Eleições na advocacia

Sayeg quer aproximar OAB-SP da sua missão corporativa

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14 de março de 2012, 18h19

Spacca
Crítico do terceiro mandato de Luiz Flávio Borges D’Urso como presidente da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, o advogado Ricardo Hasson Sayeg diz que é preciso democratizar a OAB, que, segundo ele, tornou-se “uma entidade política partidária”. Postulante à vaga de D’Urso, Sayeg foi o único dos seis pré-candidatos à presidência do órgão a clamar por um segundo turno nas votações, marcadas para novembro deste ano, caso nenhuma chapa consiga mais da metade dos votos (em 2009, D’Urso foi eleito com 36,4%).

Com a visão de que a OAB-SP se afastou de sua missão corporativa, o pré-candidato reclama da falta de infraestrutura nas salas do advogado. Sayeg diz que o advogado tem direito a uma “sala de primeira classe”, já que paga anuidade de R$ 793. “Tem que ter uma pessoa lá para servir um refresco para o advogado, para ele comemorar a vitória ou para ele relaxar”, afirma, lembrando sempre o orçamento anual da entidade, que ele cita como sendo de R$ 300 milhões (a OAB-SP divulga, oficialmente, R$ 166,8 milhões como receita líquida de 2012).

Além das melhorias nas salas do advogado, o pré-candidato traz como promessas de campanha o oferecimento de cursos de pós-graduação gratuitos pela Escola Superior da Advocacia (ESA), a criação de uma câmara arbitral da OAB-SP e a digitalização de todos os serviços da entidade. Outra proposta relevante para a classe, feita por ele em entrevista à revista Consultor Jurídico, é concentrar os esforços da OAB-SP na aprovação de uma mudança para a atuação concorrente à Defensoria Pública, garantindo mercado e “a defesa de todos os necessitados”.

Apesar do aumento do acesso à Justiça ser uma marca da época atual, os reflexos desse movimento no mercado de trabalho não são animadores, na visão do pré-candidato. “O advogado recém-formado não consegue se instalar, o advogado com idade não consegue mais advogar, o advogado médio encontra enormes dificuldades que vão desde a forma dele se estabelecer até a forma de exercer efetivamente a profissão.” Questionado sobre como melhorar isso, Sayeg responde: inclusão digital total, para que o advogado possa trabalhar de casa.

Não é só o papel corporativo, porém, que ele quer pintar de outras cores. A função institucional da Ordem como órgão garantidor da Constituição e da democracia tem, segundo ele, sido deixada de lado para servir a interesses políticos pessoais. Como exemplos de tal desvirtuação, Sayeg cita a atuação “pífia” da entidade nos casos da operação policial na chamada Cracolândia, em São Paulo, e na desocupação de Pinheirinho, em São José dos Campos (SP). Nos dois casos, diz o advogado, a OAB deveria atuar para garantir o respeito aos direitos humanos.

Especializado em Direito Econômico, Sayeg tem, na carteira, clientes como o bicheiro Carlinhos Cachoeira e Nicolau dos Santos Neto, pois se define como “um advogado que vive da sala de espera, atendendo a quem bate à porta”. Chamando seus colegas de profissão de “heróis da pátria”, o pré-candidato à OAB-SP defende a presunção de inocência para com advogados e juízes. Sobre a precaução que se deve ter com os poderes dados ao Conselho Nacional de Justiça, o pré-candidato cita o exemplo do nazismo, que se instalou “a pretexto de uma virtude”.

Sayeg já foi conselheiro seccional na gestão D’Urso, mas, nas últimas eleições, que reelegeram pela terceira vez o atual presidente da OAB-SP, o advogado concorreu na chapa de Rui Celso Fragoso, que ganhou 46.678 votos (31,6% do total). Apesar de citar Fragoso como amigo, conselheiro e homem indispensável para a condução da OAB, Sayeg não pode dizer que tem o apoio do ex-companheiro de chapa (que ainda não se manifestou). Até agora, porém, outros dois candidatos das últimas eleições já enviaram cartas de apoio à sua candidatura: Raimundo Hermes Barbosa e Leandro Pinto.

