Invasão de Poderes

STF vai julgar mudanças em proposta orçamentária

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10 de novembro de 2012, 5h01

O Supremo Tribunal Federal vai julgar a constitucionalidade da alteração feita pela presidente Dilma Rousseff na proposta orçamentária para 2013 apresentada pelo Poder Judiciário ao Congresso Nacional. O ministro Luiz Fux, relator de Mandado de Segurança das associações que representam os magistrados, pediu a inclusão do caso na pauta da corte. Nesta sexta-feira (9/11), o ministro ainda determinou que os deputados e senadores analisem, juntamente com a proposta elaborada pelo Ministério do Planejamento, a proposta orçamentária original encaminhada pelo Supremo à Presidência da República.

“Considerando a documentação anexada na presente data pela Presidência da República, oficie-se às Mesas das Casas do Congresso Nacional para que apreciem a proposta de orçamento do Poder Judiciário, anexas à Mensagem 387/2012, oficialmente elaborada, como integrante do projeto de lei que ‘Estima a receita e fixa a despesa da União para o exercício financeiro de 2013’”, diz o despacho do ministro, publicado nesta sexta.

No Mandado de Segurança 31.627, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), representadas pelo advogado Alberto Pavie Ribeiro, alegam ofensa à autonomia financeira do Poder Judiciário cometida pela presidente Dilma. Segundo elas, ao informar valores diferentes dos cotados pelo Judiciário, a chefe do Poder Executivo ultrapassou sua competência.

Enquanto os juízes pedem reajuste de até 36% decorrente de perdas com a inflação acumulada em 2007 e 2008, o Ministério do Planejamento propôs aumento de 15,8% dividido em três anos até 2015, mesmo índice negociado com outras categorias do serviço público no Executivo. O valor abrange também o Ministério Público. Segundo a pasta, o pedido do Judiciário terá impacto de R$ 8,3 bilhões no orçamento de 2013. Com o reajuste de 15,8%, porém, o acréscimo no orçamento de 2013 é de R$ 1,1 bilhão. A despesa total da União para o exercício foi estimada em R$ 2,25 trilhões.

A União alega que o cenário econômico não permite aumento maior e que, ao encaminhar ao Congresso a Mensagem 387, no dia 30 de agosto, a presidente Dilma anexou a proposta feita pelo Judiciário, apesar de não incluí-la em seu texto para o Projeto de Lei Orçamentária.

A falta de legitimidade das associações e a mera expectativa de que a proposta do Judiciário seja aprovada pelo Parlamento são outros argumentos dos quais a União deve lançar mão para desqualificar o Mandado de Segurança das entidades. Em parecer dado em outro Mandado de Segurança, de número 30.896, a Procuradoria-Geral da República já firmou que “o interesse na aprovação dos projetos de lei que preveem o aumento remuneratório dos servidores e membros do Judiciário não se confunde, para fins de impetração de mandado de segurança, com o direito subjetivo à defesa da prerrogativa do referido Poder de ver a proposta orçamentária incluída no projeto de lei orçamentária anual. Tal direito é específico do Poder respectivo, não cabendo a qualquer outro órgão ou entidade pleiteá-lo em via estreita como a do mandado de segurança”.

Líquido e certo
Em nota, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) afirma que os magistrados têm o direito líquido e certo de revisão geral anual dos subsídios. O argumento se baseia no que prevê o inciso X do artigo 37 da Constituição Federal, assim como na Lei 10.331/2001.

“A parte da proposta orçamentária encaminhada pelo Poder Judiciário ao Poder Executivo que foi excluída do projeto da lei orçamentária de 2013 não é uma parte que pudesse ser objeto de livre deliberação ou de apreciação discricionária por parte do Poder Executivo ou mesmo do Poder Judiciário”, diz a nota.

"As entidades autoras do mandado de segurança alegam que a presidenta da República excluiu parte da proposta apresentada pelo Supremo relativa à revisão anual dos subsídios ao encaminhar o projeto de lei orçamentária de 2013. Sustentam as associações que o projeto encaminhado é inconstitucional e ilegal porque deveria contemplar a totalidade da proposta orçamentária apresentada pelo Poder Judiciário."

Decisão comemorada
Para o presidente da Ajufe, juiz federal Nino Toldo, a decisão do ministro Fux mostra que o Poder Executivo não poderia ter cortado a proposta enviada pelo Judiciário. "Com essa decisão, terá que ser revista a proposta orçamentária. Agora, vai ter que ser levada em consideração a proposta do Judiciário na discussão do orçamento", diz.

O presidente da Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas (Anamatra), Renato Henry Sant’Anna, afirmou que a decisão é bem vinda. Para ele, "o ofício enviado pelo ministro Fux ao Parlamento demonstra que o Executivo não poderia simplesmente ‘tesourar’ o orçamento do Judiciário".

Para Sant’Anna, há uma prevalência do Poder Executivo até mesmo sobre o Congresso. Ele acredita que o Congresso, com base na decisão do Supremo, deve fazer um orçamento mais plural, ouvindo todas as partes. "O que a gente quer é a flexibilidade do Poder Executivo, que ele veja as diferenças e tome uma decisão equilibrada. Não pode julgar todos de uma maneira igual. As coisas têm que ser tratadas de acordo com a necessidade de cada trabalhador", explica.

Para o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Nelson Calandra, essa ação do Fux tem um grande significado para a magistratura pois faz prevalecer aquela que o ministro Ayres Britto chamada de Rainha das Leis, a Constituição Federal. Calandra ressaltou que a discussão não é sobre aumento da remuneração e sim sobre a independência dos poderes.

"A determinação do ministro Fux é para que o Congresso exerça seu papel e examine a proposta do Judiciário. Essa proposta tem que ser incorporada ao orçamento geral. Não pode o executivo meter a tesoura no orcamento do judiciario. Essa harmonia entre os poderes exige que o executivo nao toque a proposta do judiciario", explica.

Apesar do governo ter a maioria no Congresso, Calandra acredita no bom senso e cita o caso dos royalties do petróleo, no qual o projeto aprovado contraria a posição do governo. "É um quadro extremamente difícil, o governo tem maioria, mas a maioria que existe hoje é uma maioria que acabou de votar os royalties, oposto ao defendido pelo governo", lembrou Calandra.

Choque de Poderes
A briga dos juízes com o Planalto é desigual. Eles alegam que a Presidência enxuga a proposta orçamentária que deve ser encaminhada ao Congresso. Mas como o governo tem maioria no Congresso, pode, sem grandes dificuldades, orientar a base parlamentar a fazer os cortes. E ainda que isso não aconteça, a presidente Dilma tem poder de veto. Como o veto não autoriza modificações, o Judiciário poderia ficar sem dotação orçamentária e depender da complementação que o Planalto quisesse pedir ao Congresso. O caldo político que cerca essa negociação salarial não favorece, propriamente, o pleito da Justiça.

O cabo-de-guerra não é só brasileiro. Em outubro, o Tribunal Federal da Recursos dos Estados Unidos entendeu que houve invasão do Executivo na autonomia do Judiciário ao impedir cortes em reajustes previstos em lei. A corte concluiu que o Congresso violou a "Cláusula da Remuneração" da Constituição dos EUA, que se destina a proteger a independência do Judiciário, ao aprovar legislação que bloqueou os reajustes. Clique aqui para ler

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