Eleições na OAB

"OAB deve defender os advogados e seus interesses"

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26 de outubro de 2012, 5h06

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Se, na época da ditadura, o maior problema não eram os generais, mas o policial da esquina, com o julgamento do mensalão, o ponto central não são os ministros do Supremo Tribunal Federal, mas como o juiz de primeira instância vai interpretar as decisões da mais alta corte do país. O paralelo foi traçado pelo candidato da situação para a presidência da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro, Felipe Santa Cruz, em entrevista à revista Consultor Jurídico.

Filho de um estudante de direito desaparecido nos anos de chumbo, Santa Cruz diz ver com muita preocupação algumas decisões do Supremo no processo do mensalão, em especial o peso dado às provas indiciárias. “Não podemos transferir o julgamento político para dentro do Judiciário, porque isso vai dar exemplo pra o juiz de primeira instância”, afirma.

Sem vergonha de assumir a defesa dos interesses corporativos dos advogados, Santa Cruz afirma que os intresses mais gerais da sociedade devem ser postos num plano secundário pela Ordem. Em sua avaliação, as seccionais devem voltar-se para a prestação de serviços relacionados ao dia a dia do profissional, como cursos de capacitação para os advogados lidarem com o processo eletrônico.

Defensor da eleição direta para o Conselho Federal da OAB, considera o modelo atual como uma “exclusão às avessas”, uma vez que, em sua avaliação, diminui o peso dos estados com maior número de advogados no país, como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Apesar de se declarar contrário à entrada de escritórios estrangeiros no Brasil, Santa Cruz diz que, se eleito, promoverá um debate sobre o assunto. “Isso é muito sério para ser tratado como um Fla-Flu”, afirma.

Com o apoio do atual presidente da seccional do Rio, Wadih Damous — ao lado de quem diz "batalhar" desde 1993 —, Santa Cruz diz que o momento atual é de “renovação”. Ele defende ainda que o Conselho Federal estabeleça um limite de dois mandatos para os presidentes das seccionais. Formado em Direito pela PUC-Rio e mestre em Direito e Sociologia pela Universidade Federal Fluminense. Eleito conselheiro em 2006, na primeira gestão do atual presidente da seccional, assumiu a presidência da Caixa de Assistência dos Advogados em 2009. Já tentou se candidatar vereador pelo PT, mas não conseguiu. “Nunca mais serei candidato a nada”, jura. “Não é a minha vocação. Na Ordem eu sinto prazer em fazer política”, diz o advogado, de 40 anos.

Leia a entrevista concedida à ConJur:

ConJur — Qual é o principal papel da OAB?
Felipe Santa Cruz — Em primeiro lugar está a defesa dos advogados e dos seus interesses. Corporativos inclusive. Em segundo, a construção de um mercado que seja digno para a advocacia. Em terceiro, o papel fundamental como principal entidade da sociedade civil, servindo em aspecto público a sociedade brasileira, suas boas bandeiras, mas sempre com muito cuidado, porque temos um patrimônio histórico que não pode se desgastar em lutas que não sejam da altura da própria tradição da advocacia brasileira.

ConJur — Como o senhor vê a crítica de que a OAB seria muito corporativa?
Felipe Santa Cruz — Não vejo problema. Qualquer outra entidade de classe é muito mais corporativa que a Ordem, a única que tem boa parte de sua pauta voltada para a sociedade e para os seus interesses. Isso é histórico. A Ordem se sacrificou, em momentos chave da história do país, por muito mais que interesses meramente corporativos. Por isso construiu a legitimidade que tem. As convivências desses dois aspectos devem ser vistas como positiva.

ConJur — Você é a favor de eleições diretas para o Conselho Federal da OAB?
Felipe Santa Cruz — Sou. Mas é necessário, ainda que se discuta o modelo de transição para eleição direta, que o Conselho Federal aceite pelo menos uma discussão com modelos alternativos. Como seria esse modelo de eleições direta? Que ele não vire um modelo de abuso de poder econômico, que nós tenhamos regras claras. Ninguém é ingênuo. Não discutir a ampliação da participação democrática dos estados, levando em consideração a vontade dos advogados, é fechar os olhos para a realidade.