Leia a entrevista:

ConJur — Quando o senhor decidiu participar da eleição da OAB-SP? Como está a chapa, as alianças, a campanha?
Ricardo Sayeg —
Eu me sinto compromissado com a minha profissão, com a advocacia, e na verdade com o Direito. Eu era conselheiro da OAB-SP na segunda gestão do D’Urso. Quando veio a ideia do terceiro mandato, eu achei absolutamente antidemocrático, uma perpetuação totalmente contrária aos objetivos institucionais da Ordem. Nessa oportunidade eu me alinhei com o Rui Fragoso. Por conta desse alinhamento, vim acompanhando o desenvolvimento da política de ordem. Quando o Rui [Fragoso] anunciou que não ia sair [como candidato nessas eleições], o meu nome acabou emergindo. Eu quero deixar claro que eu não sou candidato de mim mesmo, o meu nome emergiu alinhado com Rui Fragoso, Hermes Barbosa e Leandro Pinto.

ConJur — A saída do advogado Rui Fragoso da corrida é interessante para o senhor? Ou o senhor acha que seria mais forte uma chapa com ele?
Ricardo Sayeg —
O Rui é um grande homem, uma pessoa excepcional, é um homem indispensável para a condução da Ordem dos Advogados do Brasil, mas cada um tem seu tempo, cada um tem seu fluxo de vida e a vida conduz. Nesse momento a missão apareceu para mim e eu aceitei com meu livre arbítrio essa missão. E agora vou até o fim.

ConJur — Qual o principal papel da OAB?
Ricardo Sayeg —
São dois. Um é a função corporativa. O advogado tem que se sentir amparado, como o juiz se sente amparado pela magistratura ou o promotor pelo Ministério Público. E nisso a OAB falha muito, porque é uma máquina que só arrecada e faz punir o advogado. Presta mau serviço e o que presta, presta como se estivesse fazendo um favor para o advogado. Isso vai mudar.

ConJur — Sobre punir o advogado, o senhor fala dos tribunais de ética?
Ricardo Sayeg —
Exatamente. Eu participei de vários julgamentos na minha condição de conselheiro e fui diversas vezes voto vencido por levar em conta a presunção da inocência. Pelas informações que tenho, 80% dos processos do Tribunal de Ética são contra advogados inadimplentes. Justamente mostra a falta de amparo ao advogado. Na hora que o advogado tem uma dificuldade, é punido por isso. Quando fui conselheiro da Ordem, a minha maior discussão em relação à gestão, e eu tive inúmeros votos vencidos em torno disso, é que na contracapa do processo disciplinar de exclusão do advogado, que é a pena capital, vinha um relatório sobre os antecedentes dele de forma apócrifa e não anexada aos autos sem a possibilidade de análise prévia pelo advogado imputado ou por quem o representasse perante o Tribunal de Ética. Sempre que me deparava com isso, criticava e votava pela nulidade. Era absolutamente comum.

ConJur — E qual é a outra função da OAB?
Ricardo Sayeg —
A outra função é institucional. A OAB tem a obrigação de defender a Constituição, de assegurar a democracia e de promover os direitos fundamentais. A OAB tem que ser reposicionada para isso.

ConJur — Hoje em dia ela usa bem essa função institucional?
Ricardo Sayeg —
Não. Parece-me que é uma atividade política e partidariamente vinculada. Alinhada a pretensões de prefeitura e coisas do gênero.

ConJur — Quais seriam as bandeiras essenciais à OAB?
Ricardo Sayeg —
A bandeira da entidade é cumprir o seu estatuto, que diz: defender a Constituição, garantir a democracia e promover os direitos fundamentais. É assim que a OAB serve à população, porque a OAB é a instituição guardiã da sociedade civil. Todo advogado, coletivamente e individualmente, é um guardião. Coletivamente através da OAB. Quando o cidadão anônimo fica de joelhos, pedindo misericórdia, é o advogado que está lá para proteger. Seja ele quem for, faça ele o que fizer, ele tem sempre um advogado para garantir os seus direitos fundamentais, a sua dignidade e a misericórdia, porque a misericórdia é um redutor da Justiça, é um dos aspectos da Justiça.

ConJur — Como a OAB-SP se posiciona atualmente na questão dos direitos humanos e como ela deveria se posicionar ?
Ricardo Sayeg —
O caso de Pinheirinho esclarece isso por si só, assim como o caso da Cracolândia: a atividade da OAB-SP foi pífia. A entidade deveria garantir, por exemplo, no caso da Cracolândia, que não haja o tráfico, que aquilo seja dissolvido com dignidade, a OAB não participou de nada. No caso de Pinheirinho, aquela loucura que aconteceu lá, com policiais invadindo a casa das pessoas e tirando-as de lá de dentro de madrugada, como se fosse uma ação militar, a OAB não se posicionou como deveria.

