Não à impunidade

Dez razões que justificam a investigação pelo MP

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15 de abril de 2013, 16h21

Na contramão do processo de amadurecimento da nossa jovem democracia e de fortalecimento das nossas instituições republicanas, um grupo de deputados e senadores tenta acrescentar à Constituição Federal um dispositivo que limitará a atuação do Ministério Público no combate à criminalidade, impedindo promotores e procuradores da República de investigar crimes.

A Proposta de Emenda Constitucional 37/2011, apelidada de “PEC da impunidade”, já foi aprovada por uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados e agora será submetida ao Plenário daquela Casa antes de seguir para o Senado. A vingar a ideia, criminosos de colarinho branco e políticos corruptos terão muito que comemorar, pois estarão blindados contra a atuação dos profissionais que recentemente fizeram vir à tona inúmeros escândalos em que os pivôs eram altas autoridades da República e que por isso mesmo, estavam praticamente imunes à ação das polícias.

Diante do risco de aprovação da tal proposta, o Ministério Público, a imprensa e diversas entidades da sociedade civil têm procurado esclarecer a sociedade sobre alguns relevantes aspectos que envolvem o tema, dentre os quais merecem destaque:

1 – Em nosso modelo constitucional, o Ministério Público é o fiscal e o defensor da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. É ilógico pretender que alguém fiscalize sem investigar.

2 – O Ministério Público brasileiro não quer substituir as polícias na investigação criminal. Em regra, os crimes devem ser investigados pela Polícia, cabendo ao Ministério Público o controle externo dessa atividade e a requisição de diligências que considerar importantes para que o processo criminal seja iniciado com maiores chances de êxito.

3 – A Polícia Federal e as polícias civis integram a estrutura do Poder Executivo e os delegados de Polícia não estão garantidos com a vitaliciedade e a inamovibilidade conferidas aos membros do Ministério Público. Se, na maioria dos casos, essa realidade não tem relevância, o mesmo não pode ser dito quando os suspeitos são autoridades públicas, criminosos com influência sobre o poder político ou policiais.

4 – Em nenhum país desenvolvido, o Ministério Público é impedido de investigar. Pelo que se tem notícia, apenas na Indonésia, na Uganda e no Quênia existe exclusividade da Polícia na apuração de crimes. Em países como Alemanha, França, Itália e Portugal, a Polícia investiga sob a direção e a coordenação do Ministério Público.

5 – Há uma tendência mundial de aumentar o número de entidades autorizadas a investigar atos ilícitos. No Brasil, a lei autoriza investigações dirigidas pelo Poder Judiciário, tribunais de Contas, Receita Federal, Banco Central, polícias, CPI’s, Ibama, Ministério Público etc. Quanto maior o número de entidades autorizadas a fiscalizar, pior para os criminosos e melhor para a sociedade.

6 – A PEC 37/2011 é incompatível com o propósito de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. A participação de autoridades independentes na investigação criminal é prevista na Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), na Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Convenção de Mérida), no Estatuto de Roma (Tribunal Penal Internacional) etc.

7 – Ao contrário do que afirmam os idealizadores da PEC, a lei já autoriza o Ministério Público a realizar atos de investigação criminal, como requisitar e ouvir testemunhas, requisitar documentos e perícias, realizar inspeções etc. (artigos 7º e 8º da LC 75/93, artigos 26 e 27 da Lei 8.625/93, artigo 47 do CPP etc.). Para dar maior segurança e objetividade aos procedimentos investigativos, o Conselho Nacional do Ministério Público regulamentou a matéria com a Resolução 13/2006.

8 – A aprovação da PEC distanciará o Ministério Público da sociedade, dificultará o acesso das pessoas à Justiça e burocratizará a apuração de crimes. Não é incomum que pessoas do povo demandem o Ministério Público para apresentar provas de crimes ou relatar uma situação que exige intervenção urgente do Estado, a exemplo da prisão preventiva de um criminoso e do deferimento de uma medida protetiva da Lei Maria da Penha. Aprovada a PEC, o Ministério Público terá que adotar o caminho mais longo: deverá encaminhar os cidadãos à Delegacia de Polícia para instauração de um inquérito que, dias ou meses depois, retornará ao Ministério Público para as providências cabíveis.

9 – Modificada a Constituição, inúmeros criminosos poderão ficar livres de suas penas, caso consigam emplacar a tese de nulidade dos processos em que houve algum ato de investigação criminal pelo Ministério Público.

10 – O STF e outros tribunais do país já reconheceram a legitimidade de atos de investigação realizados pelo Ministério Público (cf. RE 535.478, HC 93.930, HC 94.173, HC 97.969).

Por fim, uma pergunta: a quem interessa a aprovação da PEC da impunidade? Responda o leitor. À sociedade é que não é.

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