Provas indiretas

CVM já considera indícios como provas em processos

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24 de setembro de 2012, 18h31

O julgamento do mensalão levantou discussões sobre o papel das provas indiretas na condenação de réus envolvidos em crimes do colarinho branco. Nos processos sancionadores da Comissão de Valores Mobiliários, os indícios já são considerados suficientes para condenações na esfera administrativa, principalmente em casos de negociação com informação privilegiada — o insider trading — tema que gera polêmica. A notícia foi publicada no site do Valor Econômico.

Durante o discurso no julgamento em agosto, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, citou a dificuldade de obtenção de provas diretas nos casos de insider. Segundo ele, o direito penal se vê diante de "delitos que antigamente não eram previstos". Ele defendeu o uso de provas indiretas na Ação Penal 470, o processo do mensalão. "É muito difícil saber que uma pessoa teve acesso a informação privilegiada. Mas isso se consegue através de indícios".

Para o superintendente-geral da CVM, Alexandre Pinheiro dos Santos, a discussão levantada no julgamento do mensalão é bem-vinda. "Para nós é positivo que num julgamento com essa visibilidade em termos jurídicos esteja ocorrendo uma discussão com tanta clareza, mostrando como é natural lidar com esse tipo de prova".

Porém, essa tese não é consensual. Na CVM, o entendimento é o de que a obtenção de provas definitivas é difícil nos casos de informação privilegiada, exceto na hipótese de confissão por parte do acusado ou de relação direta deste com a companhia cujas ações foram negociadas. Por isso, a autarquia admite indícios como suficientes para condenações.

"Desde que exista um conjunto de indícios sérios e convergentes, o colegiado [da autarquia] poderá, como já fez em diversas oportunidades, condenar alguém por uso de informação privilegiada. Ainda que não se consiga precisar como ou por meio de quem o sujeito teve acesso à informação", informou a CVM. A suficiência dos indícios é o ponto que cabe à avaliação subjetiva do juiz. Segundo a autarquia, esse entendimento está em linha com a jurisprudência do STF.

Em dois processos, que resultaram em absolvições envolvendo o insider, os acusados foram inabilitados e em quatro condenou-se parte dos envolvidos. A maioria dos casos, no entanto, não vai a julgamento, sendo resolvido por meio de termos de compromisso, que prevêem o pagamento de ao menos duas vezes o montante da vantagem econômica que teria sido obtida. Segundo dados do site da autarquia, entre 2008 e 2012, nove processos resultaram em absolvições e cinco em multas envolvendo insider no Brasil.

Só há uma condenação, até hoje, em caso de insider, que é o caso do vazamento de informação privilegiada envolvendo a fusão entre Sadia e Perdigão em 2011. Outro caso, envolvendo a aquisição da Ipiranga pela Petrobras, corre em segredo na Justiça Federal no Rio de Janeiro.

Segundo a advogada Ana Paula Martinez, do escritório Levy e Salomão, a cooperação entre autoridades criminais e CVM tende a se ampliar, assim como ocorreu a aproximação destas com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) nos últimos anos. "É muito difícil obter provas diretas em crimes de colarinho branco. Por isso, a cooperação entre os entes administrativo e criminal é importante", disse.

Já para o jurista Nilo Batista, em qualquer hipótese, seja no processo administrativo ou criminal, os indícios não podem ser considerados suficientes para apontar um crime. "É monstruoso condenar através de indícios. Um autor alemão comparou certa vez os indícios a prostitutas, porque eles se prestam a quem quiser se valer deles", declarou. Para ele, os indícios têm apenas a função de apontar o autor do crime, nunca o crime em si.

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