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CNJ adia decisões sobre nepotismo e cotas

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2 de outubro de 2012, 20h54

O julgamento de uma denúncia de nepotismo no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acabou se desdobrando em uma discussão doutrinária sobre o conceito de “favoritismo no Judiciário” durante sessão ordinária do Conselho Nacional de Justiça nesta terça-feira (2/10). O Pedido de Providências, sob relatoria do conselheiro Jorge Hélio, voltou a Plenário nesta terça, mas o julgamento foi novamente suspenso depois do pedido de vista do corregedor-nacional de Justiça, Francisco Falcão. Após o debate entre os conselheiros, o Pedido de Vista Regimental foi também estendido a outros cinco processos em pauta que tratam do mesmo tema.

Antes da suspensão do julgamento, o relator votou por manter uma interpretação mais rígida do conceito de nepotismo, dando provimento parcial ao Pedido de Providências contra desembargador e parentes dele que ocupam cargo comissionado, ou seja, sem concurso, no TJ-RS. Para o relator, mesmo considerando a ausência de subordinação hierárquica entre os familiares no âmbito do tribunal, cabe ainda assim reconhecer a ocorrência de nepotismo. O conselheiro afirmou que a prática do nepotismo se utiliza dos meios disponíveis e “sempre dá um jeito de renascer como uma fênix”, razão pela qual tem de ser coibida de forma severa, do contrário “estará se consagrando um privilégio e não uma prerrogativa constitucional”, disse.

O conselheiro Carlos Alberto Reis de Paula, que havia pedido vista do processo anteriormente, reiterou o mérito da decisão monocrática sobre o assunto, do ex-presidente do CNJ, o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Cezar Peluso. Embora os conselheiros tenham concordado sobre a prevalência do colegiado sobre a decisão monocrática, alguns deles manifestaram ressalvas sobre o que entenderam como "extensão do conceito de nepotismo" presente no voto do relator.

A exemplo do que decidiu o ex-presidente Cezar Peluso, os conselheiros não acolheram o Pedido de Providências por não reconhecer a prática de nepotismo quando não existe relação hierárquica entre os entes. Os conselheiros Carlos Alberto e Sílvio Rocha discordaram de que cabe concluir que, desse modo, se dá o chamado “nepotismo cruzado” e abriram divergência parcial em relação ao relator Jorge Hélio ao dar provimento ao Pedido de Providências em apenas em alguns dos casos questionados.

Os conselheiros Ney José de Freitas, José Lúcio Munhoz e Tourinho Neto divergiram de forma ainda mais ampla, a exemplo da decisão do ex-presidente Cezar Peluso ao rejeitar o Pedido de Providências. Coube ao desembargador Tourinho Neto fazer as críticas mais incivas em relação ao voto do relator.

“O conselheiro Jorge Hélio morre lutando, mesmo ensaguentando, na lona e no suspiro, ainda assim continua a lutar”, provocou Tourinho Neto. “Não se pode admitir essa total transparência, em que todos estão nus. São necessárias roupas mínimas”, afirmou o conselheiro ao criticar o entendimento de que a prática de nepotismo também ocorre apesar ausência de subordinação hierárquica. “Não cabe falar em nepotismo quando não há vinculação entre servidor comissionado e o chefe”, insistiu.

O conselheiro Jefferson Kravchychyn saiu em defesa de uma interpretação mais restritiva do conceito de nepotismo, por entender que o fenômeno “ocorre sob as matizes mais variáveis possiveis”. O conselheiro Ney José de Freitas discordou. “Parente não pode ser beneficiado, mas também não deve ser execrado. [Combater] o nepotismo deve ter balizas", disse Freitas.

Cotas
No julgamento de outro Pedido de Providências, os conselheiros adiaram a decisão sobre se cabe ao CNJ fixar as diretrizes das políticas públicas de cotas para o preenchimento de cargos no Poder Judiciário.

O relator do processo, conselheiro Jefferson Kravchychyn, votou por entender que não cabe ao Conselho decidir sobre como aplicar a política de cotas no caso de magistrados, por conta da subordinação à Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman). Kravchychyn reconheceu que compete ao CNJ, dessa forma, decidir apenas sobre cotas para cargos comissionados e servidores. O conselheiro também votou por adiar a decisão do mérito até que estudos técnicos que serão efetivados pela Comissão de Eficiência Operacional e Gestão apresente resultados sobre o tema.

O Plenário acolheu o pedido de adiamento, mas rejeitou o entendimento de que não cabe ao Conselho definir as políticas de cotas para o Judiciário até a edição da matéria nos termos da Loman. O ministro Jorge Hélio lembrou que "a lógica constitucional da isonomia material se sobrepõe à Loman". Os demais conselheiros decidiram ainda que o estudo técnico deve ser estendido para além dos percentuais de negros e indígenas, mas também para portadores de necessidades especiais.

O ministro Carlos Alberto sugeriu ainda que se estendesse a reserva de cotas para funcionários terceirizados, lembrando que “até terceirizados têm ações afirmativas correndo no TST e STF”. O conselheiro criticou, porém, a política de cotas para magistrados. Para ele, no caso de juízes, o que prevalece é o concurso de mérito, não cabendo assim qualquer interferência. “Apenas quando a escolha é livre é que podemos considerar as desigualdades”, disse Carlos Alberto.

O presidente do CNJ, ministro Ayres Britto observou, no entanto, que o sistema de cotas para o acesso à universidade, por exemplo, não desconsidera o valor do mérito. “Cotas na universidade não significam que o curso superior será feito com menos exigência para cotistas”, disse Britto. O conselheiro Wellington Cabral Saraiva, concordando com o presidente do CNJ, citou ainda estudos que demostram que alunos aprovados pelo sistema de cotas apresentam desempenho igual ou superior aos dos demais estudantes.

O relator e os conselheiros Emmanoel Campello, José Lúcio Munhoz, Carlos Alberto, Gilberto Valente Martins e Tourinho Neto acabaram vencidos no entendimento de que a Loman limita a competência do CNJ para decidir sobre a política de cotas no caso dos magistrados. O Plenário decidiu por unanimidade, contudo, que o julgamento de mérito deve aguardar os resultados produzidos pelos estudos técnicos e que a futura deliberação deve abranger cargos de demais servidores e funcionários no Poder Judiciário.

Por sugestão do presidente do CNJ, ministro Ayres Britto, os conselheiros resolveram estender a sessão ordinária desta terça-feira até as 22 horas. A razão, segundo o presidente, é que o julgamento da Ação Penal 470, o processo do mensalão, tem afetado a produtividade até mesmo do CNJ. “Não tenho podido comparecer mesmo às sessões preparatórias na segunda-feira por força do julgamento da Ação Penal 470”, disse Britto. “Não por ser esta uma ação heterodoxa, mas extensa”, ressaltou. Porém, a sessão acabou sendo concluída às 20h. Por conta da sessão de julgamento da Ação Penal 470 marcada excepcionalmente para a próxima terça-feira (9/10), a sessão extraordinária do CNJ agendada também para aquele dia foi cancelada. As sessões de julgamento da 1ª e 2ª Turmas do Supremo Tribunal Federal, também previstas para terça-feira, serão adiadas.

Pedido de Providências 200910000043902
Pedido de Providências 0002248-46.2012.2.00.0000

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