Proposta de extinção

CNJ vai estudar se Justiça Militar é necessária

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2 de abril de 2013, 19h31

O Conselho Nacional de Justiça voltou a discutir as atividades, a relevância e “a necessidade de existência” da Justiça Militar estadual durante sessão plenária desta terça-feira (4/2). O presidente do CNJ, ministro Joaquim Barbosa, afirmou que criou uma comissão para avaliar a relevância e a abrangência da Justiça Militar dos estados. O ministro também defendeu uma “reformulação total” nas normas de cálculo de prescrição de crimes que vigoram no país.

A declaração foi feita após o julgamento de um procedimento administrativo disciplinar contra dois juízes do Tribunal Militar de Minas Gerais. Uma correição extraordinária da Corregedoria-Geral do TJM-MG revelou que 274 de um total de 330 processos criminais em trâmite na 2ª auditoria da Justiça Militar do estado prescreveram. Somente em 2012 os gastos do governo mineiro com o tribunal militar local foram de R$ 43,4 milhões. Segundo o conselheiro Bruno Dantas, neste mesmo ano cada processo do TJM-MG custava em torno de R$ 68 mil.

Em novembro de 2012, também em plenário, durante análise do mesmo processo, encerrado nesta terça, o conselheiro Bruno Dantas e o próprio presidente do CNJ haviam mencionado a possiblidade de criar um grupo de trabalho para avaliar a necessidade de existência da Justiça Militar estadual. Na ocasião, o ministro Joaquim Barbosa havia dito que caso o estudo demonstrasse ser possível a absorção das atribuições dos tribunais militares estaduais pelos tribunais de Justiça, ele poderia sugerir a extinção desse ramo especializado do Poder Judiciário brasileiro.

O Plenário do CNJ decidiu por condenar à pena de censura o juiz titular e o juiz substituto da 2ª Auditoria, acusados pela Corregedoria-Geral do tribunal militar mineiro. Ainda em novembro, o relator do processo, conselheiro José Roberto Amorim, havia votado pela improcedência do pedido, atribuindo à falta de estrutura e a condições de trabalho deficientes o atraso que repercutiu na prescrição de quase trezentos processos criminais.

Nesta terça-feira, a discussão em plenário girou em torno da existência ou não de provas que demonstrassem que a inércia no julgamento dos processos foi intencional ou se a precariedade de condições de trabalho e problemas estruturais foram as reais causas para os atrasos. O CNJ determinou ainda o prazo de 60 dias para que o TJM-MG resolva o problema.

Teste de eficiência
Embora o debate tratasse da Justiça Militar estadual, a eficiência e a relevância da Justiça Militar como um todo acabou também sendo questionada. O conselheiro Bruno Dantas, responsável por apresentar a proposta para se discutir as atividades da Justiça Militar estadual em novembro, novamente mencionou os custos de manutenção do Superior Tribunal Militar, em torno de R$ 300 milhões anuais, e o baixo número de processos julgados se comparados com os demais tribunais superiores. Joaquim Barbosa classificou como “escandalosos” os números e os comparou com a produção do próprio Supremo Tribunal Federal. “É um indicativo de um verdadeiro descalabro financeiro”, disse. O STM julgou apenas 54 casos em 2011. 

A Justiça Militar dos estados está presente em todo território nacional, mas apenas três unidades federativas possuem Tribunais Militares: Minas Gerais São Paulo e Rio Grande do Sul. Os três tribunais, que juntos têm 42 juízes, tiveram um total de 7.812 processos baixados em 2011. A existência de tribunais militares estaduais é prevista pelo artigo 125 da Consituição Federal para as unidades da Federação que tenham mais de 20 mil policias militares ativos. 

Ainda não foi definida a composição do grupo de trabalho do CNJ, mas o custo-benefício dos tribunais militares será um dos principais focos da avaliação. De acordo com o conselheiro Bruno Dantas, serão ouvidos os tribunais estaduais militares, o Superior Tribunal Militar, os comandos das polícias militares estaduais e as Forças Armadas para discutir a questão. "Com base na produtividade e nos gastos, a recomendação final pode ser desde alterações de funcionamento até a extinção da Justiça militar", afirma. Para ele, a sobreposição de estruturas entre tribunais de Justiça estaduais e os militares produz gastos desnecessários aos cofres públicos.

Avaliação criticada
A proposta de extinção é vista com antipatia por juízes militares e mesmo por alguns juristas, que a atribuem ao desconhecimento sobre a natureza da Justiça Militar, bem como do "caráter especialíssimo" de suas atribuições. Ministros do STM chegam a defender a extensão da competência da Justiça Militar para julgar também questões administrativas e não só criminais.

Ao Anuário da Justiça Brasil 2013, a ser lançado ainda no mês de abril, ministros do STM que defendem a extensão de competência da Justiça Militar criticaram os esforços de compará-la à Justiça comum. Para esse grupo de ministros, por se tratar de um ramo especializado do Poder Judiciário, previsto pela Constituição, que lida com diferenças fundamentais se comparadas com o âmbito civil, um número volumoso de julgamento de processos significaria um " quadro impensável de insurgência de oficiais e de consequente insegurança pública”. Ou seja, para os ministros ouvidos pelo Anuário, a Justiça castrense não pode ser avaliada em termos essencialmente estatísticos.

Para o especialista em Direito Militar, José Almir Pereira da Silva, a importância dos tribunais especializados é o conhecimento sobre a rotina militar para julgar adequadamente os casos. "Não é uma questão de tradição, mas de necessidade. Deveriam existir outros tribunais estaduais militares", defende. Mais urgente que o debate proposto pelo CNJ, na opinião do advogado, é a revisão e atualização das normas do direito militar.

Cálculos deliberados
Ainda durante o julgamento do mesmo processo contra os dois juízes do TJM-MG, o ministro Joaquim Barbosa defendeu uma reformulação severa do sistema de prescrição de crimes no país. O presidente do CNJ criticou o sistema atual, que, segundo ele, permite "cálculos deliberados de prescrição".

"A prescrição é sempre uma espada de Dâmocles na cabeça do juiz", disse Joaquim Barbosa. "Tem que haver uma reformulação total dessas regras de prescrição. Elas conduzem a essas perplexidades. Em muitos casos, há cálculos deliberados para que a prescrição incida", argumentou.

*Notícia alterada às 19h43, do dia 2/4, para acréscimo de informações.

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