Princípio da isonomia

O fim da barreira entre advogados e juízes em Sergipe

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3 de setembro de 2012, 16h25

A advocacia brasileira vive momento impar de sua história, pois as suscetibilidades decorrentes de um Judiciário monárquico do passado e que vinham entravando a compreensão do advogado como instrumento indispensável à realização da justiça foram, agora, simbolicamente, rompidas.

É que, recentemente, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), sob a presidência do sergipano Carlos Britto, atendendo solicitação do conselheiro da OAB, Jorge Hélio Chaves, determinou a retirada dos cancelos que havia no plenário daquele Órgão da Justiça, pondo fim, assim, à barreira física entre advogados e membros desse colegiado.

A simbologia desse gesto para a advocacia e magistratura é de valor imensurável, pois essa barreira quebrada se traduz no selo oficial do reconhecimento concreto do respeito e do tratamento igualitário e sem hierarquia que devem prevalecer nas relações profissionais desses operadores do direito na construção da justiça, através de um Judiciário republicano e democrático, como assim almejou o legislador ordinário ao reafirmar, claramente, no artigo 6º, da Lei 8.906/94, que: “Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos.”

Aliás, essa declaração legislativa de igualdade de tratamento veio, apenas, consubstanciar a vontade do constituinte originário que, na Carta Política de 1988 — Constituição Cidadã do deputado Ulisses Guimarães — consagrou ser o advogado “indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

Na verdade, essa providencia adotada por esse Órgão Censório resultou apenas na fluidez maior do cumprimento pela magistratura da prerrogativa profissional que o advogado dispõe de ingressar livremente “nas salas de sessões dos tribunais, mesmo além dos cancelos que separam a parte reservada aos magistrados” e “nas salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, ofícios de Justiça, serviços notariais e de registro, e, no caso de delegacias e prisões, mesmo fora da hora de expediente e independentemente da presença de seus titulares”, como assim estatuído no inciso VI, letras “a)” e “b)”, do artigo 7º, do Estatuto da Advocacia e da OAB.

E não poderia ser diferente, pois o advogado, no cumprimento do seu múnus, exerce “uma árdua fadiga posta a serviço da justiça”, no dizer de Eduardo Couture, por desempenhar “uma nobilitante função social, facilitando a obra do juiz na realização da justiça”.

Por isso, a isonomia de tratamento entre advogados, membros do Ministério Público e da magistratura “tem um papel a desempenhar: um postula, outro fiscaliza a aplicação da lei e o outro julga. As funções são distintas, mas não se estabelece entre elas relação de hierarquia e subordinação. Os profissionais do Direito possuem a mesma formação (bacharéis em Direito) e atuam em nível de igualdade nos seus distintos e inter-relacionados misteres”, no dizer de Paulo Luiz Lôbo Netto, no seu afamado Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB, 3ª edição, Saraiva, 2002.

Foi assim, portanto, que o presidente do Tribunal Regional do Piauí, desembargador Haroldo Hehem, acompanhando essa postura procedimental inaugurada pelo CNJ, determinou também a retirada dos cancelos que separavam fisicamente os advogados dos magistrados no Plenário daquela Corte.

Neste clima harmonioso — magistratura e advocacia —, recebemos no Conselho Federal da OAB, no dia 20 de agosto de 2012, a visita da ministra Eliana Calmon do Superior Tribunal de Justiça, que foi ali se despedir dos advogados como corregedora do CNJ, pelo encerramento do seu mandato que se dará no próximo mês de setembro, quando então foi ali homenageada pelo presidente Ophir Cavalcante Junior, que destacou sua posturacorajosa, responsável e comprometida com a Justiça brasileira. Seu trabalho à frente da Corregedoria viabilizou que o Poder Judiciário se mostre de feição mais autônoma e comprometida com a aplicação da Justiça neste país”, cumprimentos que foram, neste particular, retribuídos pela senhora ministra, com a lembrança que fez do seu episódio com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que não aceitava o poder disciplinar concorrente do CNJ, dizendo que foi naquela Casa dos Advogados que teve o primeiro apoio por estar defendendo “o que há de mais sólido no CNJ”, tendo em vista que o seu propósito “não foi denegrir a magistratura, mas de impor transparência ao Judiciário”.

Assim, por ter obtido, “desde o primeiro momento”, esse apoio incondicional da OAB, a ministra corregedora, parafraseando o refrão da música “Carta de Amor”, de sua conterrânea Maria Bethania, emocionou a todos ao dizer: “não se metam comigo que não ando só, estou na companhia da Ordem dos Advogados do Brasil".

Este mesmo relacionamento harmonioso entre magistratura e OAB também é vivenciado no nosso estado de Sergipe, pois Carlos Augusto Monteiro do Nascimento, ilustre presidente da nossa Seccional, ao saudar o desembargador Osório de Araujo Ramos Filho comopresidente do Tribunal de Justiça, lhe cumprimentou como “amigo da advocacia”, honraria que foi logo confirmada pelo ilustre empossado com a sua presença na Sessão Solene de lançamento da “Campanha de Valorização dos Honorários Advocatícios”, ocorrida no dia 10 de agosto de 2012 na sede da OAB/CAA-SE, por ele prestigiada com a seguinte manifestação institucional: “Essa campanha valoriza o trabalho do advogado, sem o qual não há justiça. O TJS é parceiro da OAB e apoia a campanha em função da sua relevância e importância para sociedade.

Na Justiça do Trabalho, o sentimento é o mesmo, pois os advogados, através da Assat(Associação Sergipana de Advogado Trabalhistas), liderada pelo seu dedicado presidente, advogado Clodoaldo Andrade Junior, e da Comissão de Informática da OAB-SE, estão todos irmanados com o presidente do Tribunal Regional do Trabalho, desembargador federal Jorge Antônio Andrade Cardoso, na implantação do “PJe-Processo Judicial Eletrônico” na Justiça Trabalhista do nosso estado, atribuindo o êxito desse pionerismo à “adesão valorosa e compromissada de magistrados, servidores, advogados e procuradores”.

Por isso, não podemos deixar que a cultura ao autoritarismo que ainda viceja numa parcela isolada da magistratura comprometa a grandeza da Justiça desses “novos tempos”, como assim está a macular a Portaria 1/2012, expedida pelo titular da Comarca de Cedro de São João (SE), que dificulta o acesso do advogado aos autos e às dependências do seu gabinete, mesmo a despeito do bom cumprimento do seu mister, porque, como já vimos, isto não é possível sob qualquer pretexto, como assim consta no artigo 1º, da recentíssima Instrução Normativa 2/2012, de 16 de agosto de 2012, expedida pelo desembargador Antônio Pessoa Cardoso, corregedor das Comarcas do Interior do vizinho Tribunal de Justiça, ao proibir, peremptoriamente, “no âmbito das comarcas do interior do estado da Bahia, a edição de atos normativos, em forma de portaria ou outra modalidade, dispondo sobre limitações, agendamentos prévios e ou restrições de qualquer sorte ao atendimento de advogados, pelos juízes de primeiro grau”, dispondo ainda, no seu artigo 2º, que “os juízes auxiliares desta Corregedoria deverão fiscalizar e orientar, nos limites da sua respectiva área territorial de atuação, o efetivo cumprimento da presente Instrução Normativa, comunicando, imediatamente, eventuais casos de inobservância ao seu conteúdo dispositivo, para a devida apuração”.

É o que todos almejamos.

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