Mudança na jurisprudência

TST legisla ao estender garantias a acidentado e gestante

Autor

  • Lisiane Valéria Linhares Schmidel

    é advogada consultora mestranda em Direito pela Fadisp sócia-fundadora da Schmidel & Associados Advocacia pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes (RJ) e em Direito Empresarial Negocial e do Consumidor pela Fundação Escola do Ministério Público do Estado de Mato Grosso. É membro do Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas.

3 de outubro de 2012, 14h01

O Tribunal Superior do Trabalho ao modificar o teor das Súmulas 244 e 378 incluindo os novos incisos III, o fez para reconhecer o direito à estabilidade provisória às trabalhadoras gestantes e às vítimas de acidente/doença do trabalho, respectivamente, mesmo em se tratando de contrato a termo, o que se inclui o contrato de experiência.

As alterações se devem a uma interpretação sistemática do TST que atribui força normativa ao artigo 7º, XXII e XXVIII da Constituição Federal de 1988, conferindo especial destaque às normas de saúde e segurança do trabalhador no que diz respeito aos acidentados do trabalho, e a proteção à gestante e ao nascituro no que se refere à estabilidade gestacional, o que segundo a Corte Superior do Trabalho, tanto em um, quanto em outro caso, a legislação máxima não faria distinção quanto aos contratos a termo, encontrando entre seus expressivos defensores o ministro do TST e renomado doutrinador, Maurício Godinho Delgado[1], que já apontava em sua mais recente obra, a tendência entre a maioria das Turmas do mencionado tribunal em modificar o entendimento então sumulado.

Outrora, porém, as Súmulas 244 e 378 do TST, negavam, expressamente, a extensão aos contratos a termo da garantia provisória de emprego às gestantes e aos acidentados do trabalho que adquirissem tal qualidade durante vigência do mesmo, inclusive de experiência, já que nestas espécies contratuais não haveria dispensa injusta, e sim mero cumprimento de prazo previamente estipulado, fundamento este que não se desconstitui, mantendo-se.

Tal posicionamento vinha sendo seguido até então pela maioria da relevante doutrina, a exemplo do eminente Sérgio Pinto Martins[2], o ilustre procurador do Trabalho Gustavo Filipe Barbosa Garcia, e a juíza e não menos distinta, Alice Monteiro de Barros que vê na Lei 9.601/1998 a única exceção, em razão de que, segundo a mesma, a legislação acima mencionada teria “o objetivo de fomentar novas admissões da empresa”[3].

Apesar da iniciativa aparentemente positiva do Superior Tribunal trabalhista, a modificação das súmulas não alcançará o seu objetivo real, qual seja, de um lado diminuir os riscos ambientais do trabalho e de outro, conferir garantias materiais à criança gerada pela trabalhadora gestante, mas gerará tão somente, a antipatia aos trabalhadores que em situação de vigência de contratos por prazo determinados, gozarem de tais benefícios, legitimamente conferidos àqueles que trabalham sob a égide de um contrato por prazo indeterminado, já que a justificativa legal usada pela jurisprudência não é capaz de modificar a cultura e o comportamento social daqueles empregadores avessos a políticas sociais, posto que apenas por meio da educação é possível mudar o comportamento, verdadeiramente.

Do ponto de vista jurídico, as súmulas afrontam os princípios da Separação dos Poderes e da legalidade previstos nos artigos 2o e 5o, XXIX da CF, já que ao exigir um dever objetivo do empregador (dever de manter o emprego do trabalhador(a) contratado(a) à prazo determinado nas situações de acidente de trabalho e de gestação), o Tribunal legisla positivamente, interferindo diretamente nas situações contratuais correspondentes, igualando suas súmulas às normas de caráter genérico, às leis.

O artigo 10, II, “b” do ADCT, veda a dispensa arbitrária ou sem justa causa da gestante, o que exclui por corolário lógico os contratos a termo, já que nestes, ao menos que haja ruptura antes do prazo estipulado e de forma injustificada, não há dispensa, e sim, cumprimento do prazo, ou não contratação posterior.

Neste aspecto, a Súmula 244, III do TST viola expressamente o mencionado dispositivo constitucional, uma vez que o artigo não comporta interpretação extensiva.

Quanto ao tópico III da Súmula 378 do TST, este não se sustenta sob os argumentos utilizados, já que muito embora o 7º, XXII e XXVIII da Carta Maior busque resguardar a segurança dos trabalhadores e a proteção ao emprego, tais princípios não se sobrepõem à livre iniciativa, que constitui primado da ordem econômica do Estado, que dentre outros princípios, destaca-se o da propriedade privada, ex vi do artigo 170 da CF, de modo que o favorecimento de um não deve se sobrepor ou excluir o outro.

As súmulas ferem a boa-fé contratual e a livre contratação, prejudicando a avaliação do trabalho prestado pelo empregador contratante, que se verá obrigado a arcar com o ônus de manter um empregado que tenha se mostrado inapto (contrato de experiência) ou desnecessário após determinado lapso (contrato a temporário), violando a livre iniciativa e a propriedade privada.

Ademais, tais garantias visam obstar “dispensas” irregulares e até ilícitas, impedindo eventual discriminação por parte do empregador, o que a princípio, não se verifica nos contratos a termo, já que, via de regra, nestes apenas cumpre-se o lapso previamente estipulado.

Portanto, ao estender as garantias de emprego aos acidentados e às gestantes em situação de contrato a termo, o TST busca na verdade imputar aos empregadores a responsabilidade social de criação e manutenção de empregos, o que não se faz imputando deveres não previstos em lei, mas sim os estimulando com políticas públicas de incentivos e educação.

Ainda assim, medidas consideradas protetivas ou inclusivas, não devem ser eternizadas nem visar o estímulo de outras novas, pois devem buscar ser eficientes para que possam, cumprido o objetivo, ser extintas ou desnecessárias com base na evolução social, ou seja, são medidas extremas, e como tais, devem estar baseadas na estrita legalidade, e instauradas por quem de direito.


[1] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 11a ed.. São Paulo: LTR, 2012, p. 546.

[2] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 28a ed.. São Paulo: Atlas, 2012, p. 451. 

[3] BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 8a ed.. São Paulo: LTR, 2012, pgs. 792/793. 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!