ConJur — Na defesa dos interesses do advogado, o que a OAB-SP tem feito e o que ela deveria fazer?
Ricardo Sayeg —
A OAB, hoje, presta serviço querendo estabelecer uma política clientelista e dando para os advogados alguns tipos de benefícios como se fosse favor e caridade. A OAB-SP tem R$ 300 milhões de orçamento anual e isso é mais do que suficiente para dar um serviço de ponta, o que não acontece. Basta ver o serviço de publicação da OAB-SP, que é simplesmente um desastre. Eu sou filiado à Associação dos Advogados de São Paulo [Aasp] por causa da ineficiência da OAB.

ConJur — O senhor acha que deve haver essa delimitação de poderes do Conselho Nacional de Justiça?
Ricardo Sayeg —
A pretexto de uma virtude, o nazismo se instalou na Alemanha e isso se transformou em um horror. Eu não sou a favor de ação policialesca, sou a favor de ação democrática. Nesse sentido, o CNJ tem que ser respeitado, tem que ser mantido dentro da sua tarefa constitucional, mas a Constituição é um jogo de ponderação. E a ponderação é justamente a atividade pública relevantíssima do CNJ, que deve ser mantida com os direitos fundamentais das pessoas. As pessoas não podem ser caçadas. Esse tipo de busca, expedição, carta branca, busca generalizada em cima das pessoas é absolutamente inadmissível a quem quer que seja, magistrado ou não. Eu acho que a diferença entre o remédio e o veneno é a dose. É evidente que magistrados têm uma exposição maior e uma tarefa institucional de prestação de contas, mas isso não garante nem permite que as pessoas sejam devassadas na sua intimidade e na sua privacidade. O CNJ pode se deturpar se ele se transformar num órgão policialesco e se transformar em uma entidade nazista. Expressões como “bandidos de toga” são absolutamente inadmissíveis. Nós temos que partir da presunção que estamos lidando com homens de bem, é assim que se age no estado onde a sociedade é fraterna como determina o preâmbulo da Constituição Federal. Todo o meu desenvolvimento científico na PUC-SP é em cima da ideia da sociedade fraterna na forma do preâmbulo e jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal. E, nessa linha, acredito que mais do que iguais nós somos irmãos. A fraternidade é uma categoria jurídica e como categoria jurídica ela tem que permear todos esses relacionamentos. O CNJ tem que agir, mas ele não pode agir de forma policialesca nem nazista.

ConJur — Como avalia a atuação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf)?
Ricardo Sayeg —
A função do Coaf enquanto agente da administração pública do Executivo, que está subordinado ao controle de constitucionalidade e de legalidade, é constitucional, na medida em que existe uma supervisão judicial. Desde que haja ordem judicial individualizada, o Coaf tem toda a legitimidade. Sem autorização judicial, sem investigação clara, específica em relação àquela pessoa, não tem sentido o Coaf sair por aí como se fosse uma caça às bruxas. A advocacia nunca compactuou com isso.

ConJur — A partir do apoio da OAB à ação do CNJ, surgiu um conflito entre entidades de magistrados e a Ordem, criando uma tensão entre as duas classes. Qual é a sua posição sobre esse conflito?
Ricardo Sayeg —
Minha posição nesse conflito é que é um debate absolutamente válido. Essas tensões são democráticas. Desses posicionamentos institucionais é que surge o debate e a democracia se lapida. Isso faz parte da democracia, inclusive, uma das minhas propostas de gestão é a absoluta transparência da OAB, que, hoje, não existe.

ConJur — E o senhor é favorável à Lei da Ficha Limpa?
Ricardo Sayeg —
Sou. Eu não sou favorável a manipulações policialescas que eventualmente venha incriminar alguém para impedir que essa pessoa exerça um papel de representatividade social. Isso pode acontecer quando a pessoa enfrenta o Poder ou o Estado em nome dos interesses legítimos da sociedade. Essa pessoa pode ser taxada como inimigo e ser carimbada por qualquer tipo de imputação. Isso é muito ruim, mas tem acontecido. A Alemanha nazista foi exemplo típico disso. Todos aqueles que eram inimigos do Estado eram tidos como criminosos e não podiam democraticamente exercer o seu papel de representantes de interesses legítimos da sociedade civil. O princípio de culpabilidade insculpido na Constituição é absolutamente claro. E ele é no sentido de que só se considera alguém culpado após o trânsito em julgado. Para a população, pode parecer atraente o discurso de aceitar a condenação por um colegiado, alegando a morosidade da Justiça, mas o advogado sabe que é pelo trânsito em julgado que se estabelece a culpabilidade. Antes disso sempre há a presunção de inocência.