ConJur — Como o senhor vê o modelo atual?
Felipe Santa Cruz — É um modelo muito perigoso, porque é uma exclusão às avessas. De certa forma, há um preconceito com os estados maiores. O modelo atual não pode continuar como está. Ele precisa passar por uma mudança pensada, não pode ser leviana ou feita às pressas. Mas o modelo como está, com a votação indireta dos três conselheiros por estado, ele efetivamente está reproduzindo uma lógica que é a mesma do Senado Federal, e no caso da advocacia exclui de forma perversa setores importantes, em especial Rio, São Paulo, Minas Gerais e grandes estados.

ConJur — Isso deslegitima a eleição?
Felipe Santa Cruz — Todos os presidentes da Ordem são legítimos, são eleitos, mas se passasse por um processo mais democrático com voto e a participação dos colegas do país inteiro, o presidente nacional teria uma força da qual a Ordem carece, porque as grandes questões hoje são nacionais.

ConJur — Os advogados públicos devem ter direitos a honorários?
Felipe Santa Cruz — Defendo que têm. No Rio, temos uma articulação muito forte, muito companheira com a advocacia pública. Lá não temos grandes conflitos.

ConJur — Em relação ao Quinto Constitucional alguns juízes reclamam que ele é usado, como uma espécie de alpinismo jurídico. Isso existe?
Felipe Santa Cruz — Não vejo alpinismo nenhum. Para um advogado bem sucedido, a carreira pública importa inclusive em sacrifício financeiro. Muitos desses colegas foram ganhar menos na carreira pública. Eles foram contribuir com sua visão de advocacia, de mundo, para um Judiciário menos hermético, um Judiciário oxigenado. Tem que fazer uma grande lista. Aí não tem como dar errado.

ConJur — O Quinto Constitucional deve ser revisto?
Felipe Santa Cruz — Não. Ele deve ser garantido. A única coisa que estou avaliando é o apoio a um projeto que prevê o envio direto dos nomes da Ordem para o governador ou para o presidente. É muito interessante. Pularia a instância do Tribunal. Tenho visto com muitos bons olhos as experiências das escolhas diretas. Fazer uma pré-seleção e submetendo a classe. Isso é muito fácil de fazer em alguns estados que são menores, mas no Rio a logística disso é muito complexa. A Ordem não teria dinheiro nem estrutura para montar processos onde 650 mil advogados fossem ouvidos sobre escolhas de colegas. Mas é belíssima a experiência no Espírito Santo. Temos que pensar nisso no futuro como entidade.

ConJur — Como isso é feito no Rio?
Felipe Santa Cruz — Com publicidade, com os colegas sentindo que há verdadeiramente possibilidade de eleição. Não pode haver compadrio. O maior testemunho de sucesso do nosso Quinto é que os não indicados dizem que o processo foi legítimo.

ConJur — Por que a OAB não presta contas do dinheiro que administra?
Felipe Santa Cruz — Ela presta conta. No Rio de Janeiro, como presidente da Caixa de Assistência do Advogado do Rio de Janeiro (Caarj), peguei uma Caixa quebrada, a pior do Brasil em situação financeira, devendo milhões de reais. Passamos por um processo de saneamento duríssimo. Houve até atentado contra auditor, que tomou seis tiros. Não morreu, graças a Deus. Houve furtos de milhares de documentos, o que deixou uma Caixa sem memória material, sem documentos para comprovar as suas dívidas. Passamos por um processo terrível. No último semestre fizemos um livro do meu ano, com todo o meu balanço. Mandei para todos os conselheiros. É fundamental você prestar contas, até porque, se não fizer isso, não se pode cobrar que os outros façam.

ConJur — Isso é obrigatório?
Felipe Santa Cruz — É. Nós temos o controle. No Rio de Janeiro, gastamos e investimos fortemente no sistema da Totvs, um sistema de gerenciamento financeiro. Haverá um sistema online de compras, que poderei descer a detalhes que eu não conseguia, até por falta de estrutura gerencial, que nós não tínhamos. Qualquer um tem direito de saber para onde está indo o dinheiro.

