Falta de investimentos

Teoria do Estado mínimo desestruturou Polícia paulista

Autor

13 de novembro de 2012, 14h13

A Lei de Segurança Nacional não se aplica aos crimes cometidos recentemente em São Paulo, porque define como crime contra a segurança nacional a conduta que lesa ou expõe a perigo de lesão a integridade territorial e a soberania nacional, o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito e a pessoa dos chefes dos Poderes da União (Lei 7.170/83, art.1).

Uma das mais importantes garantias individuais consagradas universalmente é o princípio da legalidade, que ganha maior relevância na aplicação da lei penal. Para que seja assegurada, indispensável a caracterização da chamada tipicidade da conduta do agente, a exigir que a conduta praticada pelo indivíduo, para ser punida, deve se enquadrar exatamente no comportamento descrito por lei anterior como crime.

Ora, parece que os fatos ocorridos nos últimos meses em São Paulo não se enquadram rigorosamente na conduta descrita no artigo 1º da Lei de Segurança Nacional ou nos crimes previstos nos artigos 8º a 29, do mesmo Estatuto, que só se configuram, aliás, quando comprovado o intento de subversão da ordem política e social.

É verdade que um desses dispositivos prevê como crime contra a segurança nacional a prática de atentado pessoal ou de atos de terrorismo. Mas não define o que viriam a ser os tais atos de terrorismo. E, de qualquer modo, impõe a comprovação de que o cometimento teria ocorrido por inconformismo político ou para a obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas (art.20).

É bom lembrar, de um modo ou de outro, que a Lei de Segurança Nacional foi editada como covarde escudo de autoproteção por uma das mais severas e sangrentas ditaduras da História. Seria, no meu entender, um grave retrocesso e perigoso precedente a aplicação dessa Lei aos casos que vem ocorrendo em São Paulo, ordenados por lideranças de organizações criminosas que nunca lançaram qualquer manifestação ou comando de voz no sentido de subverter a ordem política nacional, mas apenas se aproveitando do galopante enfraquecimento da estrutura do Estado, para a prática de crimes comuns.

De fato, não se pode esquecer que, nos últimos 20 anos, o Estado brasileiro adotou ostensivamente a teoria supostamente científica da denominada Globalização Econômica, bandeira que acabou sendo hasteada com muito mais empenho ainda pelo governo do estado de São Paulo, criando-se então o equivocado lema de que o Estado, se nunca deu lucro, deveria ser extinto e, não sendo isso possível, então que fosse reduzido ao mínimo. Instituiu-se aí a derivada teoria do Estado Mínimo.

Reduziu-se completamente a máquina da administração pública, aviltando-se inclusive e especialmente salários e condições de trabalho dos órgãos de segurança pública. No estado de São Paulo, reduziu-se demasiadamente o número de agentes da Polícia, muito aquém das projeções de necessidade mínima da própria Secretaria de Segurança.

Aniquilaram-se em seguida as forças que pudessem contrariar essa filosofia política. Para resumir, com o intuito de engessar a atividade dos sindicatos, criou-se cruel e irresponsavelmente, na faixa populacional de idade de ocupação, uma fila permanente de pelo menos 10% de desemprego (não há greve com tamanha fila de desempregados e não há sindicatos sem greve).

Os protagonistas dessa teoria que se funda mais na linguagem da vantagem a qualquer custo do que na da ética social não se preocuparam com os efeitos colaterais. Grandes cidades se desorganizaram completamente com esse percentual de desocupados, jogando verdadeiros exércitos nos territórios sem lei das galerias subterrâneas da informalidade e do submundo do crime.

Deu no que deu. Não há saúde, educação e segurança públicas. O Estado Mínimo se transformou em Estado inexistente, a ponto de fazer com que os próprios causadores desse caos, supostamente em nome da ética e não da vantagem econômica, gritem agora por socorro do Estado, que só será capaz de agir se tiver sua estrutura governamental recuperada em todos os níveis e, sobretudo, na segurança pública.

Não há felizmente no Brasil precedentes de crimes de terrorismo. Mas já há projetos de lei antiterrorismo no Congresso Nacional que, entretanto, não podem ser aprovados com precipitação, até porque alterações legais devem ser feitas com base no pretendido resultado ideal, que sempre se distorce em épocas de crise.

O que poderia ser feito, dentro da lei, para enfrentar essa situação? Com essa desestrutura da máquina estatal de segurança, nenhuma alteração ou nova interpretação da lei será eficaz. É necessário, pois, que os governantes tomem vergonha, convençam-se de que o Estado não pode ser mínimo, mas do tamanho do necessário e estruturem as polícias com mais qualificação, maiores prerrogativas e contingentes, recursos materiais, condições de trabalho e de habitação dignas e remuneração menos aviltante.

A Polícia, por representar o poder do Estado, deve se fazer presente de forma ostensivamente forte a fim de resolver eventuais desvios da ordem social rapidamente, sem violência e dentro da legalidade. Do contrário, uma simples ação de arruaceiros pode se transformar numa verdadeira guerra, como a que destruiu recentemente parte da Praça da Sé em São Paulo na chamada Virada Cultural.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!