ConJur — O advogado tem espaço no Judiciário para exercer sua profissão da melhor maneira?
Ricardo Sayeg —
Não. A partir do momento que a Ordem deixar de ser uma entidade política partidária para se reposicionar efetivamente, para cumprir os seus objetivos institucionais, como promover os direitos fundamentais e garantir a democracia, vai aumentar a estima e melhorar a imagem da advocacia como um todo, elevando a altivez do advogado e dando melhores condições de trabalho para ele. Basta ver a sala dos advogados para ver que a gente não vive uma estrutura de primeiro mundo e o atendimento do advogado é precário diante de todo o orçamento que a Ordem tem e que não é utilizado em favor disso. Uma das minhas ideias é da absoluta inclusão digital da advocacia. Tudo que a Ordem fizer vai poder fazer por meio da internet. Hoje em dia a pessoa precisa ir até lá buscar uma carteira, ainda tem máquina de escrever nas salas do Fórum. Com um orçamento de R$ 300 milhões, com certeza a Ordem poderia ter uma sala do advogado como se fosse uma sala de primeira classe de qualquer companhia aérea e isso não existe. Tem que ter uma pessoa lá para servir um refresco para o advogado, para ele comemorar a vitória ou para ele relaxar em face das adversidades naturais da própria advocacia.

ConJur — Quais são os pontos de resistência que o advogado enfrenta no Judiciário paulista?
Ricardo Sayeg —
O Judiciário paulista é um gigante, é um colosso, e o advogado age individualmente, solitariamente. Sem amparo, ele não consegue trabalhar na sua plenitude. O advogado é absolutamente dependente da atividade institucional da Ordem para com as condições de trabalho do advogado. Ele tem que ter um anteparo da sua instituição, dando todas as condições para ele poder atuar. Por exemplo, a inclusão digital, os cursos de pós-graduação da Escola Superior da Advocacia, de forma online e gratuita e assim por diante. A OAB-SP tem que agir no sentido de agilizar e no sentido de cobrar providências também da administração da Justiça.

ConJur — Como está o mercado de trabalho?
Ricardo Sayeg —
Acho que está péssimo, não é? O advogado recém-formado não consegue se instalar, o advogado com idade não consegue mais advogar, o advogado médio encontra enormes dificuldades que vão desde a forma dele se estabelecer até a forma dele realizar efetivamente o exercício profissional. Com a inclusão digital total, a minha ideia é que o advogado possa trabalhar inclusive dentro de casa, diminuindo absolutamente os custos, estabelecendo salas de atendimento ao cliente através da Ordem dos Advogados do Brasil. Tenho notícias de que profissionais atendem seus clientes nas subseções, isso é absolutamente proibido, não tem sentido.

ConJur — É proibido atender cliente na casa do advogado?
Ricardo Sayeg —
Sim, isso acontece no estado de São Paulo. Então o advogado tem que aumentar os seus custos, tem que se instalar, tem que se estabelecer, tem que criar toda uma estrutura e toda essa estrutura deveria vir da própria OAB. E com a internet, com a disponibilidade inclusive desse orçamento de R$ 300 milhões, isso é absolutamente factível de acontecer. Temos que garantir para o advogado a redução de custos para o exercício efetivo da atividade. A OAB tem que dar esse amparo. Na realidade, todo advogado tem que se sentir em relação a OAB, como se estivesse vinculado a uma empresa multinacional, com uma governança corporativa de primeiro mundo. Ter toda a estrutura institucional que isso significa. Existem várias empresas instalando seus empregados dentro de casa e diminuindo os custos dela operar. Isso não acontece, por exemplo, com os advogados, basta ver a falta de inclusão digital plena.

ConJur — O senhor falou que o mercado de trabalho está péssimo, mas nunca se viu tanto acesso ao Judiciário como atualmente. Isso não aumenta o mercado?
Ricardo Sayeg —
Realmente melhorou o acesso ao Judiciário, mas, em contrapartida, existe um contingente imenso de advogados. São Paulo tem cadastrado 229 mil advogados originários do estado. Considerando esse contingente, o exercício profissional, a empregabilidade do advogado tem sido muito dificultada. E isso só tende a piorar por essa proliferação absurda das faculdades de Direito sem ter tido qualquer tipo de ação efetiva contra essa proliferação.