ConJur — Muitos candidatos do Exame de Ordem reclamam que o nível da prova é quase igual dos concursos públicos. Isso deve ser revisto?
Felipe Santa Cruz — Não é quase igual não, mas sinceramente ele tem problemas. No Rio era um processo viciado. Tínhamos problemas graves, recursos identificados com timbres de escritórios. Fizemos um processo de organização, e depois o correto, que foi a prova nacional unificada. Cortou distorções e terceirizou a prova, o que é corretíssimo. Tirou da prova pressões políticas que pudessem levar nossa entidade ao descrédito. Agora é um exame complexo, não pode trabalhar com pegadinhas, mas acho que isso é uma evolução natural da própria banca. É um exame que tem que ser garantido. É fundamental para o futuro da Ordem hoje temos efetivamente uma melhor qualidade desses profissionais que passam por esse exame. Não é vergonha nenhuma ser reprovado em um ou dois exames

ConJur — O senhor acha que o Exame de Ordem tem o mesmo nível de dificuldade dos concursos públicos?
Felipe Santa Cruz — Não. Pelo amor de Deus. Na ultima prova da magistratura passaram quantos do Rio de Janeiro? Passaram 36. Agora eles ficam comparando advocacia com profissões de nível médio. Eu disse para um jovem um dia desses: ‘meu amigo, se você acha que ser escrevente em tribunal é mais importante do que ser advogado, você está perdendo seu tempo, não faça o Exame de Ordem, vá ser escrevente do tribunal’. Advogado é algo importante. A advocacia tem que se dar ao respeito.

ConJur — Quais são os principais defeitos?
Felipe Santa Cruz — Há erros nas provas, provas com pegadinhas. Ela está com uma visão excessiva de carreira pública. Há muito juiz elaborando essa prova. O exame devia ser feito só por advogados. É um erro do Conselho Federal.

ConJur — O CNJ deve substituir as Corregedorias dos Tribunais?
Felipe Santa Cruz — Não. Mas é um "paradoxo de Tostines". As Corregedorias começaram a funcionar depois da existência do CNJ. Se elas funcionassem não teria CNJ. ‘N’ vezes sobrou à Ordem única e exclusivamente o caminho do CNJ. Essa história de que "existe a Corregedoria", nós sabemos que, desculpa dizer, é para boi dormir, né?

ConJur — Como o senhor vê a situação do advogado assalariado?
Felipe Santa Cruz — Acho que nós ainda temos que evoluir muito. Na discussão de piso, na discussão de qual é o papel da Ordem juntos com os sindicatos dos advogados. Nem a Ordem nem os sindicatos podem aceitar a exploração aviltante que está ocorrendo em alguns lugares. Coisa do audiencista, o empobrecimento da classe.

ConJur — O que faz o audiencista?
Felipe Santa Cruz — Ganha R$ 20 para fazer uma audiência, não lê o processo, recebe tudo pronto. É menos que um trabalho braçal.

ConJur — Há uma proletarização da profissão?
Felipe Santa Cruz — Por um lado sim e outro não. No início dos anos 90, ninguém queria ser advogado. Hoje o Rio de Janeiro está crescendo. Temos várias vagas em Macaé para advogado trabalhista que fale inglês, para fazer relatório, lidar com clientes internacionais. Essa advocacia está proletarizada? Não. Eu vejo um mercado em crescimento. Agora, outros setores dentro da advocacia podem sim viver. Os juizados, por exemplo, estão passando por um processo muito ruim no Rio. Houve uma explosão do consumo, e os juizados ficaram paralisados. Ali houve uma proletarização da advocacia.

ConJur — E o que a OAB pode fazer?
Felipe Santa Cruz — No Rio, criamos a comissão de juizados, e estamos sendo duros. Nós usamos nosso meio de comunicação como fonte de denuncia. Seis meses atrás, fizemos uma dura crítica ao juizado de Nova Iguaçu, gerando uma coisa que me orgulha no Rio de Janeiro: magistrado desagravando magistrados. Passou a acontecer depois que a gente começou a bater.

ConJur — A OAB deve restringir o ato de atuação da Defensoria?
Felipe Santa Cruz — Defendemos o papel da Defensoria, temos uma relação extremamente positiva. O que nós estamos discutindo com a Defensoria, já há alguns anos, são os critérios de acesso e os limites de remuneração. O Defensor tem algumas vantagens que a própria carreira dá, com acesso privilegiado ao juiz.

ConJur — E em relação aos convênios?
Felipe Santa Cruz — Não cabe à OAB substituir a Defensoria Pública. Tem que ter uma Defensoria formada, isso é fundamental para o estado.

