Cooperação Internacional

STF admite HC contra sequestro de bens em auxílio direto

Autor

  • Antenor Madruga

    é sócio do FeldensMadruga Advogados doutor em Direito Internacional pela USP especialista em Direito Empresarial pela PUC-SP e professor do Instituto Rio Branco.

4 de outubro de 2012, 12h52

Spacca
A cooperação jurídica internacional e a modalidade chamada de “auxílio direto” voltaram à consideração do Supremo Tribunal Federal em recente julgamento, pela 1ª Turma, do Habeas Corpus 105.905, em 11 de outubro de 2011.

A ementa do acórdão é a seguinte:
SENTENÇA OU ATO DE JUÍZO ESTRANGEIRO — BENS — SEQUESTRO E EXPROPRIAÇÃO — EXECUÇÃO NO TERRITÓRIO BRASILEIRO — FORMALIDADE ESSENCIAL. A teor do disposto no artigo 105, inciso I, alínea “i”, da Constituição Federal e presente o artigo 15 da Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro, ato de Juízo estrangeiro a implicar constrição deve ser examinado pelo Superior Tribunal de Justiça. Descabe apresentá-lo diretamente a Juízo Federal, objetivando o implemento. A atuação deste último, conforme o artigo 109, inciso X, da Carta da República, pressupõe o exequatur.
Pela decisão, a 1ª Turma do STF afasta a possibilidade de se recorrer ao auxílio direto para obter o sequestro de bens no Brasil, independente de carta rogatória ou homologação de sentença estrangeira. Com o devido respeito, creio que o STF continua sem distinguir corretamente as hipóteses de juízo de delibação e auxílio direto. A respeito dessa questão, remeto a artigo que publiquei nesta ConJur, em julho de 2011 (clique aqui para ler).

Entretanto, este é um caso diferente, em que o Estado brasileiro, diante da impossibilidade de extraditar seu nacional, promove, por meio da Advocacia-Geral da União, ação cautelar no Brasil para obter o sequestro dos bens em favor do Estado estrangeiro. Aparentemente, a pretensão da União, em favor do Estado estrangeiro, não é simplesmente cautelar. Conforme o ministro Marco Aurélio, relator, “seria uma cooperação entre aspas, porque o que se tem é execução do título executivo penal condenatório [estrangeiro].

Seria possível, ainda que pelo STJ, a homologação da sentença penal estrangeira que condena nacional brasileiro e determina o perdimento de seus bens? A vedação à extradição de nacionais, nos termos do artigo 5º, inciso LI, da Constituição, não significa uma cláusula de competência territorial absoluta para julgar ações penais que tenham brasileiros como réus? Ou seria mesmo possível homologar quaisquer sentenças penais estrangeiras para fins de perdimento de bens? Como afastar, nesses casos, o disposto no artigo 9º do Código Penal, segundo o qual a sentença penal estrangeira somente pode ser homologada para obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis ou para sujeitá-lo a medida de segurança?

É curiosa também a justificativa do acórdão para o uso do Habeas Corpus em questão que envolve constrição patrimonial e não a liberdade do paciente. Nos termos do ministro Fux, a Turma foi alertada para a preliminar de descabimento do Habeas Corpus para proteção patrimonial, lembrando-se “acórdão com tintas fortes do Ministro Celso de Mello, sobre a utilização promíscua do Habeas Corpus para a hipótese em que não estava em jogo a liberdade de ir e vir.” Não obstante, o ministro Fux entendeu que o “abalo à soberania nacional” justificaria a utilização do HC:
Mas, por outro lado, sobre-eleva, nesse balanceamento de interesses em jogo, um abalo mais vertical acerca da soberania nacional. Quer dizer, um país a pretexto de um auxílio direto fundado numa convenção, na verdade pede a execução de uma sentença estrangeira sem passar pelas formalidades constitucionais. De sorte que, com essas ponderações, propendo para a aplicação de um valor maior, que é a defesa da soberania nacional, acompanho o voto do Senhor Ministro Marco Aurélio.

O acórdão convida a uma reflexão mais detida sobre os temas e convicções que aborda e esposa. Faz-se necessário um debate atualizado sobre os contornos e a constitucionalidade do auxílio direto. A Comissão de Cooperação Jurídica Internacional do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais IBCCRIM organizará em novembro um seminário sobre o acórdão em referência e as questões nele levantadas.

Autores

  • Brave

    é advogado, sócio do Barbosa Müssnich e Aragão; doutor em Direito Internacional pela USP; especialista em Direito Empresarial pela PUC-SP; professor do Instituto Rio Branco.

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