ConJur — E deve haver alguma ação contra essa proliferação?
Ricardo Sayeg —
Isso é evidente. Não tem sentido o estado de São Paulo ter 194 faculdades de Direito, não tem sentido isso aumentar.

ConJur — Isso não seria a função do Exame de Ordem?
Ricardo Sayeg —
A função do Exame de Ordem é criar um gargalo. Efetivamente, ele estabelece uma triagem absolutamente necessária e que tem que continuar. Porque se nós fazemos parte da família jurídica, o Exame de Ordem tem que ser tão rigoroso quanto o Exame da Magistratura ou o Exame do Ministério Público, essa é a minha posição.

ConJur — O quinto constitucional deve ser revisto?
Ricardo Sayeg —
O que me parece é que o quinto constitucional tem sido uma atividade meramente política onde as pessoas fazem campanha para indicação do quinto e isso tem que ser solucionado. Uma parte das pessoas que ingressaram pelo quinto constitucional são, efetivamente, representantes da advocacia e isso não deixa de ser uma ação política, mas se faz absolutamente necessária uma pré-qualificação objetiva. Eu fiquei sabendo é que a última votação do quinto foi feita com voto aberto, inclusive, o que dá a possibilidade de patrulhamento.

ConJur — Para o senhor, a OAB-SP deve restringir a atuação da Defensoria Pública para reserva de mercado?
Ricardo Sayeg —
Não é uma questão de reserva de mercado. É uma questão de defesa anônima da sociedade civil. A assistência judiciária é absolutamente necessária. A melhor assistência possível para o maior número de pessoas em situação de hipossuficiência só se dá através da OAB. A ação da Defensoria, por mais que ela critique e tenha ciúmes da OAB, não é suficiente para suplantar a atividade necessária. O convênio de assistência judiciária não é em defesa dos advogados e nem reserva de mercado. O convênio de assistência judiciária é defesa dos pobres e da população hipossuficiente. Se você levar em consideração os dados da ONU, no Brasil, 20,7% da população, que significa 40 milhões de pessoas, estão abaixo da linha da miséria. Essa população tem dignidade e direitos subjetivos e tem que ser assistida. Aproximadamente 45% da população brasileira vive em insegurança alimentar, significa 90 milhões de pessoas que não sabem se vão comer três vezes por dia. A população é anônima e só a advocacia que assiste à sociedade civil de forma anônima. A Defensoria não tem condições de cumprir esse papel. Se nós conseguirmos a vitória na eleição da Ordem, com certeza absoluta vamos usar toda a pressão, toda força da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, toda força dos 230 mil advogados para alterar a Constituição e criar uma competência concorrente entre a OAB e a Defensoria.

ConJur — Como o senhor encara o aumento das soluções extrajudiciais de conflitos?
Ricardo Sayeg —
A OAB deveria ser a primeira a instituir um tribunal arbitral, absolutamente respeitável, para garantir o exercício da advocacia também nesses novos mercados, nessas novas atividades. Em tudo isso, é indispensável a figura do advogado.

ConJur — Como o senhor encara a tendência de que haja cada vez mais indicações para o STJ e para o STF de advogados da União e da Fazenda Nacional?
Ricardo Sayeg —
Esse sintoma demonstra que aqueles que estão mais próximos do poder, aqueles que têm maior penetração política, no final das contas, prevalecem no quinto constitucional ou nas vagas reservadas para a advocacia dentro dos tribunais. Sem uma pré-qualificação necessária, sem critérios objetivos, basta ser amigo do rei para ser elevado a um cargo como ministro do STF. Isso não tem o mínimo sentido. A impessoalidade faz parte integrante da democracia e o Judiciário é um dos poderes constituídos da democracia. A ideia de ter setores representados serve no Legislativo. O Judiciário não é lugar para ver representações setoriais.

ConJur O advogado público deve receber honorários se sucumbência?
Ricardo Sayeg —
O advogado sempre deve receber honorários, faz parte do exercício da atividade e ele não deixa de ser um advogado. O advogado público é um advogado tal como todos os outros. Como herói da pátria, tem que ser dignamente remunerado para ele poder dar dignidade para ele e para as pessoas que ele ama.

