Graças a uma decisão da Justiça, a Igreja Nossa Senhora do Carmo, localizada no município mineiro de Santa Maria de Itabira, pôde realizar o tradicional bingo beneficente. No evento deste domingo (11/3), foram vendidas cinco mil cartelas — a cidade tem pouco mais de mil habitantes — e sorteadas três motocicletas, uma televisão, um netbook e uma caderneta de poupança no valor de R$ 5 mil.
A decisão que permitiu o acontecimento no Campo Vila Esporte Clube é do juiz Pedro Câmara Raposo Lopes, da da Vara Criminal, Infância e Juventude e Precatórias, e foi proferida a tempo hábil, na sexta-feira (9/3). Nela, ele levou em conta o "espírito altruísta" da iniciativa e lembrou o real propósito da legislação contravencional.
Hoje, os bingos são proibidos no país, por força da Medida Provisória 168, de 2004. Originalmente, o jogo de azar foi vedado pela Lei das Contravenções Penais, mas foi readmitido pela Lei Pelé.
Mas, como observou o juiz na decisão, "o objetivo da legislação contravencional não foi o de obstaculizar a realização de sorteios, prêmio, bingos e quejandos que tivessem por escopo fins altruísticos, animados tão-somente pelo espírito benfazejo, como na hipótese vertente".
O pedido foi levado ao Judiciário pelos coordenadores da Pastoral Familiar da Igreja Nossa Senhora do Carmo. De acordo com a sentença, "a realização de obras em igrejas ou templos, como in casu, sobre ser desprovida de habitualidade e sem o intuito de lucro, não se encontra abarcada pela tipicidade material da lei contravencional".
Na mesma decisão, o juiz concedeu Habeas Corpus de ofício para assegurar que os promotores do evento não sofressem qualquer constrangimento por eventual desrespeito à lei de contravenções penais.
Processo 0317.12.001133-1
Leia a íntegra da sentença:
A PARÓQUIA NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO, por meio de seus Coordenadores da Pastoral Familar, ajuizou pedido de alará judicial para a realização de “bingo beneficente”, se realizar no dia 11.FEV.2012 na Cidade de Santa Maria de Itabira.
Como causa de pedir, aduziu que o objetivo do “bingo” é o de angariar fundos para a promoção da reforma da Igreja Nossa Senhora do Carmo, no Distrito de Itauninha, Santa Maria de Itabira, MG, mediante a venda de cinco mil cartelas e o sorteio de seis prêmios (três motocicletas, uma Televisão, um “netbook” e uma caderneta de poupança no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais)).
A Ilustre Representante do Ministério Público estadual opinou favoravelmente ao pedido.
É o RELATÓRIO do quanto necessário. Passo a FUNDAMENTAR e DECIDIR.
O artigo 50 do Decreto-lei nº 3.688, de 1941, proscreve o estabelecimento e a exploração de jogos de azar em lugar público ou acessível ao público.
A exceção legal encontrava-se na Lei nº 9.615 (a cognominada “Lei Pelé”), e foi derrogada pela Lei nº 9.981, de 2000, respeitadas as autorizações então vigentes.
Entendo, todavia, que o objetivo da legislação contravencional não foi o de obstaculizar a realização de sorteios, prêmio, bingos e quejandos que tivessem por escopo fins altruísticos, animados tão-somente pelo espírito benfazejo, como na hipótese vertente.
Com efeito, a realização de obras em igrejas ou templos, como in casu, sobre ser desprovida de habitualidade e sem o intuito de lucro, não se encontra abarcada pela tipicidade material da lei contravencional.
Pensar de forma diversa seria proscrever a realização de qualquer “ação entre amigos”, rifas de comissões de formaturas ou outros sorteios destinados a angariar recursos para atividades de cunho nobre.
Ora, não é o objeto da Paróquia a exploração do jogo de azar como atividade econômica, senão a realização em caráter episódico.
A ausência de má-fé é evidente, tanto que se dirigiram os membros da comunidade religiosa a este Juízo, aviando o pedido de alvará.
Com tais breves considerações, extingo o feito com resolução do mérito (Código de Processo Civil, artigo 269, inciso I) e JULGO PROCEDENTE o pedido para AUTORIZAR a realização do bingo beneficente a ser realizado no dia 11.MAR.2012 no Campo Vila Esporte Clube sem que, observado o intuito altruísta, seus responsáveis possam ser conduzidos perante a autoridade policial por eventual afronta ao artigo 50 do Decreto-lei nº 3.688, de 1941, servindo a presente decisão de SALVO CONDUTO como consectário de HABEAS CORPUS que defiro de ofício.
Oficie-se à fração da Polícia Militar de Santa Maria de Itabira.
Expeça-se o competente alvará.
Sem custas. Sem honorários.
Itabira, 09 de março de 2012.
PEDRO CAMARA RAPOSO LOPES
Juiz de Direito