ConJur — Há algum critério objetivo para delimitar o campo de atuação do advogado e do defensor?
Felipe Santa Cruz — Fizemos uma tabela, que é a mesma do INSS. Estamos discutindo com o defensor Público Geral, Nilson Bruno, para ajustar critérios. Depois vamos encaminhar para a Assembleia Legislativa. Já chegamos a ter proprietários de fazenda usando a Defensoria como instrumento. Isso já diminuiu muito, só com diálogo.

ConJur — Como o senhor vê as soluções extra-judiciais?
Felipe Santa Cruz — Sou da Justiça do Trabalho, não posso achar conciliação ruim. Temos comissões e debates permanentes. Isso só vai crescer. Temos propostas para a próxima gestão de ampliação desses estudo. Isso é bom para a advocacia.

ConJur — O que o senhor acha da Lei da Ficha Limpa?
Felipe Santa Cruz — Foi um belíssimo processo de cidadania, inclusão e vontade popular. Mas me preocupa uma preponderância excessiva do Poder Judiciário no processo de formação da vontade do nosso povo. Está acontecendo no Rio de Janeiro. Juízes de primeira instância estabelecendo quem pode ou não fazer campanha, quem pode ou não comparecer às ruas. Não é esse o papel da Justiça. O papel do juiz é separar quem não tem condições éticas e currículo. O processo democrático não pode ser substituído pelo processo judicial.

ConJur — O Judiciário tem legislado?
Felipe Santa Cruz — Tem, e tem exagerado. Vejo todos os dias coisas inacreditáveis. Ele ocupa o vazio da falta de legitimidade que está vivendo o Legislativo. Nós não queremos a ditadura do juiz, como não queremos a ditadura do Executivo, ou de qualquer outro poder. Esse é um equilibro muito delicado e cabe a nós vigilância permanente.

ConJur — Sobre os escritórios estrangeiros, o senhor é a favor da entrada deles?
Felipe Santa Cruz — Não. Se eu for eleito, pretendo submeter ao Conselho Seccional um debate sobre isso. Até porque o problema chegou primeiro em São Paulo e agora está muito vivo no Rio de Janeiro. O Brasil não pode se isolar, nós devemos ter formas de interação com os escritórios internacionais, de parceria, de troca de conhecimento, mas simplesmente abrir o mercado me parece uma infantilidade. Não há essa reciprocidade por parte de outros países e esse interesse só nasceu porque o nosso mercado hoje tem essa janela de oportunidade. É dever meu, como líder da minha classe, que essa janela se reverta para os advogados do meu país. Na Inglaterra, você tem ações em bolsa, escritórios capitalizadíssimos que chegam aqui e destroem nosso mercado em seis meses. Compram nossas melhores cabeças, quebram nossas estruturas de produção, inclusive intelectual. Isso é muito sério para ser tratado como um “Fla-Flu”.

ConJur — O acesso à Justiça aumentou nos últimos anos e isso teria superlotado o Judiciário. É possível diminuir isso?
Felipe Santa Cruz — A melhor administração do Poder Judiciário. Ele tem que estar à altura do desafio. Já ouvi na Justiça do Trabalho do Rio de Janeiro que esse trabalho não pode estar em qualquer esquina. Ela tem que estar em qualquer esquina, onde há o conflito do trabalhador, precisando da Justiça do Trabalho, tem que ter a Justiça do Trabalho. O uso da tecnologia é o grande diferencial. No Rio de Janeiro está faltando qualificação da primeira instância. O tribunal tem que ouvir a advocacia para fazer ajustes. Tem estagiário demais e funcionário de carreira de menos no Tribunal do Rio de Janeiro. Faltam 200 juízes de primeira instância no Rio de Janeiro.

ConJur — Como o senhor avalia o processo de informatização?
Felipe Santa Cruz — Os tribunais não estão conseguindo dar conta dessa transição. Foram pressionados pelos tribunais superiores e, muitas vezes, a pressão foi excessiva. Foram obrigados a fazer certas coisas de forma açodada. No Rio, distribuímos mais de 15 mil tokens gratuitamente para todos os advogados do Rio de Janeiro, capacitamos 30 mil advogados só no ano passado para o processo digital. O Rio saiu de décimo para primeiro do Brasil em inclusão digital. Na sala do fórum, troquei 40 computadores. Tive que levar para lá cinco máquinas de escrever, porque nós temos colegas que ainda usam máquinas. Se esse processo não for feito de forma coerente, cuidadosa, ele vai significar exclusão da advocacia de alguns setores, vai significar proletarização. Há exemplos absurdos, como esse escritório aqui de Barueri, que trabalha para o Brasil inteiro, cobrando trinta reais (R$ 30) por processo, mandando tudo por internet.