ConJur — O senhor é a favor da eleição direta para o Conselho Federal da Ordem?
Ricardo Sayeg —
Sim. Sou a favor de tudo que favorece a democracia. No Estado militar existe o Exército que é o defensor da sociedade, no Estado civil existem os advogados que são os defensores da sociedade e nessa medida os defensores da sociedade têm que ser os defensores da democracia, porque não existe sociedade civil sem democracia.

ConJur — Quem são seus maiores ídolos no Direito.
Ricardo Sayeg —
Meu maior ídolo no Direito é meu pai, que é advogado, Mario Sayeg. Depois, listo Sobral Pinto, Técio Lins e Silva, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, porque são excepcionais advogados, que vivem da sala de espera e do exercício efetivo da profissão.

ConJur — Qual é o maior problema da Justiça brasileira?
Ricardo Sayeg —
A morosidade.

ConJur — Como mudar isso?
Ricardo Sayeg —
Eficiência e tecnologia.

ConJur – Quais os maiores problemas do processo digital?
Ricardo Sayeg —
A acessibilidade. Falta de retaguarda. A OAB tinha que dar retaguarda para ajudar a formação dessa cultura plena de acessibilidade digital, de inclusão digital. A maior tarefa da minha gestão vai ser essa inclusão na parte corporativa, para garantir a transparência absoluta, inclusive do próprio exercício da OAB. Por exemplo, eu acho que todo advogado tem direito de gratuitamente receber um curso online de pós-graduação pela ESA. Isso já acontece na magistratura e já acontece no Ministério Público, mas não acontece na advocacia. A partir do ano que vem isso vai acontecer, se Deus quiser. No dia 1º de janeiro começa [o mandato de quem vencer essas eleições].

ConJur — O trabalho da OAB-SP precisa de continuidade ou de mudança?
Ricardo Sayeg —
Mudança. Precisa de avanço e desenvolvimento. Precisa agir em torno do advogado, precisa ser conduzido por uma pauta coletiva, não por uma pauta pessoal. A humanização da sociedade civil começa pela OAB e dentro da OAB. Se nós realmente somos o sexto PIB do mundo e somos uma potência mundial, nós temos que ter as instituições que representem essa pujança, essa força do Brasil, e isso tem que começar pela sociedade civil e a representante legítima da sociedade civil é a OAB.

ConJur — O senhor é um especialista em Direito Econômico…
Ricardo Sayeg —
Mas eu fui criado dentro de um escritório de advogados criminalistas. Sou de uma família de advogados, meus tios e meu pai, que, assim como eu, viveram da sala de espera, atendendo a todos.

ConJur — Como a formação acadêmica em Direito Econômico pode auxiliar na administração da Ordem de São Paulo?
Ricardo Sayeg —
Isso vai influenciar a minha visão de mundo e a minha visão de mundo vai ajudar a implementar um projeto que não é meu, é de quem acredita em mim e de quem emergiu a minha candidatura para fazer essas mudanças necessárias na Ordem dos Advogados do Brasil. A questão econômica é absolutamente transversal em todas as questões porque a sociedade moderna é uma sociedade capitalista. O capitalismo avançou e a gente precisa humanizar esse capitalismo e humanizar também em prol da advocacia. Antes de ter a mínima ideia de ser pré-candidato a presidência da OAB, eu já estudava e escrevia a respeito do Capitalismo Humanista. O advogado é um agente do humanismo. O humanismo é assegurar, a quem tem, o que tem, e assegurar, a quem não tem, o que merece.

ConJur — Como que o senhor encara a saída do atual presidente da Ordem, Luiz Flávio Borges D’Urso, para concorrer à Prefeitura de São Paulo? Vai votar nele?
Ricardo Sayeg —
Acho legítima, na perspectiva dele, mas um desastre para a advocacia, como foi o terceiro mandato. Quanto ao voto, ele é secreto. Faz parte da democracia o voto secreto e a OAB ter que ser suprapartidária, então como postulante da presidência da Ordem, eu não posso manifestar as minhas preferências. Seja quem for o prefeito de São Paulo, a gente vai ter que trabalhar, inclusive em face desse agente político, para o exercício das finalidades institucionais da Ordem dos Advogados do Brasil. Por conta disso eu não posso externar a minha opção eleitoral. Eu tenho uma, mas ela não é conveniente.

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