700 e s. dos autos em que tramita o PLS 236/2012, disponível no link acima).

[5] Sobre as alterações realizadas na parte geral ver os estudos já citados acima no numero especial da Revista Liberdades e os estudos de Juarez Tavares, Projeto de Código Penal. A reforma da parte geral, Revista da EMERJ vol. 15 nº 60 (2012), p. 161 e ss. e Cirino dos Santos, A reforma penal: crítica da disciplina legal do crime, in: Tribuna Virtual IBCCrim 1 (2013), p. 27 e ss.

[6] Essa limitação do objeto revela-se necessária, na medida em que a parte relativa às penas está, sem dúvida, mais suscetível aos estudos empíricos que revelam uma necessidade de reforma, e a minha critica refere-se essencialmente à estabilidade conceitual que devem possuir as categorias que determinam a imputação do crime, a chamada teoria do crime. Ver sobre a necessidade de estudos empíricos prévios a qualquer alteração no sistema de penas o trabalho de Salo de Carvalho, Em defesa da lei de responsabilidade político-criminal: o caso do Anteprojeto de Código Penal, Revista da EMERJ vol. 15 nº 60 (2012), p. 156 e ss.

[7] Assim a postura de Wunderlich, apresentada no Seminário da UERJ sobre a reforma penal: “ (…) não somos avessos às mudanças, mas sim a atentados contra a estrutura do Direito Penal“, Wunderlich, Organizações Criminosas: o novo tipo de milícia, Revista da EMERJ vol. 15 nº 60 (2012), p. 229.

[8] Ver os artigos já citados, em que foram analisados todos os aspectos da parte geral proposta no PLS 236/2012, que comprovam tecnicamente o que se está aqui a dizer de forma mais sintética.

[9] Ver nota acima.

[10] Bydlinski, Juristische Methodenlehre und Rechtsbegriff, 2a ed., 1991, Viena/Nova Iorque, p. 639.

[11] STF, ADPF 187, Min. Celso de Mello, Plenário, DJe n. 121, publicado em 27/06/2011: “O Tribunal, por unanimidade, rejeitou as preliminares de não-conhecimento da argüição e a de ampliação do objeto da demanda. No mérito, também por unanimidade, o Tribunal julgou procedente a argüição de descumprimento de preceito fundamental, para dar, ao artigo 287 do Código Penal, com efeito vinculante, interpretação conforme à Constituição, ´de forma a excluir qualquer exegese que possa ensejar a criminalização da defesa da legalização das drogas, ou de qualquer substância entorpecente específica, inclusive através de manifestações e eventos públicos´, tudo nos termos do voto do Relator“.

[12] Precisamente esse cuidado na redação dos tipos penais não foi levado em conta nesta reforma. Em detalhes, Alaor Leite, Erro, causas de justificação e causas de exculpação no novo projeto de código penal (projeto de lei 236 /2012 do Senado Federal), Revista Liberdades – Edição Especial – Reforma do Código Penal, 2012, p. 59 e ss., p. 62 e ss. Ver também Geraldo Prado, A relação entre Direito Penal e Processo Penal no Projeto do novo Código Penal. Considerações gerais, Revista da EMERJ vol. 15 nº 60 (2012), p. 251 e ss., que considera esse aspecto “óbvio” e alerta: “Porém, o óbvio não foi considerado na tarefa de elaboração do Projeto. Sem saber interpretar o comando, sem poder atribuir significado ao ‘código’, em tema tão delicado como o da liberdade, como o agente poderá orientar a sua ação?“ (p. 255).

[13] Recordo que me refiro essencialmente à parte dedicada à teoria do crime.

[14] von Kirchmann, Die Wertlosigkeit der Jurisprudenz als Wissenschaft, Berlin, 1848, p. 17

[15] Assim abre Machado de Assis seu texto intitulado “O ideal do crítico”, publicado originalmente no Diário do Rio de Janeiro, em 8 de outubro de 1865, e republicado na coletânea “O jornal e o livro”, São Paulo, 2011, p. 7.

[16] Já havia, ainda timidamente, indicado esse caminho em Alaor Leite, Formalismo, democracia e cinismo na reforma penal, 2012, in: http://www.conjur.com.br/2012-out-18/alaor-leite-formalismo-democracia-cinismo-reforma-codigo-penal: “A humildade da comissão poderia ser demonstrada ao se abster em alterar ao menos a parte geral de nosso Código“.

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