ConJur — Qual que é o maior problema da Justiça brasileira hoje?
Felipe Santa Cruz — A administração da primeira instância.

ConJur — Os Tribunais de Etica e Disciplina da OAB funcionam bem?
Felipe Santa Cruz — Na nossa primeira gestão, encontramos o TED destroçado, com processo prescrevendo. Fizemos um trabalho duro. Chegamos a excluir 32 advogados em uma única sessão do conselho seccional. Tem que dar o exemplo. O Tribunal de Ética vai passar pelo mesmo processo de digitalização que o resto da Ordem. Isso vai gerar maior celeridade. Vamos investir em um grande mutirão de conciliação. Tem muita bobagem que fica assoberbando o Tribunal de Ética: problemas de advogados que não devolveram os autos de um inventário, não devolveram os autos de um processo em que não é possível achar a reclamada para executar. O tribunal acaba lotado por coisas que não deveriam estar ali.

ConJur — Mas deve haver um filtro para essas questões?
Felipe Santa Cruz — Nós queremos fazer. Mas temos que ter cuidados com o filtro, porque pode ser muito perigoso também.

ConJur — Como é feita a análise dos casos?
Felipe Santa Cruz — Depende do caso. Temos o TED, as câmaras do TED e em último caso, em determinadas matérias, chegam recursos ao nosso Pleno, do Conselho Seccional. E criamos no Rio o órgão especial que juga matérias para dar mais celeridade. Nem tudo passa pelo Pleno.

ConJur — Essa estrutura está funcionando adequadamente?
Felipe Santa Cruz — Ela está evoluindo muito lá no Rio. Nós recuperamos o salário dos nossos servidores, recuperamos as suas histórias. Criamos uma gama de serviços enormes, recorte digital, esse inclusão digital. Criamos uma marcenaria própria na Ordem. Eletricista. Toda a sala do fórum é repaginada no modelo unificado. Espalhamos escritórios compartilhados pelas sedes das subseções e fizemos salas de atendimento, que é o projeto OAB século XXI.

ConJur — O que as Caixas de Assistência dão? E o que elas deveriam dar ao advogado?
Felipe Santa Cruz — As Caixas estão passando por um momento de transição. Durante dez anos, se entendeu a Caixa de Assistência basicamente como um modelo de plano de saúde, mas no Rio de Janeiro esse modelo quase levou a OAB à falência. Dívidas fiscais monstruosas, mais de R$ 74 milhões de dívidas só com hospitais. Os advogados chegavam à porta do hospital tinha lá um cartãozinho "não aceita Caarj". Nenhuma Caixa do Brasil permanece com esse modelo. Todas terceirizaram suas atividades.

ConJur — Qual o papel delas?
Felipe Santa Cruz — Prestar assistência social, ajudar o colega que precisa mais. Criei o "aprender": todo início de ano, o advogado que ganha abaixo de "x" salários comprova isso e eu pago o material escolar de até dois filhos dele. Quando a advogada tem filhos, como a Ordem pode ajudar? Pagar salário não pode. Nesse caso, a Caarj devolve anuidade para essa advogada integralmente. Somos nós que enterramos os colegas que não podem ser enterrados, somos nós que ajudamos com benefícios excepcionais aqueles que estão passando por uma fase de crise muito grande. Temos planos odontológicos gratuitos para todo advogado em dia, temos transporte dos advogados, que a Caixa ajuda a pagar, temos esse projeto de inclusão digital que foi a Caixa que pagou os tokens. A Caixa é o braço assistencial e um braço executivo da Ordem nas questões de serviço e atendimento das demandas do advogado.

ConJur — A Caixa atuou quando houve os deslizamentos na região serrana do Rio?
Felipe Santa Cruz — Nós nos mudamos para lá. Ligamos para todos os advogados da região, sabendo o que cada um precisava. Recolhemos toneladas de alimentos, água, tivemos presente na região toda. Foi o momento mais bonito da nossa gestão.

ConJur — Há advogados Como o senhor vê a nova lei de lavagem e a discussão a eventual aplicação de seus dispositivos sobre os advogados?
Felipe Santa Cruz — Vejo com muita preocupação. O Brasil não pode cair numa sociedade de medo e de constrangimento. Uma sociedade que bloqueia uma função fundamental, que é o advogado, misturando sua atividade com o ilícito do seu cliente.

