Posicionamento inaceitável

Zara contesta “lista suja” do trabalho escravo

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1 de setembro de 2012, 8h54

Apontada como “exemplo no saneamento de problemas trabalhistas” pelo coordenador do Programa de Erradicação do Trabalho Escravo em São Paulo, a rede Zara está suspensa do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo desde o último dia 16. Isso porque a empresa entrou na Justiça contestando a constitucionalidade da “lista suja” do trabalho escravo. A informação é do portal do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo.

A Zara Brasil entrou na Justiça pedindo que seu nome não fosse incluído no ranking que aponta empregadores que fazem uso do trabalho escravo e afirmou que a lista é inconstitucional. Para o comitê que coordena o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, o posicionamento é inaceitável, pois "afronta" e "enseja a violação" dos princípios basilares e formadores do Pacto Nacional, em atividade desde 2005.

Integrada à iniciativa em novembro de 2011, a Zara foi punida com sua suspensão, que está condicionada à existência e tramitação do processo e às eventuais decisões judiciais sobre os pedidos constantes da Ação Anulatória, que tramita na 3ª Vara do Trabalho de São Paulo. A supressão do nome da empresa da “lista suja” foi determinada em decisão com caráter de liminar.

Em junho de 2011, diligência conjunta do Ministério Público do Trabalho com o Ministério do Trabalho encontrou 51 trabalhadores, dos quais 46 bolivianos, trabalhando em condições de semiescravidão na cidade de Americana (SP). Segundo o MPT, os bolivianos trabalhavam 14 horas por dia e recebiam R$ 0,20 por peça de roupa produzida. No mês seguinte, outra diligência encontrou 14 trabalhadores bolivianos em situação semelhante, mas na cidade de São Paulo.

Em dezembro do mesmo ano, assinou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o MPT e com o MTE para garantir o controle sobre a atividade de seus funcionários e dos empregados de seus fornecedores. Pelo acordo, a rede de lojas terá de fazer um "investimento social" de R$ 3,4 milhões para criar um fundo de emergência e sanar os problemas encontrados em algumas de suas confecções em São Paulo. Cada empresa terceirizada que descumprir o acordado deverá pagar multa de R$ 50 mil. 

Leia comunicado do Comitê de Coordenação e Monitoramento do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo:

São Paulo e Brasília, 16 de agosto de 2012.

A/C Zara Brasil Ltda.

Agradecemos o envio da resposta referente à solicitação do Comitê de Coordenação e Monitoramento do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo para esclarecimento do posicionamento da empresa sobre a Ação Anulatória ajuizada perante a Justiça do Trabalho, na qual se alega a inconstitucionalidade do Cadastro de Empregadores Flagrados Explorando Mão de Obra Análoga à de Escravo (Portaria Interministerial nº 2 do MTE/SDH) e da Instrução Normativa de nº 91/2011 do MTE.

Tendo em vista o posicionamento reiterado pela Zara Brasil em manter a aludida ação, o Comitê se reuniu e deliberou sobre o comportamento da empresa como signatária do Pacto. Na oportunidade, o Comitê concluiu que o questionamento à constitucionalidade da "Lista Suja" afronta os princípios basilares e formadores do Pacto.

Cumpre ressaltar que um dos principais compromissos que compõem o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo é o de restringir vínculos comerciais e financeiros com empregadores que sejam inseridos na "Lista Suja". Sem esse instrumento, as empresas signatárias perderiam sua base consultiva oficial para um controle rigoroso de suas cadeias produtivas.

Importa destacar que tal comportamento como signatária enseja violação aos princípios do Pacto Nacional e ao próprio texto que o constitui. Deste modo, destacamos os seguintes pontos, in verbis:

Considerando:

a) A existência de lista de empregadores e/ou de seus intermediários que

exploram mão de obra escrava no Brasil (Portaria MTE 540/2004*), que

lançam mão de coerção física e moral cerceando a livre opção e a livre ação de

trabalhadores;

(…)

Acordam os signatários em incrementar esforços visando dignificar e modernizar as relações de trabalho nas cadeias produtivas dos setores comprometidos no "Cadastro de empregadores Portaria MTE 540/2004" que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à escravidão. Para tanto, dentro de suas esferas de competência, as partes se comprometem a:

(…)

2. Definir restrições comerciais àquelas empresas e/ ou pessoas identificadas na cadeia produtiva que se utilizem de condições degradantes de trabalho associadas a práticas que caracterizam escravidão (…).

Em que pese a empresa reafirmar seu interesse em continuar apoiando as ações de melhoria das condições no setor têxtil em São Paulo, assim como o compromisso em combater o trabalho escravo em sua cadeia produtiva (o qual defendemos e consideramos de suma importância), resta claro seu comportamento contraditório ao promover judicialmente o questionamento da constitucionalidade de um dos principais instrumentos de combate ao trabalho escravo no Brasil e do Pacto Nacional, tido inclusive como referência internacional.

Isto posto, o Comitê informa que, com base no Código de Conduta, Item "F", referente a casos omissos ("Os casos não previstos neste Código de Conduta serão decididos pelo Comitê de Monitoramento do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo"), decidiu pela suspensão, por prazo indeterminado, da empresa Zara Brasil Ltda. do Pacto Nacional.

Tal suspensão terá início a partir do dia 17 de agosto de 2012 e sua vigência ficará condicionada à existência e tramitação do processo e às eventuais decisões judiciais sobre os pedidos constantes da Ação Anulatória.

Atenciosamente,

COMITÊ DE COORDENAÇÃO E MONITORAMENTO DO PACTO NACIONAL PELA ERRADICAÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO
Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
Instituto Observatório Social
ONG Repórter Brasil
Organização Internacional do Trabalho

*Em 12 de maio de 2011, a Portaria MTE 540/2004 foi alterada para a Portaria Interministerial MTE/SDH nº 2/2011.

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