Justiça Tributária

Correção de valores do IR não pode ser ignorada

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

8 de outubro de 2012, 8h20

Spacca
“A história da civilização cabe dentro da história do fisco. Grandes convulsões sociais, como a revolução francesa, tiveram como verdadeira causa as iniqüidades do fisco.” (Monteiro Lobato – Mundo da Lua.)

Na próxima quarta-feira, a Câmara deve votar o projeto que reajusta o limite de receita bruta para fins de tributação da pessoa jurídica pelo lucro presumido. Esse limite está sem correção há dez anos, com o que as empresas são prejudicadas pela óbvia atuação da inflação sobre a base de cálculo do tributo.

Pretende o PL que o limite de receita seja de R$ 78 milhões por ano ou R$ 6,5 (seis milhões e quinhentos mil reais) por mês. Consta que o ministro da Fazenda teria manifestado ser contrário ao projeto. Mas, como é óbvio, o órgão encarregado de decidir o projeto é o Congresso, cabendo ao servidor público obedecer ao que o Legislativo decidiu. Quem manda é o povo, representado pelo Congresso. Ministro obedece ou vai embora.

A correção de todos os valores existentes na legislação do imposto de renda é uma questão de justiça tributária que não pode ser ignorada. Sempre que um valor qualquer não é corrigido, poderá dar ensejo a tributação injusta. Tal é o caso, por exemplo, da tabela de retenção na fonte sobre os rendimentos da pessoa física, bem como dos valores de abatimento das despesas de educação e dependentes.

Embora à primeira vista pareçam elevados aqueles valores, deve-se levar em conta que a tributação pelo lucro presumido não considera os custos e despesas que são suportados pela empresa. Assim, acontece com certa freqüência que se o contribuinte fizesse opção pelo sistema do lucro real seu desembolso com o imposto de renda seria bem menor do que aquele que foi pago no regime do presumido.

Como a legislação não permite que se altere a opção no decorrer do exercício (RIR, art. 516), pode o contribuinte ser prejudicado se houver uma redução drástica de seu faturamento e a partir de certo mês ele venha a ter prejuízo. Poderá ter prejuízo mediante a apuração contábil regular, mas terá que pagar o imposto, no caso sobre lucro inexistente. O lucro presumido poderá ser uma armadilha nesse caso.

Não há a menor dúvida de que o imposto de renda é o tributo mais justo que pagamos. Todavia, a legislação tributária brasileira vem sendo distorcida ou mesmo apenas ignorada, de tal forma que não se paga imposto sobre renda e proventos, mas sofre o contribuinte diversos tipos de CONFISCO, travestidos de imposto, em despudorada contrariedade ao art. 150, inciso IV da CF.

Diversos impostos que hoje pagamos apresentam efeitos confiscatórios. Um exemplo é essa aberração jurídica chamada IPVA, que confisca um veículo em tempo relativamente curto. Trata-se de confisco, não de imposto, uma vez que o veículo é bem de consumo, pois seu uso implica em acelerada depreciação e também em elevadas despesas de manutenção que vão desde o licenciamento anual até o seguro geral, passando por revisões, multas (existe uma indústria disso, podem crer) e provisões para troca periódica. O IPVA, ao tratar o veículo como propriedade, engana a todos nós, pois quando adquirimos o carro pagamos o ICMS, o IPI, o Finsocial, o PIS, etc., tributos que incidem sobre bens de consumo, não sobre patrimônio ou propriedade.

Quando a legislação do imposto de renda fixa limites irreais, ridículos e desonestos para os abatimentos ou deduções que podemos fazer, também está a nos confiscar, furtar, extorquir, enfim, a nos roubar descaradamente! Os valores admitidos para dedução com “despesas escolares”, por exemplo, não são suficientes para pagar a mais modesta escola da mais longínqua periferia.

Por outro lado, ao não permitir deduções com escolas de idiomas e informática, o Fisco revela sua enorme ignorância, agindo na contra-mão da história, pois todo e qualquer conhecimento, especialmente de informática e línguas, é indispensável para obter trabalho no mundo atual. Ou as nossas autoridades são totalmente ignorantes, ou estão se comportando de forma desonesta, tolhendo a dedução de abatimentos necessários.

Também a dedução dos dependentes é outra sacanagem fazendária. Com o valor atual, de cerca de duzentos reais, não é possível alimentar, vestir e cuidar de um dependente, qualquer que seja sua idade. Trata-se de uma mentira deslavada, que impede o cidadão de respeitar a autoridade fiscal.

Não há a menor dúvida de que o PL a ser examinado pela Câmara merece ser transformado em lei. O lucro presumido, aliás, muitas vezes é melhor para a arrecadação do que para o contribuinte. Mas é indispensável que a pessoa física também veja afastadas as injustiças de que é vítima. Afinal, não precisamos mais fazer convulsão social para termos uma tributação adequada.

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    é advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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