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Vítima de estupro com violência real não precisa representar contra agressor

23 de março de 2012, 16h56

Por Redação ConJur

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Nos crimes de estupro praticados com emprego de violência real, a ação penal é pública incondicionada, não sendo possível alegar decadência do direito de representação, nem ilegitimidade do Ministério Público para a propositura da ação. A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reafirmou o entendimento ao negar Habeas Corpus que pretendia trancar ação penal por estupro contra um acusado que já responde por dois homicídios, todos os crimes praticados no mesmo dia.

O relator do caso, ministro Sebastião Reis Júnior, lembrou que o crime ocorreu em 2006 e a denúncia foi recebida em 2007, antes, portanto, da promulgação da Lei 12.015/09, que alterou o Código Penal da parte relativa aos crimes sexuais. “As condições da ação devem ser analisadas à luz da legislação anterior”, disse ele, acrescentando que, em tal contexto, não se pode falar em decadência do direito de representação da vítima.

Na legislação anterior, o processo penal por estupro competia à própria vítima, mas o Ministério Público podia assumir a ação se ela não tivesse meios de arcar com as despesas — caso em que se exigia representação da vítima pedindo essa providência. A Lei 12.015 estabeleceu que a ação penal fosse pública, a cargo do MP, mas ainda condicionada à representação da vítima.

No entanto, segundo o ministro Sebastião Reis Júnior, a jurisprudência do STJ e do STF adotou o entendimento de que, nas situações de estupro cometido com emprego de violência real, a ação penal é pública incondicionada. Ou seja, o Ministério Público deve agir independentemente de representação da vítima.

“Se há indícios de emprego de violência e grave ameaça contra a ofendida, inclusive com o uso de faca, é desnecessário discutir se o termo de representação e a declaração de hipossuficiência são extemporâneos”, afirmou o ministro. Ele observou ainda que não há forma rígida para a representação — quando necessária —, bastando a manifestação inequívoca da vítima no sentido de que o autor do crime seja processado.

No caso concreto, o ministro considerou a providência de colher a aquiescência da vítima — tomada ao término da instrução criminal — uma mera cautela do Ministério Público. “Mesmo que se entendesse imprescindível a representação, a intenção da ofendida para a apuração da responsabilidade já foi demonstrada, pois as suas atitudes após o evento delituoso, como o comparecimento à delegacia e a realização de exame pericial, servem para validar o firme interesse na propositura da ação penal”, disse ele. 

O caso
A denúncia foi recebida em março de 2007 e o réu foi pronunciado na ação penal em curso na Vara do Tribunal do Júri de São Bernardo do Campo (SP), acusado da prática de crimes de homicídio (duas vezes) e estupro. A defesa recorreu, sustentando, entre outras coisas, a ilegitimidade ativa do Ministério Público para processar o acusado pelo crime de estupro, ante a decadência do direito de representação da vítima. O recurso foi rejeitado.

No Habeas Corpus dirigido ao STJ, a defesa apresentou a mesma alegação, de que a manifestação da vítima quanto à intenção de processar o acusado por estupro e a respectiva declaração de hipossuficiência seriam intempestivas, pois foram juntadas aos autos apenas em 19 de fevereiro de 2009, quase três anos após o crime. Ainda segundo a defesa, o processo transcorreu sem que o Ministério Público fosse legitimado para a ação, pois o termo de representação e a declaração de pobreza da vítima só foram colhidos por ocasião do encerramento da instrução criminal, quando o próprio órgão acusatório percebeu a omissão processual.

Requereu, então, o trancamento parcial da ação penal, no que se referia ao crime de estupro, em razão da decadência do direito de representação da vítima. No seu parecer, o Ministério Público Federal opinou pela rejeição do pedido.

Os fatos ocorreram em 24 de abril de 2006. De acordo com os autos, após discutir com a companheira no local onde moravam, o acusado a esfaqueou, produzindo os ferimentos que viriam a causar sua morte. Em seguida, invadiu o cômodo dos vizinhos com a companheira ensanguentada e desfalecida nos ombros. Largou-a junto à porta e passou a agredir o vizinho, que morreu por causa das facadas. A vizinha tentou fugir do agressor, mas foi ameaçada com a faca e constrangida à prática de sexo. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.