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A autorregulação como base para um novo regime jurídico

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12 de março de 2012, 10h32

Spacca
O valor de mercado das principais empresas de commodities do mundo sofre alterações em milésimos de segundos. Cada vez que isso ocorre, uma complexa rede de informações registra as oscilações, que imediatamente são colocadas à disposição de todos os agentes envolvidos, gerando novas decisões, realimentando o sistema e interferindo diretamente na condução política e econômica de países em um mundo cada vez mais globalizado.

Tanto quanto a tecnologia envolvida, o que chama a atenção neste cenário, aparentemente caótico, característico das principais bolsas de valores ou de mercadorias do planeta, é um padrão de conduta baseado, em grande parte, na autorregulação, que tem se revelado eficiente não apenas para garantir o funcionamento do sistema, como também para lidar com as falhas e riscos inerentes a um mercado cuja importância ultrapassa em muito as fronteiras nacionais.

"A análise das estruturas de autorregulação em diferentes contextos históricos revelam uma estreita relação com a objetivação da boa fé no Direito Civil e Comercial", afirma Luiz Felipe Amaral Calabró, autor de Regulação e Autorregulação do Mercado de Bolsa, já disponível nas livrarias. Doutor em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo e gerente jurídico da BM&FBovespa Supervisão de Mercados, ele utiliza no livro a metáfora palco-plateia para identificação e análise do processo de formação de juízos críticos e decisórios, as relações de poder e os conflitos de interesse a serem coordenados em uma dinâmica que tem como seu principal pilar a "autorregulação institucionalizada e legitimada pela regulação".

O ponto de partida para a teoria defendida por ele é a Bolsa de Valores de São Paulo, palco onde operam 372 empresas que juntas contabilizam um valor de mercado acima de R$ 1,5 trilhão. Nessa estrutura gigantesca, as funções de normatização, supervisão, fiscalização e aplicação de punições, entre outras, são frutos essencialmente de um processo de autorregulação, o que de forma alguma deve ser confundido como ausência de regulação, mas sim como "um exemplo bem-sucedido de um movimento de abertura do sistema jurídico".

No livro, mais do que "dissolver" o aparente antagonismo entre teorias econômicas liberais e intervencionistas, Luiz Felipe Calabró preocupa-se em mostrar que a criação de um novo regime jurídico de autorregulação, em estreita interação com a regulação, combinando conceitos de direito público e privado, ultrapassa os limites da bolsa e pode ser aplicado a outros mercados ou mesmo na gestão de grandes empresas. 

"Parece-nos que o estudo sobre a interação entre regulação e autorregulação no mercado de bolsa é apenas um fragmento de uma questão essencial", diz o autor. "A Teoria Palco-Plateia analisa esses movimentos de interação no mercado de bolsa como parte de uma questão maior e essencial relativa ao processo de formação das decisões individuais e sociais", acrescenta. 

Calabró argumenta que tanto a formação de juízos individuais quanto as convenções sociais são frutos da interação entre regulação, entendida como os estímulos externos ao organismo, e a autorregulação, entendida como movimentos internos ao organismo. Tais interações, segundo ele, ocorrem em sistemas ideais abertos e sobrepostos que, na prática, interagem e se influenciam reciprocamente, sempre com o objetivo de alcançar e manter o máximo equilíbrio possível.

"O ideal é que as pressões advindas do ambiente, dentre as quais se destacam as normas componentes do ordenamento jurídico, sejam coerentes com as pressões e estímulos internos dos indivíduos e da sociedade", afirma.

Tal cenário, no entanto, encontra dificuldades em um ordenamento jurídico rígido, fechado e incapaz de prever e acomodar toda a complexidade e diversidade dos fatos e interesses individuais, ainda que calcado nas melhores técnicas de previsibilidade racional. Para contornar tais obstáculos, explica o autor, a tendência é de abertura do sistema jurídico, mediante a introdução de cláusulas gerais nos comandos normativos, alargando a esfera do "permitido", que será obtemperada pelo julgamento caso a caso dos eventuais conflitos pelo Poder Judiciário, por delegação de competência regulatória a órgãos públicos especializados, geralmente vinculados ao Poder Executivo, e também, por meio de delegação de funções regulatórias à própria iniciativa privada.

"Trata-se da descentralização da competência de estabelecer modais deônticos, a fim de evitar a marginalização de interesses não atendidos pelo palco de regulação central e viabilizar que o "dever ser" recepcione os melhores padrões advindos da livre iniciativa e do livre-arbítrio legitimados por princípios e normas gerais advindos da regulação", explica. O tema, segundo ele, é um dos principais itens na pauta de órgãos reguladores e autorreguladores, principalmente diante da tendência irreversível de globalização dos mercados.

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Título: Regulação e Autorregulação do Mercado de Bolsa: Teoria Palco-Plateia
Autor: Luiz Felipe Amaral Calabró
Editora: Almedina
Ano: 2011
Edição: 1ª Edição
Número de páginas: 216 páginas
Preço: R$ 50

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