ConJur — O ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos cunhou o termo “indignos de defesa”. O senhor concorda?
Felipe Santa Cruz — Sim. Há a sensação de fúria midiática e de uma sociedade imediatista. Você quer o julgamento que caiba em três capítulos do Jornal Nacional. Você quer o julgamento que o juiz bata a boca para poder dar notícia. A imprensa livre é fundamental para a democracia, mas nós devemos compreender que cada bem que está envolvido merece um cuidado especial. Concordo com o ministro Márcio. Não podemos aceitar uma sociedade de linchamento público. Nós já tivemos casos gravíssimos, como o Escola Base. Há um clamor público pelo julgamento em dois capítulos, como se fosse uma novela. Está se achincalhando o juiz pela posição dele, e o advogado pelo seu cliente. É um modelo perverso.

ConJur — Como o senhor viu a decisão do Supremo relativa às provas produzidas sem o crivo do contraditório e sua utilização para condenar réus no mensalão?
Felipe Santa Cruz — Vejo com muita preocupação. Ali está em jogo a vida da pessoa. Na nossa sociedade, com essa exposição toda, normalmente são os casos que maior repercussão que sofrem esse tipo de processo. Com isso, transfere-se pra o Judiciário a falta de legitimidade. Porque isso aconteceu em um CPI, você concorda? Não podemos transferir o julgamento político para dentro do Judiciário, porque isso vai dar exemplo pra o juiz de primeira instância. O caso excepcional vai pautar um juiz de primeira instância. Vamos criar um Judiciário super poderoso, capaz de atropelar as garantias individuais. É um processo de arbítrio, ainda que pseudodemocrático. Não dou aos juízes esse poder. É o mesmo que na ditadura: meu problema com o AI-5 não era o general, mas o Cabo. É o juiz da primeira instância, que vai fazer da leitura do que o Supremo está fazendo um processo de arbítrio.

ConJur — Quais são as suas perspectivas para a eleição no Rio?
Felipe Santa Cruz — Tenho uma história de seis anos de trabalho na Ordem, história de 20 anos de trabalho na advocacia e estou orgulhoso. Estou à frente de um movimento. A presidência foi muito bem conduzida pelo Wadih, que é um grande líder da advocacia do Rio. Fez um trabalho histórico, enfrentou grande dificuldade e nós temos muita convicção que vamos continuar trabalhando no caminho certo. Pegamos um trem que estava capotado, colocamos no trilho com a liderança do Wadih, pusemos esse trem para andar e agora temos de acelerar.

ConJur — Como o senhor avalia o papel do atual presidente da seccional, Wadih Damous?
Felipe Santa Cruz — O Wadih poderia ter feito como outros presidentes, que se elegeram pela terceira vez, e ele compreendeu que era momento também de renovação dentro do próprio grupo. Ele tinha uma eleição certa. Eu defendo que o Conselho Federal, inclusive, estabeleça um limite de dois mandados para o presidente da Ordem. Porque o trabalho é muito bem avaliado, temos 80% de ótimo e bom, pela última pesquisa do Ibope.

ConJur — Quais são os seus principais desafios?
Felipe Santa Cruz — Vamos lutar pela inclusão da advocacia no Simples, aumentar nossa participação na discussão de arbitragem e mediação, discutir os escritórios estrangeiros, lutar, incessantemente, por essa que nós chamamos evolução gerencial na primeira instância da Justiça.

ConJur — Qual é sua base de apoio?
Felipe Santa Cruz — Hoje eu tenho apoio do 60 presidentes de subseção e me orgulho disso, especialmente, porque, eu te confesso, eu fui convidado pelo Wadih com 33 anos de idade para ser diretor de subseções da OAB do Rio de Janeiro e vivi boa parte dos últimos seis anos rodando o estado.

ConJur — Há críticas ao senhor pelo fato de ter sido candidato a vereador?
Felipe Santa Cruz — Fui presidente de Centro Acadêmico e de Diretório Central dos Estudantes e, em dado momento da minha vida, eu cheguei a pensar na política. Tentei ser vereador muito jovem, e nunca mais pensei nisso e nunca mais serei candidato a nada. Não é a minha vocação. Na Ordem eu sinto prazer em fazer política.

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