Trechos inúteis

Petição incial deve se limitar a fatos ocorridos

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28 de outubro de 2012, 5h44

A Justiça do Distrito Federal decidiu pela suspensão da petição inicial dos autos de um processo por considerar que o autor não atendeu aos requisitos previstos no artigo 282 do Código de Processo Civil. A decisão foi da juíza Sandra Cristina Candeira de Lira, da 2ª Vara Cível de Taguatinga, após ter sido solicitado por duas vezes que o autor fizesse emendas na petição inicial para que esta se limitasse apenas aos fatos ocorridos.

No caso, o advogado Rogerounielo Rounielo de França, que atua em causa própria, reclama pelo atraso na entrega pela construtora de um apartamento que ele comprou na planta.Em sua petição inicial, de 137 páginas, o advogado reuniu, de forma confusa, um vasto material para explicar os potenciais danos que ele poderia sofrer. Como explica em um e-mail, ele mergulhou fundo na matéria. “Registramos que na petição inicial realizamos profundo mergulho jurídico, econômico e financeiro, envolvendo os autores, enquanto consumidores, o réu Itaú Unibanco S.A. (instituição financeira) e o réu Avila Empreendimentos Imobiliários S.A. (construtora), para desnudar, de forma profunda, com riqueza de detalhes, em todos os aspectos, conhecidos e desconhecidos dos consumidores, em geral, e muitas vezes desconhecidos de todos àqueles que, direta ou indiretamente, mantém contato com essa matéria (governantes, criadores de políticas públicas de habitação, desembargadores, juízes, advogados, promotores etc., envolvidos com resolução de lides da espécie), o modelo de negócios de construção e venda de imóveis, na planta, no Brasil, para que se faça justiça, para minha família, neste processo, e, também, para que se faça justiça, para outras famílias, em outros processos análogos a este, com a firme esperança de que a experiência de minha família, nesta causa, sirva para melhorar, de alguma forma, as relações negociais, jurídicas e judiciais, deste tipo de negócio, no Brasil, equilibrando, melhor, as relações de forças, especialmente a dos inocentes consumidores que, na verdade, são grandes vítimas desse complexo e incompreensível modelo de financiamento e construção de imóveis, na planta, no Brasil, idealizado pelas construtoras e instituições financeiras”. Claro como a luz do dia, certo?

A juíza Yeda Maria Morales Sánchez não entendeu assim. Ou simplesmente não entendeu e determinou que o autor emendasse a inicial. E não perdeu a oportuniade de repetir a lição: a inicial deve conter a lesão de direito atual, não por fatos futuros. De acordo com ela, o autor elencou fatos sequer ocorridos no pedido de mérito. A juíza solicitou ainda a exclusão diversos fundamentos fáticos e jurídicos inseridos na inicial. Foi estabelecido o prazo de 10 dias para que fosse apresentada nova versão do documento, sob pena de indeferimento da inicial.

Apresentada a emenda à inicial, que passou de 137 para 221 páginas, coube à juíza Virgínia Fernandes de Moraes Machado Carneiro analisar a nova peça inicial. Segundo a juíza, “a inicial e a emenda apresentadas pelos autores são confusas, de difícil compreensão e com inúmeros trechos inúteis e desnecessários para a solução da controvérsia”. A juíza alertou ainda que “as formalidades nunca devam se sobrepor aos bens jurídicos a serem tutelados, uma petição bem elaborada e consentânea a certas regras de processo também auxilia na proteção do direito especialmente porque as peças processuais devem ser escritas de forma coerente e lógica para que seja possível a compreensão não apenas pelo magistrado, mas pelas outras partes envolvidas”.

Em seu despacho a juíza ressaltou que é dispensável e improdutivo a transcrição integral de artigos jornalísticos, de mensagens eletrônicas e de links para artigos publicados na internet que não criam nem constituem direito dos autores. “A título exemplificativo, em dezesseis páginas (26/42), os autores mencionam quarenta e três artigos doutrinários e seus respectivos links referentes à situação econômica mundial e ao sistema financeiro. Da mesma forma, mostra-se prescindível a reprodução, integral de documentos que comprovam as alegações porquanto acompanham a inicial e fazem parte do caderno processual”, esclarece a magistrada na decisão.

Também foi solicitada a exclusão da peça o currículo, cursos ou atividades que o autor realizou bem como as mensagens religiosas ou filosóficas apresentadas na emenda, tais como "Adoremos o Pai Universal! Saudemos o Ser Supremo".

Sob pena de indeferimento da inicial e revogação da tutela antecipada que foi dada na primeira decisão, a juíza deu um prazo de 10 dias para alteração na peça inaugural “a fim de torná-la inteligível e facilitar a compreensão do assunto, devendo: a) excluir todas as transcrições de matérias jornalísticas, links de internet, advertências religiosas e filosóficas, currículo do autor, mensagens eletrônicas, reproduções de documentos que acompanham a inicial, dentre outros trechos inúteis e desnecessários; b) apresentar os fatos e fundamentos jurídicos de forma sucinta, concisa, mas com as informações essenciais à análise da matéria; c) formular pedidos certos e determinados, bem como breves e precisos porquanto a forma como foram apresentados (trezes páginas só de pedidos) inviabilizam até mesmo a compreensão do que efetivamente pretendem os autores.”

Como os pedidos não foram atendidos a juíza Sandra Cristina solicitou que fosse retirada dos autos a petição e outros documentos. A juíza não analisou o pedido de antecipação de tutela pois não foi atendida a determinação da emenda.

Clique aqui para ler a petição inicial com emendas
Clique aqui para ler a decisão da juíza Yeda Sánchez
Clique aqui para ler a decisão da juíza Virgínia Carneiro
Clique aqui para ler a decisão da juíza Sandra Cristina

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